Raspanetes. O merecido e o que era fácil de evitar
Sábado, 19 de março
A invasão russa à Ucrânia tem muitos alvos e objetivos. E castigar a economia daquele país é um dos principais. No sábado, o governo ucraniano confirmou o bombardeamento de uma das maiores empresas da Europa de laminação de aço, instalada na cidade-mártir de Mariupol, onde milhares de pessoas continuam retidas sem acesso a água, comida, energia ou a uma real possibilidade de fugirem dali. Vadym Denysenko, ministro do Interior ucraniano, admitiu que o país perdera um "gigante económico", acrescentando que "o objetivo de Putin não é desmilitarizar a Ucrânia, mas desindustrializá-la". Mas os danos causados pela guerra de Putin à economia vão muito além das fronteiras da Ucrânia. António Guterres, secretário-geral da ONU, admite até o colapso do sistema alimentar global. "A guerra na Ucrânia já está a interromper as cadeias de distribuição e a fazer os preços dispararem. Devemos fazer todos os possíveis para evitar um furacão de fome e um colapso do sistema alimentar global", escreveu no Twitter.
Domingo, 20 de março
Foi um domingo emocionante para os adeptos dos desportos motorizados. O dia abriu com mais uma brilhante conquista do português Miguel Oliveira, que pela quarta vez na carreira conseguiu vencer um Grande Prémio de MotoGP (a categoria rainha), desta feita na Indonésia. Foi a melhor resposta possível do piloto da KTM após a desilusão sofrida no arranque da temporada, quando não conseguiu terminar o GP do Qatar devido a uma queda. Já o Bahrein foi palco do arranque do Mundial de Fórmula 1 com novos carros e novas regras. E uma tremenda surpresa. A festa fez-se em tons de vermelho, com a Ferrari a colocar os seus dois pilotos nos primeiros lugares do pódio, pondo fim a um jejum de vitórias que durava há 44 grandes prémios. A marca italiana deu uma prova de vida, ultrapassando as superfavoritas Mercedes e Red Bull (a equipa do campeão do mundo, Max Verstappen, não conseguiu sequer que nenhum dos seus pilotos concluísse a prova).
Segunda, 21 de março
Morreu na segunda-feira o agente da PSP Fábio Guerra, na sequência das "graves lesões cerebrais" sofridas após ser agredido junto a uma discoteca lisboeta, em mais um episódio de violência na noite da capital. No mesmo dia, a Polícia Judiciária confirmou a detenção de três homens: dois fuzileiros (que já estavam retidos na Base Militar do Alfeite por ordem do comandante da unidade) e um civil, suspeitos de homicídio qualificado e ofensa à integridade física qualificada. A morte de Fábio, que estava em dia de folga e, segundo a PSP, juntamente com outros polícias (também agredidos) tentou pôr fim a uma rixa identificando-se como agente da autoridade, levaria, dias depois, o chefe da Armada, Gouveia e Melo, a dirigir palavras duríssimas ao Corpo de Fuzileiros: "Não queremos arruaceiros na Marinha!" O caso voltou a chamar a atenção pelos piores motivos para as Forças Armadas (FA), somando-se a episódios como o roubo de Tancos, Operação Zeus (esquema de sobrefaturação em messes militares que terá lesado o Estado em mais de 1,5 milhões de euros) e Operação Miríade (que provocou inclusive um novo foco de tensão entre Belém e São Bento). Vale o sucesso obtido por Gouveia e Melo na task force da vacinação contra a covid-19 para a imagem das FA não ser hoje ainda pior.
Terça, 22 de março
O tom crispado entre Estados Unidos e Rússia, tendo como pano de fundo a guerra na Ucrânia, não dá sinais de abrandar. Depois de Joe Biden ter classificado Valdimir Putin como um "ditador assassino", o Pentágono veio revelar informações que apontam para "tensões entre forças aéreas e terrestres russas" e "problemas com o comando e controlo dos militares", que estarão "a ficar sem combustível e sem comida". Em resumo, "estão em apuros". Mas se estes sinais poderiam demonstrar algum declínio na ofensiva russa, o aspeto mais perigoso de tudo isto é que os Estados Unidos admitem que Putin poderá mesmo vir a recorrer a armas químicas. "Acho que há uma ameaça real", considerou Joe Biden. A Rússia respondeu considerando que o real interesse dos EUA neste conflito é "querer dominar a ordem mundial" e "continuar a fornecer armas à Ucrânia". A relação entre americanos e russos regressou aos piores tempos da Guerra Fria. E não há nada de bom nisso.
Quarta, 23 de março
O dia tinha tudo para beneficiar a popularidade de António Costa. Festejou-se a data em que Portugal passou a somar mais dias em democracia do que em ditadura, o PS "roubou" ao PSD o segundo deputado do círculo da Europa (reforçando ainda mais a sua maioria absoluta) e o primeiro-ministro apresentou o novo elenco do governo, cumprindo com a promessa de ser mais curto (uma redução de 14 governantes em relação ao anterior Executivo), tornando-o paritário ao nível dos ministros, escolhendo pela primeira vez uma mulher (Helena Carreiras) para liderar a Defesa e reforçando o papel de elementos que lhe são próximos no aparelho socialista (casos de Mariana Vieira da Silva, Fernando Medina, Ana Catarina Mendes ou José Luís Carneiro). No entanto, o que se viu foi um raspanete público de Marcelo ao primeiro-ministro. O Presidente da República não gostou de conhecer a composição do governo através da comunicação social. Não gostou e não se calou, cancelando mesmo a audiência que tinha marcada com Costa para este lhe apresentar os nomes que já todo o país conhecia. O primeiro-ministro pode até alegar que não teve responsabilidade no que aconteceu, mas é incompreensível como não arranjou uns minutos para transmitir ao Presidente, nem que fosse informalmente e mesmo sujeito a uma mudança de última hora, a lista de nomes que tinha escolhido, prevenindo o risco de fugas de informação. Um erro de julgamento? Ou um sinal de que agora, com o conforto de uma maioria absoluta, cultivar uma boa relação com Belém deixou de ser uma prioridade em São Bento? Os próximos tempos o dirão.
Quinta, 24 de março
Portugal está a uma "final" de se qualificar para o Mundial 2022. A seleção nacional, que não falha uma fase final desde 1998, ultrapassou a Turquia, vencendo por 3-1 no Estádio do Dragão, mas voltou a mostrar alguns sinais de fragilidade. A vencer por 2-0, a equipa de Fernando Santos não conseguiu encontrar argumentos para travar a reação turca e, aos 85", valeu-lhe a sorte de Burak Yilmaz desperdiçar uma grande penalidade que dava o empate a dois golos. O jogo também fica marcado pela troca de guarda-redes titular, com o jovem portista Diogo Costa a assumir o lugar de Rui Patrício, o dono da baliza nacional há mais de uma década. "Foi opção", esclareceu o selecionador nacional, negando qualquer lesão de Patrício. Está assim à vista uma importante mudança de ciclo na seleção. O último obstáculo de Portugal (terça-feira, de novo no Dragão) será a Macedónia do Norte, protagonista da grande surpresa deste play-off ao afastar Itália, campeã europeia em título, que fica de fora do Mundial pela segunda vez seguida.
Sexta, 25 de março
Pelas contas da ONU, 13 milhões de pessoas (mais de um quarto da população) estão retidas na Ucrânia em áreas afetadas pela guerra, sem possibilidade de fugir devido, entre outros motivos, à destruição de pontes e estradas. Esta impossibilidade "sugere fortemente a violação do direito internacional humanitário em ataques indiscriminados", defendeu a missão das Nações Unidas para os Direitos Humanos. "Milhões de pessoas vão precisar, a médio e longo prazo, de apoio e de um lugar onde viver", antecipa a organização. A estes números somam-se outros que não param de crescer, como o deslocamento forçado de 6,5 milhões de pessoas dentro do país ou os 3,7 milhões que já abandonaram a Ucrânia em 30 dias de guerra rumo a outros países. Um desses destinos é Portugal, que ontem revelou já ter concedido mais de 21.600 pedidos de proteção temporária a ucranianos, sendo que cerca de um terço dos refugiados são menores e mais de 60% são mulheres.