Militares consideram que nova gestão do SIRESP é de "elevado risco"
Desconhecem-se estudos, vantagens e quais os recursos que sustentam o novo plano para alterar a gestão do Sistema Integrado de Redes de Emergência de Portugal (SIRESP).
Questionado pelo DN há duas semanas, depois de o ministro da Administração Interna ter confirmado que iria extinguir a empresa SIRESP, S.A., a operadora da referida rede estatal e integrar as "atribuições e verbas que lhe estavam cometidas na Secretaria-Geral (SG) do Ministério da Administração Interna (MAI)", o gabinete de José Luís Carneiro não respondeu a nenhuma destas dúvidas.
O anúncio, que representa uma reviravolta no que está determinado em diplomas aprovados pelo próprio Governo - prevendo a criação de uma entidade da administração indireta do Estado / Instituto Público das Tecnologias de Informações e Comunicações do MAI, juntando toda a rede tecnológica que inclui a Rede Nacional de Segurança Interna e o 112.pt- surpreendeu os militares que têm estado envolvidos neste processo desde há mais de ano e meio, sob a liderança de um dos maiores peritos em TIC do Exército, o general Paulo Viegas Nunes, que preside a empresa desde abril do ano passado, ainda recrutado pela ex-ministra Francisca Van Dunem.
A criação desta "entidade" estava prevista para dezembro de 2022, mas acabou por ser adiada sine die. Em junho do ano passado, José Luís Carneiro não deixava ainda transparecer as suas intenções e dizia que o concurso então anunciado estava feito "nos termos que permitirá a transição de responsabilidades para uma instituição que venha a emergir", frisando que esse projeto, que assumiu do seu antecessor Eduardo Cabrita, exigia "uma maturação política" e que ainda não era "oportuna" nesse momento".
Fontes militares e do MAI que têm acompanhado o processo do SIRESP - o qual depois de muita turbulência no tempo do Ministro Eduardo Cabrita, parecia ter finalmente estabilizado com o primeiro concurso público realizado (que reduziu para metade as despesas) e uma rede tecnicamente mais sólida e elogiada pelos utilizadores - manifestaram a sua apreensão com anunciado desvio, que consideram um "passo atrás" para a organização e operação de uma infraestrutura crítica do Estado.
Citaçãocitacao"Por definição, uma estrutura destas na SG-MAI, como uma unidade de missão, é considerada de natureza temporária, não tem quadro próprio de pessoal e não dispõe de qualquer autonomia, ficando limitada em termos de flexibilidade e de coordenação administrativa.
"Por definição, uma estrutura destas na SG-MAI, como uma unidade de missão, é considerada de natureza temporária, não tem quadro próprio de pessoal e não dispõe de qualquer autonomia, ficando limitada em termos de flexibilidade e de coordenação administrativa", sublinha uma das fontes, lembrando que "a rede SIRESP presta serviços a 182 entidades de vários ministérios e não pode ser confundida com uma entidade integrada na estrutura orgânica de um ministério".
Uma das fontes militares antecipa que " os quadros militares, altamente qualificados, que estão agora na SIRESP, S.A., podem não querer passar para a SG e aí teremos um grave problema num momento crítico da transição e consolidação da rede após o concurso público internacional. É de muito elevado risco. Difícil de entender como um serviço crítico pode ser considerado passível de ser assegurado por uma estrutura de natureza temporária e sem recursos próprios".
Apesar de várias tentativas, Viegas Nunes não esteve disponível para falar ao DN.
Quem acompanha as preocupações é o deputado do PSD, Paulo Moniz, especialista em comunicações e que acompanha há vários anos este dossier.
"Não me aparece praticável um órgão essencialmente de apoio administrativo e procedimental como a SG do MAI poder passar a dispor das competências técnico-operacionais necessárias ao planeamento, gestão e fundamentalmente modernização e robustecimento da rede SIRESP. Para além de muito dificilmente ser exequível, no enquadramento e vocação da SG, o funcionamento de uma equipa técnica muito operacional e apetrechada para a aferição técnica da qualidade de cobertura, acompanhamento de alterações e promoção de reconfigurações técnicas e ainda acompanhamento da resolução de avarias.
Paulo Moniz considera que "a integração na SG-MAI e extinção atabalhoada e precipitada da SIRESP, S.A. é mais um processo à "SEF" que não acautela e não cria condições de confiança e robustecimento da rede que nunca pode falhar nas situações de emergência, catástrofe e calamidades".
"É mais um processo estranho, sem pensamento estratégico e sempre no sentido da deterioração da capacidade de resposta a que as decisões do MAI nos habituaram nos últimos anos e com riscos e impactos negativos, financeiros e de desempenho e que se perpetuam ao longo de muito tempo", conclui.
Recorde-se que José Luís Carneiro herdou este processo com a SG sob suspeita, depois de Francisca Van Dunem ter afastado a presidente da SIRESP, S.A., e de ter apresentado queixa-crime que visava a contratação de um consultor técnico para o SIRESP com ligações anteriores a uma das maiores empresas fornecedoras.
Em outubro de 2022 foram feitas buscas na SG-MAI e a outras três empresas fornecedoras da rede SIRESP, incluindo a Altice.
O inquérito, que segundo o comunicado do Ministério Público, envolve suspeitas de corrupção, tráfico de influência, recebimento ou oferta indevida de vantagem, participação económica em negócio, abuso de poder e prevaricação" está ainda em investigação na Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária, confirmou ao DN fonte autorizada desta instituição.