Guerra no Livre pode acabar na punição do assessor de Joacine
"Apurar os factos subjacentes ao conflito entre o Grupo de Contacto e a deputada do Livre e o seu gabinete." Esta é uma das missões atribuídas pelo Conselho de Jurisdição (CJ) do Livre à sua Comissão de Ética e Arbitragem (CEA) para analisar o conflito que opõe a direção executiva do partido (órgão denominado Grupo de Contacto) à deputada Joacine Katar Moreira. O CJ diz que a CEA poderá "propor atuação disciplinar, se for caso disso" e, ao avançar que o procedimento envolve também o gabinete de Joacine Katar Moreira na Assembleia da República (AR), está a querer dizer que quem está também na mira é o mediático assessor da deputada, Rafael Esteves Martins. O relator do processo será o advogado Ricardo Sá Fernandes - que tem sido adepto, dentro do Livre, de uma atitude de conciliação entre as partes em confronto.
O caso que opõe a direção à deputada já é conhecido desde sábado passado: a direção achou estranho que Joacine Katar Moreira se tenha abstido num voto apresentado pelo PCP (e aprovado) que condenava Israel por ataques a Gaza. Historicamente, o Livre sempre foi um partido pró-palestiniano e, segundo a direção do Livre, a deputada deveria ter votado a favor do voto proposto pelo PCP.
Desde então multiplicaram-se os acontecimentos. Rafael Esteves Martins foi, por exemplo, quem fez saber ao DN, por sms, que tinha sido por "insistência" de Rui Tavares que, no domingo, a Assembleia do Livre (órgão máximo entre congressos) deliberou pedir a intervenção do CJ no caso.
Foi também quem tratou de arranjar escolta da GNR para um percurso a pé da deputada dentro do edifício do Parlamento, escolta pedida para evitar perguntas dos jornalistas. Qualquer jornalista que queira contactar a deputada tem de passar por ele antes.
No Twitter reagiu desabridamente contra os jornalistas que procuravam a deputada no Parlamento: "Larguem o osso." Também se recusou a responder a quem lhe perguntava por que razão o Livre tinha falhado o prazo de agendamento do seu projeto de lei de revisão da Lei da Nacionalidade.
Rafael Esteves Martins começou por dar nas vistas logo no primeiro dia de plenário da nova legislatura quando foi vestido de saia para o Parlamento, acompanhando sempre a deputada eleita do Livre.
Investigador bolseiro, com formação em estudos artísticos (licenciatura) e comparatistas (mestrado), Rafael, nascido em Lisboa há 31 anos, desde cedo despertou para a política: foi dirigente associativo da Escola Secundária Padre Alberto Neto e presidente de três comissões eleitorais da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; corredator pelo Manifesto por Um Futuro Europeu; sócio fundador da Estufa - Plataforma Cultural (Torres Vedras).
Foi militante da Juventude Comunista Portuguesa (JCP) antes de ser fundador do Livre, o partido liderado por Rui Tavares e que pela primeira vez elegeu um deputado à Assembleia da República, a afrodescendente Joacine Katar Moreira. Era até hoje Leitor de Português na Universidade de Oxford, onde está a terminar o doutoramento. E é também especialista em Literatura Luso-Brasileira dos séculos XVI a XVIII.
Hoje, por intervenção do presidente da Assembleia da República, o Livre conseguiu finalmente ter a certeza de que vai conseguir discutir no dia 11 o seu projeto de revisão da Lei da Nacionalidade juntamente com outros três projetos já apresentados: do BE, PCP e PAN.
Ferro Rodrigues emitiu um despacho de admissibilidade da iniciativa da deputada única do partido da papoila, Joacine Katar Moreira, no qual se lê: "Tendo sido obtido o necessário consenso, admito, a título excecional, o agendamento do projeto de lei n.º 126/XIV/1.ª (L), nona alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade), para a sessão plenária de 11 de dezembro, juntamente com as demais iniciativas conexas, atentas as vantagens que decorrem da discussão conjunta, nomeadamente para o ulterior processo legislativo."
De acordo com fontes parlamentares, Ferro Rodrigues contactou os responsáveis das sete bancadas com assento na conferência de líderes e obteve a sua concordância para ultrapassar o impasse gerado na terça-feira, quando o projeto de lei do Livre foi entregue, mas fora do prazo informalmente acordado entre os diversos partidos na legislatura anterior, uma espécie de "acordo de cavalheiros", à margem do regimento da Assembleia da República.
Segundo as mesmas fontes, citadas pela Lusa, o PCP, que tinha sido um dos partidos, tal como o PS, a rejeitar a hipótese de arrastamento da iniciativa do Livre, reformulou a sua posição depois de saber que a deputada Joacine Moreira nunca fora informada do prazo que vigorava.
Outro dos aspetos que também marcam os dias agitados que se vivem no Livre, desde que elegeu pela primeira vez um deputado, é a saída do partido de membros fundadores como Miguel Dias ou Ricardo Alves. O primeiro anunciou terça-feira, através do Twitter, o seu abandono, uma decisão que não se deve a divergências ideológicas, mas a "uma questão de forma e de postura política", na qual diz ter deixado de se rever.
Antes já Ricardo Alves, também ele fundador do Livre, tinha concretizado a sua saída logo no dia das eleições. Esta quinta-feira, em declarações ao DN, lamentou que bandeiras como a ecologia, o europeísmo e os direitos laborais tenham sido "relegadas para segundo plano" e considerou que Joacine Katar Moreira é "causa de consequência da mudança de rumo" do partido.