MP declara segredo de justiça no inquérito às agressões na Amadora
O Ministério Público (MP) declarou segredo de justiça em relação ao inquérito instaurado pela PSP contra Carla Simões, por alegada resistência e coação sobre um agente. A investigação deste processo, no âmbito do qual Carla Simões foi ouvida pelo juiz de instrução criminal na terça-feira e constituída arguida, foi assumido pelo Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) da Amadora.
De acordo com fontes judiciais ouvidas pelo DN, o procurador responsável pelo inquérito é o próprio coordenador daquele DIAP, Helder Cordeiro, e decretou segredo de justiça sobre o processo. Este magistrado ficou conhecido pela acusação contra os 18 polícias da esquadra da Amadora e tem liderado outras investigações relacionadas com violência policial.
Inquéritos por si titulados levaram, em 2019, à condenação de um agente por incidentes em 2015 e 2016 e a um arquivamento num caso em que, apesar de terem ficado provadas agressões a jovens numa esquadra da PSP, não se conseguiu determinar os seus autores. Outro processo, que envolvia um comissário da PSP suspeito de ter agredido um homem no Tribunal da Amadora, foi travado em fase de instrução, mas Helder Cordeiro recorreu, o Tribunal de Relação apoiou e os três agentes acabaram julgados e condenados a penas de prisão de seis a nove meses, transformadas em multas de 1080 a 2160 euros, mais uma indemnização à vítima de 1500 euros.
Carla Simões, cidadã portuguesa de origem angolana residente na Amadora, fez também uma queixa contra o agente da PSP alegando ter sido violentamente agredida, mas este processo ainda não terá chegado ao DIAP. Quando isso acontecer será investigado juntamente com o primeiro. O polícia, que está de baixa médica desde o incidente, não foi ainda ouvido, nem constituído arguido.
Entretanto, do ponto de vista disciplinar, o ministro da Administração Interna (MAI), Eduardo Cabrita, determinou à Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) "a abertura de um inquérito para apuramento dos factos relacionados com a atuação policial ocorrida no domingo, na Amadora, após o pedido de intervenção do motorista de um autocarro de passageiros". O MAI adianta que a PSP "transmitirá à IGAI todos os elementos da averiguação interna que tem estado a realizar".
A mulher detida no domingo na Amadora numa paragem de autocarro diz ter sido agredida por um polícia e ter temido pela vida, garantindo que vai lutar com todas as suas forças contra a violência e o racismo. Num comunicado da sua advogada enviado às redações na quarta-feira à noite, Cláudia Simões, de 42 anos e mãe de quatro filhos, conta que no passado domingo pensou que ia morrer sufocada na rua diante da filha de 8 anos, vítima de agressões policiais.
Vários partidos já pediram esclarecimentos ao MAI sobre a atuação da PSP nesta situação. Na pergunta formal subscrita pelos deputados António Filipe e Alma Rivera, o PCP sublinha que a "gravidade das agressões verificadas exige um total esclarecimento e uma pronta averiguação de responsabilidades por parte das entidades competentes do MAI, para além da intervenção que se justifique por parte das autoridades judiciárias".
Por seu turno, o Grupo Parlamentar do PS considera que, "a confirmarem-se as alegações de Cláudia Simões de que foi agredida posteriormente à algemagem e imobilização, tratar-se-á de condutas merecedoras da mais profunda reprovação, com relevância criminal e impróprias de agentes imbuídos de particulares deveres de respeito pela lei".
O BE considera que as "lesões apresentadas pela cidadã agredida indiciam uma atuação desproporcional e injustificada por parte dos agentes policiais".
A deputada do Livre, Joacine Katar Moreira, entende que "atendendo à gravidade da situação relatada, bem como a um longo e infeliz historial de situações de violência policial que têm vindo a ser conhecidas, perante a passividade da Direção Nacional da PSP, como aliás comprova o facto de 76% das queixas contra agentes policiais na Amadora serem arquivados mesmo nos casos em que esses mesmos agentes contam com condenações criminais (algum deles continuando em funções), é urgente a tomada de medidas para prevenir estas situações no corpo policial e garantir a segurança das populações".
Já o deputado único do Chega, André Ventura, considerou legítima a atuação policial no caso que envolveu um PSP e uma mulher na Amadora, criticando aqueles que "sistematicamente estão contra as forças policiais com a paranoia do racismo".