A imigração em Portugal e todos os temas que a envolvem continuarão a marcar a atualidade em 2026? Tudo indica que sim. Depois de dedicar o primeiro Conselho de Ministros da nova legislatura à aprovação das mudanças na Lei dos Estrangeiros e na Lei da Nacionalidade, o Governo ainda não conseguiu implementar toda a agenda reformista nesta matéria: falta aprovar a Lei da Nacionalidade e as alterações legislativas para acelerar a deportação de imigrantes ilegais.O primeiro teste será já em janeiro, quando o diploma que vai alterar quem terá o direito de ser português regressar ao Parlamento, após o chumbo do Tribunal Constitucional (TC). No entanto, o Executivo de Luís Montenegro já demonstrou não estar preocupado, porque “os pontos essenciais” da legislação não precisam de nova revisão parlamentar. Tendo em conta esses pontos essenciais, nomeadamente o aumento do tempo de residência para o direito ao pedido de nacionalidade, o fim do regime para judeus sefarditas e o fim da possibilidade de imigrantes pedirem nacionalidade devido aos bebés nascidos em Portugal, o resultado será o esperado pelo Governo: que menos cidadãos não-nascidos no país tenham o direito a tornarem-se portugueses.O partido que der os votos à AD nesta aprovação determinará se é mesmo André Ventura o parceiro preferencial do Governo nestas matérias, apesar da tentativa do Partido Socialista (PS), liderado por José Luís Carneiro, de chegar a um consenso, o que marcará o debate político em plena fase de eleições presidenciais. Diferente de outros anos, estes temas passam agora também a integrar a escolha do futuro Presidente da República.É o que analisa a cientista política Marina Costa Lobo. “Vários debates presidenciais tiveram este tema como dominante. Com a mudança da Lei da Nacionalidade à vista, é um tema que vai obviamente marcar 2026”, afirma a investigadora da Universidade de Lisboa, em declarações ao DN. Na sua perspetiva, a quebra do consenso entre PS e PSD em matéria de imigração e nacionalidade foi um fator determinante para a mudança do cenário político, que o país tem vindo a testemunhar nos últimos anos. Marina Costa Lobo acredita que o resultado das presidenciais poderá ser uma resposta ao que acontecerá no futuro. “Estas eleições presidenciais vão ser bastante importantes, porque em 2025 o Governo dizia que era preciso assumir alguns dos temas do Chega para o destronar, não é? Agora, se numa segunda volta, por hipótese, tivéssemos Ventura e Gouveia e Melo, ou seja, se o candidato da AD não estivesse representado, eu acho que seria necessário retirar lições sobre a estratégia de 2025, da aliança com o Chega em alguns temas centrais”, reflete.Efeito colateralO cientista político João Ferreira Dias concorda que o assunto se vai estender ao longo do ano. “É um efeito colateral, porque nos últimos dois, três anos, o tema da imigração tornou-se central na política. Além do efeito colateral, existe uma instrumentalização das perceções”, afirma o especialista, autor do estudo Além da Polarização: Perspetivas de mediadores portugueses sobre imigração e relativismo cultural ao longo do espectro político” (título traduzido). Na sua visão, o Governo da AD adotou um discurso mais parecido com o do Chega nos temas de imigração. “Vemos que o ministro Leitão Amaro tem adotado essa gramática da direita radical, ele é quase uma voz do Chega dentro da AD, portanto é um tema que vai permanecer”, diz ao DN.Segundo o investigador do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE), a discussão iminente da Lei da Nacionalidade e da chamada lei do retorno no Parlamento terá repercussões durante meses. “Porque depois disso haverá consequências, debates, e porque, provavelmente, creio eu, o Bloco de Esquerda poderá precisar destes temas para tentar capitalizar-se politicamente, no sentido de mostrar força e sinal de vida, pois é um partido que está em desaparecimento. O Chega precisará também dessas posições da esquerda para poder mostrar que está ao lado da defesa dos Estados-Nação. E assim estaremos nesta polarização permanente”, afirma.A esta equação junta-se ainda o fator económico. Todas as mudanças já concretizadas pelo Governo conduziram exatamente ao objetivo da AD: ter menos imigrantes em Portugal e, consequentemente, menos estrangeiros com direito à nacionalidade portuguesa no futuro. De acordo com dados recentes da Segurança Social trabalhados pelo Banco de Portugal (BdP), o número de trabalhadores imigrantes que saíram de Portugal duplicou, passando de um ritmo mensal médio de 1,9 mil saídas em 2022 para 3,8 mil no ano passado. Ao analisar mês a mês o relatório, percebe-se que o abandono do país aumentou sobretudo a partir de junho de 2024, quando o Governo lançou o primeiro pacote de medidas para regular a imigração e acabar com o que classificou como um regime de “porta aberta”, segundo palavras do ministro da Presidência, António Leitão Amaro.Mesmo com as chamadas “portas escancaradas” repetidas inúmeras vezes pelo ministro, alguns setores da economia afirmam, desde o Governo do PS, que precisam de imigrantes, na construção civil e restauração. Uma estimativa, apresentada recentemente no lançamento de um projeto para atração de migrantes de Cabo Verde e Angola, indica que faltam 80 mil profissionais na construção civil, com as obras que o próprio Governo quer cumprir, como o novo aeroporto, habitações e a terceira ponte sobre o rio Tejo, em Lisboa. O investigador Pedro Góis entende que quem “comanda” a matéria é o mercado de trabalho. “Se houver, de facto, novas necessidades, ou chegam mais migrantes, ou fechamos alguns setores de atividade e áreas da nossa indústria. Não creio que estejamos em condições de retirar estes setores da economia, portanto, nessa altura, teremos de ser pragmáticos”, vinca o diretor científico do Observatório das Migrações, reativado pelo Governo este ano. E a economia sobrepor-se-á à ideologia? Em 2026 todos saberão.amanda.lima@dn.pt.Governo fecha as portas ainda mais à imigração. “Economia terá que se adaptar”, diz ministro.Burocracia, xenofobia e mudanças nas leis motivam saída de estrangeiros do país