Com “essa paz que reina na casa”, família brasileira mostra como é o Natal em Portugal

Depois de sete anos em Portugal, Eduardo e Camila Albuquerque vivem o primeiro Natal na casa que remodelaram, entre filhos nascidos no país e os avós vindos do Brasil, num encontro de tradições.

Atravessaram o Atlântico há sete anos, apesar da vida estável que tinham no Brasil. Agora, “com uma paz” que dizem ser o elemento mais distintivo face ao que sentiam no outro lado do oceano, a família Albuquerque prepara-se para viver um Natal simbólico. Brasileiros de origem, portugueses por escolha e por proximidade familiar e cultural, Eduardo e Camila celebram o Natal pela primeira vez na casa que remodelaram ao detalhe, na periferia de Lisboa, acompanhados pelos dois filhos –Francisco, de cinco anos, e Madalena, de dois – e, de forma inédita, pelos avós que chegam do Brasil.

Para Francisco e Madalena, irrequietos e brincalhões, o Natal é vivido entre referências que cruzam os dois países: o “Pai Natal”, que Francisco refere com um perfeito sotaque português, a contrastar com o “Papai Noel” de quem fala com um sotaque brasileiro, chega na noite de 24 de dezembro. Apesar de esperar os presentes com ansiedade, que chegam na véspera de Natal, é a presença dos avós que comove o pequeno Francisco, levando-o a contar os dias para os reencontrar. “Eu sei quantos dias faltam. Pergunto todos os dias ao meu pai”, assume, pleno de entusiasmo, até porque é no Brasil que está praticamente toda a família.

A história da família Albuquerque é um dos muitos retratos possíveis de qualquer família imigrante em Portugal, mas esta, em concreto, assume contornos idílicos.

Eduardo e Camila chegaram em fevereiro, há quase sete anos, depois de ele ter recebido uma proposta profissional. Tinham uma vida estável no Brasil, mas decidiram arriscar. “Viemos para experimentar. Deu super certo”, resume Camila. Foi em Portugal que construíram família, consolidaram carreiras e encontraram um quotidiano que descrevem como tranquilo e seguro.

Ambos trabalham na área da promoção imobiliária. Eduardo dedica-se a projectos de maior dimensão, acompanhando empreendimentos desde a fase de concepção até à execução das obras. Camila aposta em projetos mais pequenos, como a remodelação de casas antigas, uma das quais se tornou agora o lar da família e o palco deste Natal inaugural. “É a casa dos sonhos, feita do jeito que planeámos”, observa.

As memórias do Natal no Brasil permanecem vivas. Eduardo recorda o calor, as mesas montadas no jardim, os almoços prolongados e as casas cheias, com dezenas de familiares reunidos. Camila evoca celebrações igualmente numerosas, marcadas pela animação e pela convivência intensa. Em comum, de um lado e do outro do Atlântico, a fartura à mesa e a centralidade da família, que não pode faltar.

Há, contudo, diferenças que a mudança de país tornou evidentes. No Brasil, a noite de 24 de dezembro concentra o essencial da celebração; em Portugal, o dia 25 assume maior protagonismo, dizem. A culinária aproxima-se e afasta-se em simultâneo: o bacalhau, presença habitual nas mesas portuguesas, já fazia parte da tradição familiar no Brasil, até porque os avós de Camila são portugueses, enquanto a farofa marca a identidade brasileira que a família mantém. Este ano, o menu combina bacalhau, peru, farofa, arroz de amêndoas, cordeiro ou cabrito, rabanadas, toucinho do céu – "algo bem português", lembra Camila – e mousse de chocolate, acompanhados por vinhos portugueses.

Francisco e Madalena, nascidos em Portugal, contam os dias para a chegada dos avós do Brasil.
Francisco e Madalena, nascidos em Portugal, contam os dias para a chegada dos avós do Brasil.Paulo Spranger

A vivência do Natal ganhou, entretanto, um novo significado com a chegada dos filhos. “Começámos a curtir muito mais esta época por causa deles”, diz Camila. As luzes de Natal, os biscoitos decorados em forma de árvores, preparados em família para deixar ao Pai Natal, e a atenção aos pequenos rituais tornaram-se parte essencial da celebração. Francisco decora a árvore enquanto Madalena observa, ainda tímida, mas já integrada na magia da quadra.

Este Natal é também um momento de afirmação de pertença. Eduardo sublinha o sentimento de acolhimento que a família encontrou neste retângulo à beira mar plantado. “Portugal deu-nos tudo, desde a nossa primeira casa, os nossos filhos, trabalho e, acima de tudo, paz”, assegura, acrescentando que nunca se sentiram tratados como estrangeiros. A proximidade cultural, a língua comum e a construção de amizades portuguesas facilitaram a integração e reforçaram a decisão de permanecer.

Na casa remodelada, preparada com cuidado para receber quem chega de longe, a família Albuquerque vive um Natal que simboliza mais do que uma reunião festiva. É a celebração de um percurso migratório tranquilo, de raízes que se mantêm e de novas que se consolidam. Entre tradições brasileiras e portuguesas, o Natal faz-se, como sempre, de família, memória e esperança renovada.

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