Segurança reforçada com juiz 'espião' e operacional da Proteção Civil
O novo secretário de Estado da Administração Interna, Antero Luís, tem um curriculum forte no setor da segurança. Patrícia Gaspar, que vai ocupar a secretaria de Estado da Proteção Civil, uma ex-militar, não lhe fica atrás - é uma 'combatente' do socorro e emergência
O ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita renovou a sua equipa de secretários de Estado. Limpou o que ainda restava das escolhas da sua antecessora (Constança Urbano de Sousa), afastando a resistente Isabel Oneto, e juntou à equipa dois pesos pesados da segurança e da Proteção Civil.
O novo secretário de Estado da Administração Interna, Antero Luís é juiz desembargador e estava colocado no Tribunal de Relação de Lisboa. A sua assinatura esteve em acórdãos de casos mediáticos, como o hacker Rui Pinto ou dos Hells Angels, nos quais indeferiu os recursos para a sua libertação.
Mas foi no setor da segurança que o seu nome saiu do anonimato. Primeiro como diretor-geral do Serviço de Informações e Segurança, entre 2005 e 2011, durante seis longos anos que ficaram marcados, já no final pela polémica demissão do seu homólogo no Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), Jorge Silva Carvalho.
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Subida a Ministro adiada
Sentou-se depois na cadeira de secretário-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI), onde esteve até 2014 - num desempenho de 'superpolícia' bastante discreto publicamente, ou não tivesse Antero Luís todos os hábitos das secretas.
O desembargador chegou ao SSI depois de terem tornado públicas as grandes fragilidade e limitações do cargo de "superpolícia". O antecessor, juiz conselheiro Mário Mendes pediu a demissão em ruptura com o próprio ministro da Administração Interna, Rui Pereira, alegando que não lhe tinha dado o apoio político necessário para poder coordenar, de facto, as forças e os serviços de segurança, como manda a lei.
Já tinha regressado ao Tribunal de Relação quando, em final de 2014, foi apanhado na 'teia' da "Operação Labirinto", que investigava os negócios em volta dos Vistos Gold.
A escuta que veio a público, na qual o desembargador falava com os dos principais suspeitos investigados, foi esclarecida e não resultou sequer na sua constituição de arguido, mas no setor chegou a ser comentado que essa situação acabou por adiar a subida do magistrado a ministro da Administração Interna, logo no primeiro governo de António Costa.
Antero Luís fez queixa contra o juiz Carlos Alexandre, do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) e contra os procuradores do Ministério Público (MP) titulares do inquérito, pela devassa de que foi alvo na investigação. Mas o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) arquivou o processo.
Pensamento crítico sobre a segurança interna
A sua experiência no setor da segurança e informações serviu-lhe para formar pensamento crítico sobre o modelo de segurança interna do país, quebrando dogmas e ideias preconcebidas.
Numa destas reflexões, partilhada durante uma conferência na Academia Militar, Antero Luís admitiu que uma polícia única é um cenário a pensar para o modelo de segurança interna
Em registo de balanço de um SSI, que completava nesse ano (2018) uma década, Antero Luís lembrou que "o sistema mantém pontos críticos e disfuncional idades identificados já em 2006, no estudo do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI)", que deu origem à Lei de Segurança Interna, em 2008: "multiplicidade de atores e tutelas, sobreposição de competências materiais e territoriais e prevalência da valência reativa sobre a valência pró-ativa ou preventiva".
Um dos três cenários que lançou à audiência para debate, consistia na criação de uma Polícia Nacional, a qual, "a ser encarada, deverá ser apontada para um prazo temporal de não menos de 10 anos". Antero Luís reconhecia que essa solução "carece de grandes investimentos e mudanças ao nível de recursos materiais e financeiros", mas permitiria erradicar "competições e conflitos institucionais" e "otimizar os recursos existentes em cada uma das polícias".
GNR, PSP, PJ e SEF seriam uma única estrutura policial "que deveria depois articular-se de forma estratégica e tática com a Justiça, os Serviços de Informações e as Forças Armadas".
Uma ex-militar que se rendeu à Proteção Civil
Patrícia Gaspar, a 'combatente' mais conhecida da Proteção Civil, onde ocupa o lugar de 2º comandante operacional nacional, é a outra cara nova da equipa de Eduardo Cabrita.
Antiga oficial da Marinha Portuguesa, Patrícia Gaspar tornou-se conhecida através das conferências de imprensa dadas durante o verão negro dos incêndios em 2017.
Mas como revelaria numa grande entrevista de vida ao DN, há pouco mais de um ano, a sua vida mostra que foi muito mais que a aquela cara determinada que dava as más notícias ao público.
Filha de pai militar da Marinha, navegou num submarino com apenas 12 anos e acabou por integrar esse ramo das Forças Armadas.
Foi escolhida para a secção de informações e acabou por fazer carreira no Serviço de Informações Estratégicas e Defesa Militar (atual SIED), responsável por uma das pastas mais quentes da altura: a independência de Timor-Leste.
Foi dela a primeira voz portuguesa que Xanana Gusmão ouviu na cadeia de Cipinang, quando falou através do telefone-satélite que lhe tinha sido levado pelos operacionais portugueses.
Patrícia Gaspar vai ocupar a pasta da qual José Artur Neves se demitiu, após ter sido alvo de buscas do Ministério Público, no âmbito da investigação criminal sobre a compra das golas antifumo.
Em declarações aos jornalistas esta segunda-feira, depois de ter apresentado ao Presidente da República os nomes dos secretários de Estado, António Costa disse que o ministro Eduardo Cabrita "entendeu que devia renovar a sua equipa".
Desta a experiência dos novos secretários de Estado, Antero Luís, "um ilustre magistrado que é juiz desembargador" e que foi diretor dos Serviços de Informações de Segurança e secretário-geral do Sistema de Segurança Interna, e Patrícia Gaspar, que "foi oficial das Forças Armadas, no caso, da Marinha, mas que dedicou grande parte da sua vida à proteção civil".