Comecemos pela inversão na tendência de queda do número de efetivos. Essa tendência se confirmou e se é estrutural ou apenas conjuntural?Neste momento, já podemos afirmar que temos sinais fortes de que, estruturalmente, o aumento do efetivo está a acontecer. Temos um aumento significativo de candidaturas para o serviço militar, com grande expressão quer nos quadros permanentes, quer no regime de voluntariado e contrato. Estamos a crescer cerca de 8% ao ano nas candidaturas.Há nichos em que estamos a ser particularmente atrativos, o que também resulta de medidas que foram recentemente implementadas — nomeadamente no curso de Praças do Quadro Permanente.Esse tem sido, de facto, um caso de sucesso: registámos um aumento de cerca de 36% nas candidaturas a esta categoria, o que é muito significativo. Esse crescimento resulta, por um lado, da criação deste quadro específico para as praças, que o Exército há muito necessitava, e, por outro, do facto de a revisão da grelha salarial ter beneficiado mais precisamente esta categoria..Temos, assim, mais candidaturas, e o efetivo do Exército aumentou cerca de 6%, face a 2024. (Do total de 13 135 de efetivo atual, 11.395 são militares e 1.740 civis, com uma projeção de crescimento para 13.397 efetivos até final de 2025; o efetivo estrutural tem 20.070 militares e 3.341 civis).. Temos, assim, mais candidaturas, e o efetivo do Exército aumentou cerca de 6%, face a 2024. (Do total de 13 135 de efetivo atual, 11.395 são militares e 1.740 civis, com uma projeção de crescimento para 13.397 efetivos até final de 2025; o efetivo estrutural tem 20.070 militares e 3.341 civis). . Porém, ainda continuamos com défices significativos. Isto quer dizer que temos de continuar a trabalhar — nós, Exército, a fazer o que nos compete, e em diálogo permanente com a tutela — para encontrar medidas que reforcem ainda mais a nossa competitividade.É uma palavra que gosto de usar: competitividade no mercado de trabalho. Num país que está praticamente em pleno emprego, temos de ser competitivos com outras instituições, e as pessoas são as que são. Mas sim, estamos hoje mais competitivos e temos mais candidatos ao Exército.E como é que estão a ser competitivos? Porque é que os jovens estão a aderir mais num momento de pleno emprego?O grande fator diferenciador foi o vencimento. Não tenhamos dúvidas: houve uma relação direta entre as medidas implementadas pelo Governo — nomeadamente o aumento dos vencimentos nas categorias de praças — e o aumento do número de candidaturas ao Exército..Não tenhamos dúvidas: houve uma relação direta entre as medidas implementadas pelo Governo — nomeadamente o aumento dos vencimentos nas categorias de praças — e o aumento do número de candidaturas ao Exército.. O valor ficou acima do salário mínimo nacional, e foi também feita uma correção no suplemento de condição militar. Naturalmente, precisamos de continuar a crescer, e por isso defendo que, com diálogo franco, aberto, leal e reservado com a tutela, devemos continuar a ajustar a grelha salarial, que ainda carece de aperfeiçoamentos.Mas há outras dimensões igualmente importantes: estamos a apostar na formação das pessoas e na qualidade dessa formação. Quando falamos em qualidade, não se trata apenas da formação essencialmente militar, mas também da formação alinhada com o Catálogo Nacional de Qualificações.Ou seja, todos os militares que ingressam no regime de contrato especial e no quadro permanente de praças, bem como os sargentos, têm hoje uma formação certificada e alinhada com o sistema nacional de qualificações. Fazem um curso de nove meses para atingirem, respetivamente, o nível cinco no caso dos sargentos e o nível quatro no caso das praças.Que tipo de formação é mais procurada? Desde logo, mecatrónica, mecânica, alimentação e transportes. São formações já certificadas e que representam uma mais-valia para o Exército, porque formam pessoas mais qualificadas, que depois exercem funções que exigem essa especialização.No caso dos camaradas que pretendam regressar à vida civil, existe um mecanismo próprio que lhes facilita a integração no mercado de trabalho.Nós não temos lugar para todos — nem todos podem permanecer como praças do quadro permanente — e é nessa perspetiva que esta formação se revela tão útil. Estamos, de facto, a começar a ter resultados muito positivos com este modelo formativo.E têm já alguma ideia da taxa de empregabilidade, digamos assim, para quem sai do Exército com essa formação?Ainda não temos dados consolidados, porque este sistema tem apenas três anos de aplicação.E eu sou muito sincero: sei que é importante garantir empregabilidade, mas, como Comandante do Exército, o que eu quero é que eles fiquem connosco — que fiquem qualificados e integrem o quadro permanente.Por isso é que este sistema tem alguma progressividade. Defendo que o Exército deve ter militares do regime de voluntariado e contrato, militares do novo regime de contrato especial e militares do quadro permanente. É um sistema virtuoso, porque permite às pessoas evoluírem dentro da instituição.Com esta estrutura graduada, conseguimos que os camaradas permaneçam mais tempo no Exército, até transitarem para o quadro permanente — no caso das praças — e, naturalmente, com trajetórias distintas para oficiais e sargentos. É um sistema muito bom, muito benéfico para o Exército..Estamos a assistir, internamente, a uma mudança de mentalidade. Os nossos militares — sobretudo na categoria de praças — estão hoje com maior autoestima e autoconfiança.. Estamos a assistir, internamente, a uma mudança de mentalidade. Os nossos militares — sobretudo na categoria de praças — estão hoje com maior autoestima e autoconfiança.Isso é fundamental. O soldado do Exército português é um cidadão muito qualificado, e tem de interiorizar e acreditar nas qualificações que adquire.. Ganha o Exército, porque passa a ter militares mais qualificados, mais confiantes e mais autónomos. E esse é um trabalho em curso — uma transformação de mentalidade, que muda não só a perceção do próprio soldado, mas também do sargento e do oficial.E há um outro aspeto: é importante que a sociedade portuguesa também perceba o nível de qualidade que existe hoje no Exército. Muitas pessoas ainda olham para nós com a matriz do serviço militar obrigatório..Muitas pessoas ainda olham para nós com a matriz do serviço militar obrigatório. Dou-lhe um exemplo: há pouco tempo recebi uma carta de um autarca a pedir militares para ir arrumar cadeiras num cinema. Isto traduz bem a perceção que ainda existe. Mas o Exército não é nada disso. O Exército é uma instituição que funciona com pessoas altamente qualificadas.. Dou-lhe um exemplo: há pouco tempo recebi uma carta de um autarca a pedir militares para ir arrumar cadeiras num cinema. Isto traduz bem a perceção que ainda existe. Mas o Exército não é nada disso. O Exército é uma instituição que funciona com pessoas altamente qualificadas, militares e também trabalhadores civis. E, neste ponto, temos um défice importante. Tínhamos nos nossos estabelecimentos fabris mestres e professores de grande qualidade, que fomos perdendo ao longo dos anos — e continuamos a perder. É, por isso, fundamental repor essa mão de obra civil, essencial ao funcionamento do Exército.Qual é o défice civil e militar que o Exército enfrenta neste momento?O défice é elevado. Neste momento, os efetivos militares e civis permitem atingir mais de 50% (56,8%) do efetivo estrutural do Exército, ou seja, apenas metade do necessário para garantir o funcionamento pleno da instituição..Neste momento, os efetivos militares e civis permitem atingir mais de 50% (56,8%) do efetivo estrutural do Exército, ou seja, apenas metade do necessário para garantir o funcionamento pleno da instituição.. Mas, se olharmos para a categoria das praças, que é a mais gravosa, andamos na casa dos 35% de preenchimento. Ou seja, estamos, portanto, muito abaixo dos que seriam desejáveis, e isso obriga a acelerar o ritmo de recrutamento e de retenção.E qual é a vossa perspetiva em termos de evolução?Estamos todos a aprender. Mas conseguimos algo que, há pouco tempo, muitos julgavam impossível: inverter o ciclo de decréscimo. Durante anos, o efetivo do Exército vinha a cair — desde 2011 — e conseguimos estancar essa descida em apenas dois anos, o que é notável para uma instituição desta dimensão.. Em dois anos, aumentámos 6% do efetivo e reforçámos em cerca de uma centena de novos quadros permanentes. Isto reflete, sobretudo, uma grande sincronia entre a instituição militar e a tutela. Quero sublinhar isto: sentimo-nos escutados e apoiados pela tutela. Naturalmente, estamos conscientes das limitações do país, mas temos sido apoiados — e sozinhos não conseguiríamos.A grande responsabilidade que tenho como Chefe Militar é manter lealdade e frontalidade com a tutela, mas também fazer dentro do Exército tudo o que nos compete.Lembro-me de, há algum tempo, numa reunião internacional, alguém dizer “temos de ser agradáveis”. E fiquei a pensar — quem é que quer vir para uma instituição onde não se sente bem?Logo no início do meu mandato, falei com a minha área de comunicação e disse: “Quero fotografias de pessoas no Exército com um sorriso.”Porque quem é que quer pertencer a uma instituição onde não é bem acolhido, onde não se sente bem? Isto não tem nada a ver com falta de rigor ou de exigência — pelo contrário.Ninguém quer vir para uma instituição que não é exigente, muito menos para uma instituição cuja missão última é combater, fazer a guerra.Mas há várias dimensões dessa atratividade: quem é que quer vir para um Exército mal equipado, com imagem pública de material velho, degradado ou desatualizado?.Mas há várias dimensões dessa atratividade: quem é que quer vir para um Exército mal equipado, com imagem pública de material velho, degradado ou desatualizado?. Quem é que quer servir numa instituição com infraestruturas degradadas, alojamentos precários ou alimentação insuficiente? Tudo isto conta. Tudo isto influencia a atratividade da instituição.E o Exército de hoje já não é assim?Não, já não é tanto assim. Temos vindo a inverter esse ciclo de perceção, interna e externa, em relação aos nossos soldados.Falamos muito de progressividade, porque com a geração que temos hoje, não conseguimos formar um soldado pronto a combater no mesmo tempo que tínhamos há 20 ou 30 anos.Há fatores novos — psicológicos, sociais, de mentalidade — e é preciso trabalhar a resiliência.Por isso, no domínio da formação e das forças especiais, implementámos programas de resiliência psicológica, com o apoio dos nossos serviços especializados.E os resultados são bons. Traduzem-se numa menor taxa de atrição na formação — ou seja, menos desistências e abandonos. Quando queremos ter mais gente, não basta recrutar mais: é essencial reter mais..Aumentámos em cerca de 30% a nossa taxa de retenção no Exército num prazo de dois anos. Hoje, o tempo médio de permanência de um militar em regime de voluntariado ou contrato é de três anos e meio, quando antes era pouco mais de dois.. E esse é outro dado importante: aumentámos em cerca de 30% a nossa taxa de retenção no Exército num prazo de dois anos. Hoje, o tempo médio de permanência de um militar em regime de voluntariado ou contrato é de três anos e meio, quando antes era pouco mais de dois.Esse ensinamento em resiliência , no fundo, é para ajudar o jovem a resistir a contrariedades, é uma competência que também se aplica à sociedade em geral...Exatamente. Nós somos, muitas vezes, chamados a partilhar essa experiência com a sociedade civil, com organizações e instituições diversas. Sabemos que temos de mudar, sabemos o que é preciso mudar e também como temos de mudar..O grande desafio é que há muito para fazer, e temos de atuar em várias frentes ao mesmo tempo, num curto espaço de tempo. Temos dois tempos — dois anos — para realizar esta grande transformação.Dois anos? Porquê?Porque os compromissos que assumimos em termos de objetivos de força começam a vigorar a partir de 2028. Temos, portanto, de começar já a ter muitas coisas prontas: efetivos, estruturas, equipamentos, mas também aproveitar os mecanismos financeiros que estão em curso.Naturalmente, temos o Orçamento do Estado, que financia o funcionamento corrente, e a Lei de Infraestruturas Militares, que trata do investimento. Mas há outros instrumentos de financiamento que é fundamental aproveitar — como aconteceu com o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), e agora com o mecanismo SAFE da União Europeia, que termina em 2030.É agora que temos de agir — com pragmatismo e objetividade — ou perderemos uma oportunidade única. E essa é, para mim, a grande responsabilidade como Chefe do Estado-Maior do Exército.Digo muitas vezes aos meus camaradas: estamos perante uma das maiores responsabilidades que o Exército teve nos últimos 50 anos..Digo muitas vezes aos meus camaradas: estamos perante uma das maiores responsabilidades que o Exército teve nos últimos 50 anos.. Esta é, talvez, a única oportunidade que o Exército tem de voltar a crescer. Se não a aproveitarmos agora, os nossos camaradas mais novos — aqueles para quem estamos a construir este Exército — irão julgar-nos por isso.Eu já não verei este Exército em plena atividade, é um processo longo, mas é por isso mesmo que temos de o construir agora, com coesão, visão e propósito. O Exército tem de saber o que quer, para onde quer ir e como quer ir. Tem de trabalhar com uma perspetiva de futuro, olhando para o horizonte de 2045, que é quando todo este processo de transformação deverá estar consolidado.Já falaremos disso. Vamos agora ao investimento. Este ano, Portugal atinge pela primeira vez os 2% do PIB em Defesa. Pode concretizar como é que esse reforço foi canalizado para o Exército? Tivemos um reforço orçamental já este ano, de cerca de 177 milhões de euros, canalizados para a Lei de Programação Militar (LPM). Esse montante chegou ao Exército em setembro, e tomámos a opção de direcionar o investimento — cerca de 107 milhões de euros — para programas que já existiam na LPM.Desde logo, os módulos de comunicações do Exército, que estão a ser fabricados em Portugal, numa empresa do universo da defesa, com conceção desenvolvida pela Engenharia do Exército.Ou seja, foi a própria Engenharia do Exército que fez todo o trabalho de conceção destes módulos.O contrato já previa opções de alargamento do número de sistemas, e vamos agora exercer essas opções. Os pedidos já estão no Ministério da Defesa, e isso permitirá fabricar mais módulos e cumprir o objetivo de força, que é ter duas brigadas equipadas com estes sistemas de comunicações.Esse programa de comunicações que referiu — estava previsto para quando, se não fosse este reforço orçamental?Esse programa já estava em curso. O que acontece é que, com este aumento de financiamento, vamos conseguir atingir o nível de ambição que tínhamos definido.. O financiamento anterior, devido ao aumento dos preços, já não permitia cumprir integralmente as metas que o Exército se propôs alcançar.Outro projeto que estamos a reforçar é o do software de comando e controlo. Hoje, o combate é altamente digitalizado, e precisamos de sistemas de software que corram sobre os módulos de comunicações, permitindo exercer o comando e controlo de forma integrada e em rede.Também este projeto contará com a participação de uma empresa portuguesa, a Critical Software, com quem trabalhamos há já bastante tempo e que deverá obter a licença para desenvolver este sistema.Sei que estão em negociações com a empresa detentora do sistema base, mas a probabilidade de ser a Critical Software a concretizar este trabalho é muito elevada — e isso é muito importante.Aliás, temos uma parceria de longa data com a Critical Software: o sistema atual de comando e controlo de operações, que vamos ver mais adiante no terreno, foi desenvolvido por esta empresa.Mas posso dizer-lhe que demorou cerca de oito anos a ser desenvolvido, algo impensável nos dias de hoje, em que tudo tem de acontecer com muito mais rapidez..Outro projeto reforçado é o da renovação e melhoria das viaturas Pandur. É um processo praticamente em vias de ser autorizado, com um reforço de cerca de 100 milhões de euros, e será executado maioritariamente em Portugal, por empresas portuguesas.. Outro projeto reforçado é o da renovação e melhoria das viaturas Pandur. É um processo praticamente em vias de ser autorizado, com um reforço de cerca de 100 milhões de euros, e será executado maioritariamente em Portugal, por empresas portuguesas.Temos ainda outro programa que é, hoje, inquestionável: o da artilharia antiaérea. Era um projeto que estava muito subfinanciado. Para se ter uma ideia, os custos destes equipamentos aumentaram dez vezes desde o início da guerra na Ucrânia. É disso que estamos a falar. Por isso, vamos reforçar o investimento nos sistemas de artilharia antiaérea.O processo de aquisição já está em curso — trata-se de um sistema de ponta, um dos mais modernos do mundo, com radar e sistemas integrados. Vamos exercer as opções previstas no contrato, o que nos vai permitir comprar mais unidades deste sistema antiaéreo.E de que tipo de sistemas estamos a falar? Quantos vão ser adquiridos?No estado final, teremos cerca de seis sistemas completos, incluindo os radares.. E o primeiro sistema será adquirido já este ano?Sim, o processo aquisitivo para o primeiro já está em curso, através da Agência da NATO.Agora vamos exercer as opções complementares, o que nos permitirá adquirir mais sistemas ao preço garantido pelo contrato inicial.Temos ainda, no âmbito deste reforço de 177 milhões de euros, um aumento de investimento nos sistemas anticarro, outro projeto que já estava em curso também através da Agência da NATO.Com este reforço, conseguimos atingir os níveis de ambição definidos para essas capacidades..Em síntese, este reforço extraordinário de 177 milhões de euros na Lei de Programação Militar vai permitir que os programas já em curso atinjam o nível de ambição previsto.. Em síntese, este reforço extraordinário de 177 milhões de euros na Lei de Programação Militar vai permitir que os programas já em curso atinjam o nível de ambição previsto.Optámos por aplicar os fundos de forma criteriosa, não em novas capacidades, mas no reforço das que já estavam contratadas, garantindo execução financeira e operacional dentro do prazo deste ano.E para 2026 — que trabalho está previsto?A partir do início do ano vamos trabalhar na revisão da Lei de Programação Militar.E quais são as suas ideias para essa revisão?Em termos de revisão da LPM, os programas de cooperação militar terão de aumentar em diversidade e em quantidade.Alguns programas estruturais já contemplavam, por exemplo, a artilharia antiaérea e a substituição de viaturas — há equipamentos que datam de décadas. .Como disse, “como é que eu consigo atrair um cidadão para vir servir no Exército e dar-lhe uma viatura de 1950?” — só como peça de museu. Não podemos pedir a alguém que confie na instituição se não lhe damos condições e meios adequados.. Como disse, “como é que eu consigo atrair um cidadão para vir servir no Exército e dar-lhe uma viatura de 1950?” — só como peça de museu. Não podemos pedir a alguém que confie na instituição se não lhe damos condições e meios adequados..Não se trata de procurar caprichos ou o equipamento mais moderno do mundo: trata-se de garantir aos soldados portugueses que, quando tiverem de cumprir uma missão, terão condições e equipamento suficientes para cumprir em segurança. Isso é a prioridade.Estamos a trabalhar na substituição das viaturas e em novos mecanismos de financiamento, como o SAFE (um instrumento ao qual podemos recorrer). Temos também vários projetos inscritos no SAFE, que articularão com a revisão da LPM. Não há só o Orçamento do Estado — há outros mecanismos que podemos aproveitar.Que dimensão de financiamento estamos a perspectivar com o SAFE?O SAFE permitirá abarcar projetos entre 1,2 e 5 mil milhões de euros, portanto, um volume enorme, com regras próprias. Temos de ser pragmáticos: os projetos têm de ser multinacionais e outros países têm de os inscrever como tal no sistema.Candidatámo-nos, por exemplo, ao projeto de substituição da M113 pela viatura Boxer, um projeto alemão (desenvolvido pela ARTEC, consórcio entre a Krauss-Maffei Wegmann e a Rheinmetall), onde estamos em negociações. Estamos também em processos com o obus Caesar (Camion Équipé d’un Système d’Artillerie) francês para artilharia de campanha; com sistemas antiaéreos (mísseis), munições de artilharia e munições para carro de combate; com sistemas contra drones; e com sistemas aéreos não tripulados. Há um projeto com uma empresa portuguesa em Évora que os três ramos das Forças Armadas vão partilhar — liderado pelo Ministério e pela Força Aérea, ao qual o Exército aderiu.É um financiamento que permitirá modernizar. Para mim, os projetos prioritários na LPM incluem robótica, reforço da artilharia antiaérea, guerra electrónica e o reforço de sistemas aéreos e terrestres não tripulados. Vai ser uma modernização ímpar: um Exército muito mais tecnológico, com grandes desafios para as pessoas, mas que tem um norte claro.E qual é o calendário e a urgência destas decisões?O centro de gravidade da modernização é atingir os objetivos de força com que Portugal se comprometeu na NATO — e esses objetivos colocam a centralidade das forças terrestres no combate moderno. .Cerca de 60% dos novos targets que a NATO fixou para Portugal são para o Exército. Portanto, o Exército enfrenta um enorme desafio de modernização, a ser executado em muito pouco tempo. As decisões têm de ser tomadas num espaço de dois anos — não podemos prolongar além disso.. Cerca de 60% dos novos targets que a NATO fixou para Portugal são para o Exército.Portanto, o Exército enfrenta um enorme desafio de modernização, a ser executado em muito pouco tempo. As decisões têm de ser tomadas num espaço de dois anos — não podemos prolongar além disso.Nessa relação com a indústria, nomeadamente no âmbito do financiamento através do SAFE e da cooperação com a indústria europeia, sente também pressão entre os Estados Unidos e a Europa? Há uma concorrência semelhante à que se está a assistir na substituição dos F-16 na Força Aérea — entre o F-35 americano e as alternativas europeias?Não, não tem havido essa pressão da mesma forma.O nosso equipamento tem sido adquirido maioritariamente através da Agência da NATO, em concursos públicos internacionais, abertos a todos.Podem concorrer empresas norte-americanas, europeias ou de outros países, e ultimamente esses concursos têm recaído tanto em tecnologia europeia como americana.Portanto, também há equipamento americano no Exército português.Sim, também temos. São as regras do mercado. Naturalmente, esperamos que os Estados Unidos apareçam agora com mais força, mas, quando Portugal optou por recorrer ao mecanismo SAFE, aceitou as suas regras próprias, que privilegiam a produção em território europeu.E é nesse enquadramento que se inscrevem os programas que referi.E a indústria europeia — e em particular a portuguesa — está preparada para responder a essas necessidades?Temos feito um grande esforço nesse sentido, porque sentimos claramente essa necessidade.Quando tomei posse, disse o seguinte: “Em Portugal há um cluster aeronáutico que apoia a Força Aérea; há um cluster naval que apoia a Marinha — e onde está o cluster terrestre?”A partir daí, lançámos uma estratégia para convencer a indústria portuguesa de que vale a pena investir nos sistemas terrestres, que são muito mais acessíveis e promissores para o nosso país..Promovemos encontros entre a academia e a indústria, grandes eventos, e um deles foi precisamente o que realizámos com o Diário de Notícias e a Landing Industry — um enorme sucesso.. Promovemos encontros entre a academia e a indústria, grandes eventos, e um deles foi precisamente o que realizámos com o Diário de Notícias e a Landing Industry — um enorme sucesso.Recordo-me bem: vários industriais nacionais e internacionais disseram-me que houve um slide apresentado pelo vosso jornal que lhes mudou a mentalidade. Era uma imagem simples: no centro, uma viatura, e à volta, todos os componentes que entram nessa viatura.Os industriais nacionais disseram-me: “Não há nada ali que nós não consigamos fazer em Portugal.” E os grandes players internacionais disseram-me: “Não tínhamos ideia da capacidade instalada que existe em Portugal.”A partir daí, tornou-se mais fácil atrair empresas, como o fabricante das viaturas Pandur, que aceitou realizar em Portugal a renovação e modernização das viaturas.O mesmo está a acontecer com outros fabricantes que querem instalar-se em Portugal para produzir e manter equipamentos terrestres. E há aqui outra grande oportunidade: a sustentação ao longo do ciclo de vida dos equipamentos, que é altamente apelativa para a indústria, nacional e internacional.Mas não sente que tem havido uma narrativa mais centrada na defesa aeronaval — numa visão de Portugal como país sobretudo atlântico? O Exército não corre o risco de perder centralidade?Estranho muito a forma como, por vezes, a nossa academia e o debate público tratam a defesa nacional — como se fosse autónoma e autossuficiente, e como se Portugal pudesse controlar sozinho todo o seu espaço aéreo, marítimo e terrestre.Mas, por outro lado, somos membros da NATO e da União Europeia. Como país, adotámos estrategicamente o princípio da defesa coletiva e da segurança cooperativa. Ou seja, só nos conseguimos defender integrados nestas alianças — europeus e americanos — e aqui todos contam.Cada um contribui com aquilo que tem. Nós estamos na Roménia e na Eslováquia, por exemplo, porque damos o nosso contributo à defesa do espaço euro-atlântico. E queremos também a solidariedade dos nossos aliados. Se estivermos ameaçados, esperamos que estejam connosco, como nós estamos agora com eles.O Exército também tem de ter capacidades, certo?Claro que sim — temos de ter essas capacidades, não só para projetar força, mas também para defender. Se queremos defender-nos, temos de contribuir para a defesa de todo o espaço coletivo.Compreendo que exista, em parte da opinião pública e da academia, uma perceção de que é mais urgente defender os espaços aéreo e marítimo — e estou completamente de acordo.Mas hoje a defesa faz-se em todos os domínios: naval, aéreo, terrestre, cibernético, espacial e informacional.Já não existe uma defesa separada da terra, do mar e do ar — é uma defesa integrada, aquilo a que hoje chamamos operações multidomínio, onde todos são relevantes..Nunca me ouviram dizer que o espaço aéreo ou o marítimo são mais ou menos importantes do que o terrestre. Todos são importantes. Todos contribuem para a defesa do território. É um pouco como a nossa epopeia marítima: fomos ao mar descobrir o mundo, mas o que lá deixámos foram fortalezas em terra. Precisamos de estar na terra e de defender a terra.. Por isso, nunca me ouviram dizer que o espaço aéreo ou o marítimo são mais ou menos importantes do que o terrestre. Todos são importantes. Todos contribuem para a defesa do território.É um pouco como a nossa epopeia marítima: fomos ao mar descobrir o mundo, mas o que lá deixámos foram fortalezas em terra. Precisamos de estar na terra e de defender a terra.Há pouco tempo estive no Brasil, e fizeram questão de me levar a um forte no meio da Amazónia, dizendo: “Os portugueses vieram até aqui.” Ou seja, as nossas fronteiras foram delimitadas em terra pelos portugueses.O mesmo aconteceu em África: as fronteiras dos países africanos de língua portuguesa foram definidas pelo Exército. Foi aí que percebi o verdadeiro significado disso — quando me ofereceram um livro que o Exército patrocinou sobre as fortificações nos Açores.Quando falamos dos Açores, pensamos em mar, mas os Açores são terra — e têm mais de 300 fortificações nas suas ilhas. Portanto, a terra precisa de ser defendida.Há outro ponto essencial: as operações militares e os conflitos atuais são, sobretudo, pelo domínio e controlo dos vários espaços — aéreo, terrestre e naval. Temos de saber defender-nos em todos, e isso só é possível se estivermos integrados, coordenados e sincronizados..As soluções terrestres continuam a ter enorme relevância. Veja-se o que acontece hoje na Ucrânia: defende-se a terra, defendem-se pessoas, e as forças terrestres estão com as pessoas, no território, junto das populações. Essa é uma especificidade muito própria e continua muito atual.. As soluções terrestres continuam a ter enorme relevância. Veja-se o que acontece hoje na Ucrânia: defende-se a terra, defendem-se pessoas, e as forças terrestres estão com as pessoas, no território, junto das populações. Essa é uma especificidade muito própria e continua muito atual.Agora, é verdade que a forma de empregar as forças terrestres mudou. As características e exigências são hoje diferentes — muito mais elevadas. As forças terrestres cumprem várias funções, todas alinhadas e coordenadas..O que é que verificamos hoje no combate terrestre? Que a exigência continua a mesma, a violência continua a mesma, mas surgiram novos vetores, de que tanto se fala — os drones, a robótica, os sensores inteligentes.. O que é que verificamos hoje no combate terrestre? Que a exigência continua a mesma, a violência continua a mesma, mas surgiram novos vetores, de que tanto se fala — os drones, a robótica, os sensores inteligentes.E o que é que isso trouxe? Em primeiro lugar, o desassossego do campo de batalha: hoje, estejamos onde estivermos, podemos estar a ser observados — por um satélite, por um drone, por um sensor qualquer. É o que os especialistas chamam “a transparência do campo de batalha.”Depois, há um fluxo gigantesco de informação produzido por todos esses sensores. E é aí que o Exército entra.Os soldados também estão a receber essa informação?Sim. Os soldados são hoje recetores e emissores de dados, integrados num sistema global de informação. Quando dizemos que “a Força é um sistema de sistemas”, é exatamente isso: começa no soldado e termina no sistema de comando e controlo. Todos estão a contribuir com informação em tempo real.Todos estão a contribuir com informação em tempo real?Estamos todos ligados, estamos todos ligados. O que é que o drone nos traz hoje? O drone hoje atua na capacidade de ver mais longe e em tempo real. Permite isso e permite um aumento dos fogos de letalidade a maior distância e com maior precisão e em tempo mais curto. E estes são os desafios que nos estão a trazer. .Hoje, o espaço que medeia entre o solo e os 1 000 metros de altitude está completamente saturado de uma nova ameaça que são os drones e no qual nós temos de atuar. Temos de atuar do nosso lado, ocupando esse espaço e contrariando essa ameaça. E por isso é que o Exército, nos seus programas de reequipamento, no que diz respeito à artéria antiaérea, a sua ameaça antidrone, é uma das nossas grandes prioridades.. Ou seja, hoje, o espaço que medeia entre o solo e os 1 000 metros de altitude está completamente saturado de uma nova ameaça que são os drones e no qual nós temos de atuar. Temos de atuar do nosso lado, ocupando esse espaço. E temos de atuar do nosso lado, contrariando essa ameaça.E por isso é que o Exército, nos seus programas de reequipamento, no que diz respeito à artéria antiaérea, a sua ameaça antidrone, é uma das nossas grandes prioridades. Nós temos de ser capazes de neutralizar e eliminar essa ameaça. E essa ameaça é neutralizada com meios cinéticos que custam muito. . Eu não posso disparar um míssil contra um drone — custa 500 euros. Não é viável. Portanto, temos de ter outros sistemas que podem ser cinéticos de fogos ou guerra electrónica. Portanto, é isso que nós estamos a trabalhar. É isso que está nos nossos programas de investimento, acompanhando a tecnologia que temos disponível no mercado e também com a academia, onde estamos a desenvolver projetos próprios de investigação, desenvolvimento e inovação em sistemas contra a droga, através do nosso Centro de Investigação e Desenvolvimento, a Academia Militar.Vamos até 2045 — para me explicar um pouco o que é o modelo da Força Terrestre 2045. E também fico curiosa para perceber como é que conseguimos antecipar o que vai ser necessário a um Exército daqui a 20 anos, quando a tecnologia muda tão rapidamente? Como se consegue planear a 20 anos?Não é fácil. Deixe-me dar um exemplo engraçado. Quando fui a um evento internacional estava um fabricante de viaturas e eu, na altura com a mentalidade da década de 90, olhei para a viatura e estava a vê-la por fora. .Gostava de ver como ela se chamava. Às tantas o senhor chama-nos assim: “Senhor general, você está a olhar para a viatura numa perspectiva errada.” Eu disse: “Sim, senhor.” “Você tem de vir comigo para dentro da viatura.” Eu fui para dentro da viatura e ele diz-me assim: “Você já sabe, é que 70% do preço desta viatura está aqui dentro.” Portanto, toda a digitalização e o ferro eram mais o sistema digital que estava dentro da viatura: sensores situacionais, controlo de tiro. Isto para dizer que os fundamentos podem não variar muito, mas a tecnologia vai ser enorme.Nós sabemos que os ciclos de evolução dos nossos equipamentos e sistemas de armas vão ser muito mais curtos. Isto é hoje. Nós chegámos a ter ciclos de 40 anos; depois passou para 20. Na Pandur já estamos em 10, e as próximas viaturas, se calhar, vão ter ciclos de dois ou três anos — vão ter de estar constantemente atualizadas. Ora, isto é uma novidade para o Exército, mas não é uma novidade para a Força Aérea, por exemplo. Os sistemas estão em constante atualização e isto vai ser uma realidade com que o Exército terá de viver: as atualizações constantes dos seus sistemas de armas.Quando falo de atualizar o carro de combate, sei que o carro de combate vai atingir o limite da sua evolução até 2040 e que a sua evolução vai ser sobretudo na sua digitalização. Já nos inscrevemos no consórcio internacional que está a desenvolver a viatura que vai substituir o carro de combate. Trabalhamos com a Força Aérea: a Força Aérea já sabia quando o F-16 ia acabar e quando teria de ter uma nova plataforma. O Exército é exatamente igual; não tem nenhuma diferença. Mas nós não estávamos habituados a isto — nós, sociedade e Exército, não estávamos habituados. Mas vai ser assim. São os novos tempos.Portanto, quando falamos de 2045 estamos a falar em termos de estrutura de forças; estamos a falar em termos de estrutura de sistemas de armas e equipamentos complexos que vão evoluir ao longo destes anos. Qual vai ser a base principal desse Exército em 2045, em termos de meios e carros de combate? Quantos? Como é que vai ser?Esta força responde àquilo que são os requisitos da NATO. Nós vamos ter que, a partir do sistema de forças, que também terá de ser revisto depois da revisão do Conceito Estratégico de Defesa Nacional e da afirmação do Conceito Estratégico Militar, gerar duas brigadas: uma brigada média, que terá equipamentos e meios da atual Brigada de Intervenção, e uma brigada pesada, que terá quatro unidades de escalão batalhão e todas as suas valências de proteção, fogos e sustentação.E em termos de meios, tem ideia de quantos carros?Cada uma destas brigadas terá cerca de 100 viaturas base, cerca de 400 viaturas no total.É disto que estamos a falar. Mas o grande desafio que nós temos é que vamos ter de duplicar a artilharia antiaérea, duplicar as unidades de apoio logístico e de campanha, incluindo o apoio sanitário. Essas unidades ainda não existem — terão de ser criadas de novo. É um desafio enorme para o Exército, que obrigará a rever o seu efetivo estrutural. Vamos ter mais gente.Precisarão de mais quantas pessoas? Qual será o quadro mínimo?Entre mais 2 000 e 2 500 militares no efetivo estrutural.No total?Teremos de ir para 22 500 a 23 000 efetivos estruturais, e atualmente somos cerca de 20 mil. Portanto, teremos de crescer em média mil efetivos por ano.E com militares altamente qualificados. Todos eles altamente profissionais e qualificados. Tecnológicos e tudo. Mas isto, também na perspetiva do país, é importante: o Exército é um instrumento fundamental para qualificar os seus cidadãos e fazê-los evoluir.O que é que o faz acreditar que daqui a 20 anos ainda vamos precisar de “botas no chão” para defender o país?Tenho visto a história — a história toda — e a evolução do combate. Ainda não vi quem inventasse a capacidade de conquistar e manter a posse do terreno. Ainda não vi nenhum Estado prescindir do seu território e das suas fronteiras..Não vi nenhum Estado abdicar por completo da sua soberania — e não visualizo que algum venha a fazê-lo. Hoje assistimos à robotização, à criação de sistemas autónomos, à integração crescente da inteligência artificial em todos estes sistemas..No estado atual — e no que consigo visualizar — nenhum deles dispensa a intervenção humana. Poderemos precisar de menos gente, admito: os sistemas são cada vez mais inteligentes, mais capazes, mais eficazes e eficientes. Mas vamos continuar a precisar de ter gente com botas no terreno.. Mas, no estado atual — e no que consigo visualizar — nenhum deles dispensa a intervenção humana. Poderemos precisar de menos gente, admito: os sistemas são cada vez mais inteligentes, mais capazes, mais eficazes e eficientes. Mas vamos continuar a precisar de ter gente com botas no terreno. Até porque nem todos os conflitos são de alta intensidade — e é precisamente essa flexibilidade do sistema de forças que permite ao Exército responder a diferentes tipos de conflito. É o que as nossas forças nacionais destacadas testemunham.. Hoje temos forças no teatro europeu, que treinam para um tipo de missão, e forças na República Centro-Africana, a cumprir outro tipo de missões — e ambas continuam a ser necessárias.Isto quer dizer que não consigo antecipar com certeza como será a força em 2045. Será um conceito em permanente evolução, edificado ao longo do tempo. Não vou definir agora tudo o que o Exército terá em 2045 — tenho um desenho-base que vai sendo construído e revisto, como acontece agora.Na Lei de Programação Militar de 2019, por exemplo, a capacidade antiaérea não tinha a dimensão que agora vai ter de ter. Temos de nos adaptar. Os sistemas de artilharia antiaérea que discutíamos em 2019 ou 2023 já não são os mesmos que queremos hoje — tudo isto é evolutivo.E vamos ter militares quase como um “soldado ciborgue”, não é? Altamente equipados? Vamos ter viseiras, proteções…Já têm muita tecnologia. O sistema de combate do soldado já existe. Esse sistema já equipava as nossas forças nacionais destacadas e está agora a começar a chegar.O soldado, no terreno, leva um dispositivo — um tablet ou um telemóvel — onde tem toda a informação disponível, que pode receber e transmitir, incluindo automaticamente dados como a sua localização e níveis de munições. Tudo o que o soldado tem pode ser transmitido em tempo real, o que tem reflexos diretos na logística.. Ou seja, a nossa logística vai ser completamente diferente da atual — uma logística moderna, muito mais preditiva e muito mais dispersa. Não vamos ter grandes unidades logísticas concentradas: teremos de fazer chegar a logística descentralizada às unidades em operações.É outro desafio grande que temos, e por isso também vai haver um grande reforço da capacidade logística de campanha. Eu lembro-me de há um ano, quando o entrevistei com a TSF, o senhor tinha dois sonhos. Um era essa capacidade logística, não era? A digitalização...Sim. Nós já começámos — a logística já está em curso, já estamos em testes. Eu pensava que a coisa era um bocadinho mais simples do que é. Não é, porque implica, por exemplo, que na contratação pública tenhamos o requisito de que todos os equipamentos têm de trazer uma ficha digital consigo. Isto permite, já nos novos contratos que fizemos, que controlemos as entradas e saídas através de pórticos automáticos.Gerando um QR code?Sim. Hoje entra tudo como nas lojas — temos tudo dentro do caixote e o sistema lê tudo.Está a ficar igual à logística moderna. Claro que ainda temos o efeito de arrastamento com o material antigo que permanece nos depósitos.Mas daqui para diante, todos os fornecedores do Exército têm de fazer o “feed” digital dos equipamentos que enviam para nós. Por exemplo: as novas fardas que estão a chegar ao Exército já vêm com código RFID (identificação por radiofrequência).Assim, quando entra uma caixa na base logística, sabemos quantas fardas lá estão, quantas entram e quantas saem. E isto permite repor automaticamente os níveis na logística macro — ou seja, saber quando é preciso reabastecer..Quando chega um pedido, o próprio robô vai à prateleira, recolhe a quantidade necessária, coloca na expedição e envia para o destino final. Esse é o estado final desejado. O primeiro passo está dado.. O estágio final será, depois, a robotização total: quando o sistema estiver completo, o armazém será totalmente automatizado. Quando chega um pedido, o próprio robô vai à prateleira, recolhe a quantidade necessária, coloca na expedição e envia para o destino final. Esse é o estado final desejado. O primeiro passo está dado.Estamos a trabalhar com empresas nacionais que também estão a desenvolver connosco esta capacidade tecnológica — e, na parte da contratação pública e das aquisições, já há novos requisitos que têm ajudado muito. Mas ainda há caminho a percorrer — está a andar.O outro sonho era o grande Centro de Simulação aqui em Santa Margarida. Em que ponto está?Está a andar. Os projetos de infraestruturas já estão praticamente concluídos e, no próximo ano, vamos adaptar as instalações para isso. Já estão em aquisição os simuladores — um deles deve chegar ainda este ano, a primeira fornada dos simuladores.São simuladores que nos vão permitir recuperar muito da capacidade de planear, dirigir e conduzir operações.O objetivo é garantir que os nossos Estados-Maiores são capazes de planear, coordenar e comandar operações, algo que precisamos de reforçar, num ambiente virtual o mais próximo possível da realidade..Depois, todos os sistemas de armas que estamos a adquirir terão obrigatoriamente sistemas de simulação integrados, que vão também ficar aqui instalados.. Depois, todos os sistemas de armas que estamos a adquirir terão obrigatoriamente sistemas de simulação integrados, que vão também ficar aqui instalados.Concomitantemente, fizemos candidaturas no âmbito da NATO para que aqui existam instalações de treino para forças da Aliança. Está já em análise na NATO — passámos o primeiro nível de avaliação, com resultado positivo — e isso poderá atrair investimento da NATO para Portugal.Também sob outra perspetiva, este centro poderá ser um polo de desenvolvimento para toda a região do Médio Tejo, inclusive na melhoria das infraestruturas de base.Por exemplo, necessitamos de uma ponte sobre o rio Tejo que permita projetar forças de um lado para o outro do território nacional e receber forças que venham para planos de defesa da NATO. Portanto, é algo que também pode ser enquadrado nos 5% da NATO, como infraestrutura crítica para Portugal.. Senhor General, a sua comissão de serviço terminará formalmente em março de 2026. Gostaria de ficar durante mais um período, se tal for o entendimento do Governo? Está disponível para isso?Sabe que eu nunca disse que não ao Exército, nem ao meu país — e, portanto, nunca direi que não. Continuarei sempre com o mesmo entusiasmo — no ativo ou na reserva — porque acredito muito no Exército.Os militares sabem quem eu sou e sabem que podem contar comigo. Não é uma decisão minha, mas a única coisa que posso dizer aos meus camaradas é que contem sempre comigo.Nunca direi que não ao Exército nem aos meus soldados. Eles sabem isso.E continuarei sempre com o mesmo entusiasmo, o mesmo empenho e o mesmo gosto em servir o Exército — em qualquer situação que for. Encaro isto com naturalidade e serenidade..A minha grande preocupação — hoje e enquanto aqui estiver — é construir o Exército que os camaradas mais novos merecem e que o país precisa.. E, sobretudo, a minha grande preocupação — hoje e enquanto aqui estiver — é construir o Exército que os camaradas mais novos merecem e que o país precisa.Tenho clara noção disso e da enorme responsabilidade que tenho sobre os ombros. Isto exige dedicação plena, viver e respirar o Exército 24 horas por dia. E isso aprendi aqui, em Santa Margarida, onde vivemos 24/7. O que diria a quem possa estar a pensar em candidatar-se ao Exército?As pessoas olham e pensam: “Foi oficial, entrou para a Academia, até parece que foi tudo fácil.”Mas vale a pena vir para o Exército. É uma instituição com princípios, com valores e com um propósito claro. As pessoas que vêm para aqui sabem para que é que o Exército serve. É uma instituição que aposta nas pessoas — nós gostamos das pessoas, tratamos bem as pessoas.E quando falo disto, falo das pessoas que estão connosco, mas também das suas famílias e amigos. É uma instituição onde se pode fazer carreira — cada um tem o seu nível de ambição..No Exército, quem entra como soldado não tem de acabar soldado. Há muitos mecanismos internos para progredir ou fazer transições de carreira. é uma instituição que permite a mobilidade social. Não quero negá-lo — é um ascensor social.. No Exército, quem entra como soldado não tem de acabar soldado. Há muitos mecanismos internos para progredir ou fazer transições de carreira.Pode entrar como soldado e candidatar-se à Academia Militar para fazer o curso de oficial. Pode concorrer a sargento dentro do Exército.Se estiver em regime de contrato, pode, tendo as habilitações necessárias, concorrer a sargento contratado ou oficial contratado.Portanto, é uma instituição que permite a mobilidade social. Não quero negá-lo — é um ascensor social.E, sobretudo, é uma instituição que qualifica muitas pessoas. Para se ter uma ideia: todos os dias temos, em média, 1 600 militares em formação. É um número significativo, que mostra a importância que damos à formação dos nossos militares e civis.E não temos apenas militares — precisamos muito de trabalhadores civis. Gosto sempre de sublinhar isso. Temos todas as profissões do Catálogo Nacional de Qualificações dentro do Exército, onde as pessoas podem realizar-se e progredir nas suas carreiras. Portanto, vale a pena. Vale a pena também, como civil, vir para o Exército. Quando falamos de Exército, falamos de todo o território nacional, porque temos postos de trabalho por todo o país — e isso também é uma grande mais-valia.