Covid-19. Apenas 5% dos doentes podem precisar de um ventilador
Portugal tem disponíveis, pelo menos 1400 ventiladores. Mas espera ter mais nos próximos dias entre encomendas e doações. Chegam? Depende do número de infetados, mas é preciso relembrar que apenas uma pequena percentagem vai precisar destes equipamentos.
Um ventilador é uma ventoinha que apoia a respiração de doentes em estado grave. Por isso, nem todos os infetados com covid-19 precisarão deste tipo de equipamento. Em princípio só alguns dos doentes críticos, que representam 5% do universo total - como explicou a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, esta quarta-feira - poderão ser ligados a um ventilador.
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Em Portugal, dos 1020 cidadãos doentes, há 126 hospitalizados, sendo que destes 26 encontram-se nos cuidados intensivos, ou seja, são estes que poderão precisar de ajuda para respirar. "Esta doença tem uma regra aparentemente simples: 80-15-5. 80% [dos doentes] podem ficar no seu domicilio acompanhas pelo seu medico de família, 15% estarão em enfermarias gerais e 5% poderão precisar de cuidados intensivos", explicou Graça Freitas, em conferência de imprensa.
"É neste sub-grupo [o dos 5%] que a ventilação mecânica pode ser necessária. O ventilador é um dispositivo que permite suportar um doente com compromisso grave da sua função pulmonar. No fundo permite ganhar tempo até à recuperação. Este é um aspeto importante: o ventilador por si, não trata o problema", diz, ao DN, o médico Paulo Mergulhão, secretário-geral da Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos.
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"No caso do covid-19 não temos, por enquanto, nenhum tratamento comprovadamente eficaz pelo que a capacidade de "comprar tempo" até que o nosso organismo consiga combater a infeção pode ser muito importante. É necessário salientar que a VM não é uma técnica inócua, mas os ricos podem ser minimizados por uma utilização adequada da técnica. Ou seja, é preciso garantir que há recursos humanos adequadamente treinados para assegurar a sua utilização eficaz e segura", continua Paulo Mergulhão.
Várias vozes têm denunciado, na última semana, falta de ventiladores, que pode ser critica numa fase mais avançada da propagação do covid-19, em Portugal. "Em Itália, os hospitais pediram ao Governo a compra de mais ventiladores, mas tiveram de esperar um mês", alertava há dias, no Jornal de Notícias, João Carlos Wink, coordenador do grupo de ventilação não invasiva da Sociedade Europeia Respiratória.
O primeiro-ministro anunciou, esta terça-feira, que Portugal faz parte dos países da União Europeia que se juntaram para encomendar mais destes aparelhos. Isto depois do executivo ter divulgado os resultados do inventário dos ventiladores disponíveis.
Existem no país quase 1400 ventiladores. No Serviço Nacional de Saúde (SNS) há 1142 ventiladores (528 nos cuidados intensivos, 480 em blocos operatórios e 134 como capacidade de expansão), a que se somarão, quando necessário, os 250 existentes no setor privado (que não incluem o setor social). No entanto, estes não estão todos disponíveis, uma vez que há outro tipo de doentes que continuam a precisar de ser assistidos com estes recursos.
"A questão de ser suficiente ou não depende em primeira mão da nossa capacidade de, como sociedade, conseguirmos "achatar a curva". Com isto quero dizer que mesmo que o número total de pessoas infetadas no final não seja muito menor, se as estratégias de higiene (respiratória e de mãos) e de distanciamento social forem eficazes o que acontecerá é que o número de pessoas doentes se vai distribuir por um período mais alargado o que permitirá evitar situações de rotura da nossa capacidade de resposta", indica Paulo Mergulhão.
Mobilização para aumentar o número de ventiladores
Desde as autarquias à sociedade civil, muitos se têm disponibilizado para aumentar o número de ventiladores no país. A Câmara do Porto anunciou, esta quarta-feira, que vai entregar 55 aos hospitais de São João e Santo António para suprir necessidades perante a pandemia de covid-19. As autarquias de Cascais, de Oliveira do Hospital, da Mealhada, de Leiria, entre outras seguiram o exemplo, contribuindo para os hospitais na sua área geográfica.
Também alguns clubes de futebol não ficaram indiferentes. O presidente do Moreirense doou 10 ventiladores ao Hospital Senhora da Oliveira, em Guimarães, a Fundação Benfica abriu uma linha de ajuda a idosos isolados e adquiriu três ventiladores para entregar a hospitais na Área Metropolitana de Lisboa, Porto e Coimbra. Já o Sporting disponibilizou ao Governo o pavilhão João Rocha e o relvado sintético junto a este recinto, em Lisboa, para a instalação de hospitais de campanha.
De forma mais espontânea, sem uma base de apoio inicial tão grande, há ainda cidadãos que decidiram contribuir com os seus conhecimentos, mobilizando a sociedade civil. É o caso de João Nascimento, estudante de Neurociência e Filosofia na Universidade norte-americana de Harvard, que lançou um apelo na rede social Twitter para reunir todas as pessoas com conhecimentos e disponibilidade para desenhar e produzir um modelo de ventiladores médicos com um código aberto, ou seja, sem direitos sob o projeto.
"Estamos a trabalhar em ventiladores em formato aberto para alcançar uma solução rápida e fácil que possa ser reproduzida e montada no local, em todo o mundo. Se tem algumas capacidades que pensa que podem ajudar, junte-se a nós no projectopenair.org", escreveu o português.
Menos de 24 horas depois, este projeto já contava com o apoio de 500 especialistas nas áreas de engenharia, medicina, entre outras. Número que continuou a aumentar, havendo já mais de 1400 voluntários. "Estou sem palavras e muito orgulhoso do meu país", confessou João Nascimento, na mesma rede social.
Portugal vai entrar em estado de emergência nacional, por decisão do Presidente da República, do Governo e do Parlamento. Há 642 casos confirmados de covid-19, no país, 194 notificado no último dia, segundo o boletim epidemiológico da Direção-Geral da Saúde (DGS), desta quarta-feira (18 de março). Há três pessoas recuperadas e duas vítimas mortais. Embora seja no Porto (289 pessoas) e em Lisboa (243) que se concentram a maior parte dos doentes, neste momento o vírus já está presente em todas as regiões de norte e sul, incluindo as ilhas. Estão ativas 24 cadeias de transmissão no país.