Professora Jill: esta primeira-dama quer continuar a trabalhar

A mulher de Joe Biden promete conciliar o ensino com as tarefas de primeira-dama: do apoio às famílias de militares à luta contra o cancro.
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Ensinar não é o que faço. É o que sou", escrevia Jill Biden nas redes sociais em agosto. Se alguém duvidava, a mulher de Joe Biden escolheu precisamente a sala onde durante anos deu aulas, no liceu de Brandywine, como cenário para o seu discurso na convenção que confirmou o marido como candidato democrata à presidência. E quando na quarta-feira Joe tomar posse sobre a Bíblia como presidente dos EUA, Jill vai tornar-se a primeira primeira-dama a manter o emprego depois de se mudar para a Casa Branca.

Uma opção que pode parecer fácil mas que quebra uma longa tradição. Até Eleanor Roosevelt, quando Franklin foi eleito presidente em 1932, se disse "feliz" pelo marido, mas nem tanto assim por ela. Afinal, sabia que quando chegasse a hora de se mudar para a Casa Branca, teria de deixar o emprego. "Gostei de dar aulas mais do que qualquer outra coisa que fiz", confessou à Associated Press, antes de acrescentar: "Mas tenho de desistir."

E se Eleanor nunca deixou o ativismo e depois da morte de Franklin até presidiu à Comissão dos Direitos Humanos da ONU, tendo um papel essencial na elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos, passadas quase nove décadas Jill Biden vai mais longe e promete continuar a dar aulas.

É o que faz desde os anos 1970, tendo dado aulas de Inglês a adolescentes num hospital psiquiátrico, em vários liceus e universidades. Em cinco décadas de carreira, fez ainda dois mestrados e um doutoramento em Ciências da Educação, o que faz dela uma das primeiras-damas norte-americanas com maior formação académica.

Uma formação de que se orgulha tanto que até no Twitter a sua conta se chama Dr. Jill Biden. Mas que também já lhe valeu críticas. Em dezembro, o ensaísta Joseph Epstein escreveu um artigo no The Wall Street Journal no qual defendia que a mulher de Joe Biden devia abdicar do título de "doutora" por não ser médica. Uma opinião logo denunciada como sexista e recebida com uma onda de solidariedade com a futura primeira-dama.

Jill vai manter-se como professora de Inglês na University of Northern Virginia, mas não deixará de fazer o trabalho de primeira-dama, focando-se, claro, na educação, mas também no apoio às famílias dos militares e aos veteranos. A luta contra o cancro, doença que em 2015 custou a vida ao seu filho Beau, também estará na agenda da primeira-dama.

Para Jill, este é na verdade um regresso a uma casa que conhece bem, ou não tivesse Joe Biden sido durante oito anos vice-presidente de Barack Obama. E também nessa altura, a "segunda-dama" conciliou a vida pública com as aulas.

Desde Martha, a rica viúva dona de terras, com quem George Washington se casou, tornando-a a primeira primeira-dama dos EUA, até às advogadas Hillary Clinton ou Michelle Obama, as mulheres dos presidentes americanos tiveram as mais variadas profissões. Nancy Reagan foi atriz, Laura Bush era bibliotecária e houve várias professoras. A começar por Abigail Fillmore. Em 1850, a mulher de Millard Fillmore tornou-se a primeira primeira-dama americana a ter um emprego pago antes de chegar à Casa Branca, tendo dado aulas na escola de Sempronius, em Nova Iorque.

E se muitas delas tiveram sem dúvida uma forte influência política na forma como os maridos governaram, nenhuma teve depois uma carreira política tão bem-sucedida como Hillary Clinton - senadora, secretária de Estado e duas vezes candidata presidencial.

Fora dos EUA também parece tradição as primeiras-damas deixarem os empregos quando os maridos são eleitos. No Brasil, Michelle Bolsonaro chegou a ser modelo, trabalhou como sommelier e como promotora de eventos, mas há muito abandonou qualquer atividade para apoiar a carreira do marido. Na China, Peng Liyuan era uma cantora famosa até o marido se tornar presidente. Já em França, um dos poucos regimes presidencialistas da Europa ocidental, também encontramos uma ex-professora no Eliseu. Brigitte Macron - que conheceu o marido, 24 anos mais novo, quando ele era aluno na escola onde ela dava aulas - deixou a carreira em 2015 para dar apoio à carreira política de Emmanuel. Mas se Brigitte deixou o ensino de bom grado, Valérie Trierweiler, namorada de François Hollande quando este tomou posse em 2012, foi forçada a deixar o jornalismo político, apesar de ter mantido um programa cultural no canal de televisão Direct 8.

Portugal não foge à regra. Fosse a atriz e professora Maria Barroso ou a ex-funcionária da TAP Maria José Ritta, nenhuma primeira-dama manteve a carreira "civil" quando o marido foi eleito.

E quando é a mulher a ter o cargo político? Não são presidentes mas a alemã Angela Merkel e a neozelandesa Jacinda Ardern são com certeza das mulheres mais faladas na política internacional. E as escolhas dos seus companheiros não podiam ser mais diferentes. O discretíssimo Joachim Sauer, casado com a chanceler alemã desde 1998, continuou a trabalhar em química quântica e consta até que foi do laboratório que assistiu à primeira tomada de posse da mulher em 2005. Clarke Gayford deixou a carreira como jornalista e apresentador de televisão para apoiar a carreira da primeira-ministra da Nova Zelândia e para criar a filha de ambos - Neve - nascida em junho de 2018. "Eu vou ser PM e mãe, enquanto o Clarke vai ser primeiro-cavalheiro da pesca e pai a tempo inteiro", resumia Jacinda no Twitter.

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