Morte de Ihor. IGAI reafirma relatório que contradiz ministro Eduardo Cabrita
A Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) - a polícia das polícias que fiscaliza a atividade das forças de segurança - não sustenta a informação que o Ministro da Administração Interna deu ao parlamento sobre a conduta seguida pela direção nacional do SEF, encabeçada por Cristina Gatões, quando teve conhecimento da morte de Ihor Homeniuk, a 12 de março passado, nas instalações deste serviço de segurança no aeroporto de Lisboa.
Em abril, numa audição parlamentar pedida pelo BE, Eduardo Cabrita dissera aos deputados que o SEF tinha instaurado "de imediato, no dia seguinte, uma averiguação interna" à morte do cidadão ucraniano - ou seja no dia 13 de março.
Essa mesma informação foi reafirmada pelo Ministro em comunicado, esta quarta-feira, após o DN ter chamado a atenção para a contradição entre o que Eduardo Cabrita disseram ao parlamento e o que consta do relatório da IGAI.
Neste relatório sobre os "factos graves ocorridos no Espaço Equiparado a Centro de Instalação Temporária (EECIT) do aeroporto de Lisboa- morte de cidadão estrangeiro", a IGAI não faz qualquer referência a este procedimento por parte da Direção Nacional do SEF - procedimento que é, aliás, obrigatório, como o Ministro frisou no referido comunicado, sempre que há uma morte ou outra situação grave sob custódia policial.
Na verdade, a IGAI frisa que o SEF abriu um inquérito a 30 de março - 17 dias depois, e devido a uma notícia. "Na sequência de reportagem emitida pela estação de televisão "TVI24", sob o título "Inspetores do SEF suspeitos de assassinarem imigrante no Aeroporto de Lisboa", a Sra. Diretora Nacional do SEF determinou a abertura de Processo Disciplinar de Inquérito (PDI), para apuramento de eventual responsabilidade disciplinar", está registado nesse documento.
O DN pediu à IGAI que esclarecesse a discrepância entre esta data do seu relatório e a que foi afirmada pelo Ministro. Solicitou ainda informações sobre o dito processo de averiguações: "A IGAI tem conhecimento desta averiguação? Porque não faz referência à mesma no relatório? Quais as suas conclusões? Como explicam que o SEF só tenha comunicado a morte à IGAI dia 18 de março?", foram as questões colocadas.
DestaquedestaqueA Inspetora-Geral, juíza desembargadora Anabela Cabral Ferreira não responde a estas perguntas, mas na declaração que enviou a DN, reafirma o que está escrito no seu relatório, não sustentando as palavras de Cabrita
A Inspetora-Geral, juíza desembargadora Anabela Cabral Ferreira, não responde a estas perguntas, mas na declaração que enviou a DN, reafirma o que está escrito no seu relatório, não sustentando as palavras de Cabrita: "A IGAI confirma todas as menções que constam no relatório do inquérito".
Acrescenta a magistrada que "sem dúvida que é objetivo da IGAI, no cumprimento da sua missão, apurar todos os factos relevantes para a descoberta da verdade, neste como em todos os outros casos que se encontrem no âmbito da sua competência".
No início desta semana, quando questionado pelo DN sobre esta contradição de datas, o gabinete do ministro da Administração Interna optou por não clarificar. De seguida, perante a notícia do DN, que citava as dúvidas do deputado do PSD Duarte Marques, que chegava a acusá-lo de mentir, Eduardo Cabrita acabou por reafirmar a informação que dera em abril no parlamento, negando ter mentido ao parlamento (reagindo a essa acusação do PSD e reafirmou o que tinha dito aos deputados).
Precisamente para esclarecer estas discrepâncias, esta semana, o Grupo Parlamentar do PSD requereu uma audição urgente do ministro da Administração Interna, para ser ouvido na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. O mesmo fez a deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
Pretendem estes pedidos apurar a fundo quais foram as diligências feitas pela Direção Nacional do SEF, encabeçada por Cristina Gatões, em relação à morte de Ihor. Até agora, a diretora nacional não disse quando, como e por quem soube da morte de Homeniuk, nem o que fez na sequência desse conhecimento; tão-pouco esclareceu quando soube da investigação da Polícia Judiciária, que começou a 16 de março e implicou contactos diversos com o SEF.
O SEF, recorde-se, informou o MP de que Ihor tinha morrido "acometido de doença súbita". Na sua investigação, a IGAI apresenta vários factos que indiciam que houve encobrimento do crime e por isso propôs processos disciplinares a mais nove inspetores (além dos três acusados por homicídio) que "por ação ou omissão" contribuíram para esta morte.
Saber qual foi a ação ou omissão da direção do SEF é essencial para esclarecer até que nível na hierarquia pode ter chegado esse encobrimento, uma vez que até agora, apenas foram demitidos o diretor e subdiretor da Direção Geral de Fronteiras, mas só depois da operação da PJ .
Para os social-democratas, "a dimensão e a gravidade desta situação, em que estão em causa contradições nas declarações por parte do Governo, nomeadamente no que respeita ao exercício das competências do SEF ao nível disciplinar, tem de ser cabalmente esclarecido".
Mesmo havendo registo oficial da abertura da averiguação interna, até agora não se conhecem resultados da mesma. Nem a IGAI os referiu no seu relatório, nem o MP, que solicitou ao SEF esta informação, os recebeu. Nem o ministro os mostrou ou mencionou.
Sendo assim, haverá mais responsabilidades a apurar: de quem executou (Gabinete de Inspeção do SEF?) e acompanhou (diretora nacional?) esta ordem de averiguação, uma vez que não terá encontrado nada suspeito: quando, finalmente, o SEF comunicou à IGAI a morte de Ihor, a 18 de março (seis dias depois), já sabedo da investigação da PJ, não fez sequer nenhuma menção a essa investigação e ao facto de implicar a possibilidade de se estar perante um crime.