Jorge Pinto e António José Seguro conseguiram alguns pontos de convergência no debate.
Jorge Pinto e António José Seguro conseguiram alguns pontos de convergência no debate.Francisco Romão Pereira / RTP

António José Seguro pressiona Jorge Pinto com voto útil para "não pôr os ovos todos no mesmo cesto"

Antigo líder socialista defendeu ser o único candidato de esquerda capaz de passar à segunda volta das presidenciais. E ouviu o deputado do Livre questionar o seu passado como líder da oposição.
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Os últimos momentos do debate entre António José Seguro e Jorge Pinto, transmitido na noite desta segunda-feira pela RTP, enquanto Portugal seguia as últimas notícias acerca dos problemas de saúde de Marcelo Rebelo de Sousa, foram dedicados a um apelo declarado ao voto útil. O antigo secretário-geral do PS deixou bem claro ao deputado do Livre que "cada um tem de assumir as suas responsabilidades" para evitar uma segunda volta das eleições presidenciais com dois candidatos de direita.

"Estou a lutar para que a esquerda, o centro-esquerda e a esquerda democrática, tenha uma presença na segunda volta. E isso só ocorrerá se houver convergência na minha candidatura", defendeu Seguro, depois de pedir ao adversário que imaginasse um cenário que fizesse do "partido que está neste momento no poder hegemónico na sociedade portuguesa".

O deputado do Livre argumentou que ainda "há muito pela frente" e que não faltam eleitores indecisos, mas António José Seguro, que em todas as sondagens surge como mais bem posicionado à esquerda, intrometendo-se entre André Ventura, Gouveia e Melo, João Cotrim de Figueiredo e Marques Mendes, foi eficaz a passar a mensagem de que "é necessário que estas eleições não coloquem os ovos todos no mesmo cesto".

Não por acaso, a primeira pergunta do moderador Carlos Daniel foi dirigida a Jorge Pinto, inquirido sobre se tinha dúvidas de que António José Seguro fosse um homem de esquerda. O deputado do Livre respondeu que as suas palavras foram deturpadas, mas acusou o antigo líder socialista de ter pressionado o seu campo político, dissuadindo outros eventuais candidatos não identificados "que poderiam ser mais agregadores".

Nessa linha de argumentação, Jorge Pinto apontou a "contradição estrutural" de Seguro ter sido o líder da oposição que viabilizou o Orçamento de Estado de 2012 e o Código Laboral, levando o interlocutor a ripostar que se considera "uma pessoa de esquerda", mas da "esquerda responsável, que traduz os valores e princípios em soluções concretas, para que as pessoas possam viver melhor". E, dizendo-se surpreendido por um candidato tão jovem estar tão focado no passado - o que lhe mereceu uma acusação de paternalismo -, o socialista defendeu ter estado "sempre do lado da responsabilidade e dos interesses de Portugal" durante o "período muito difícil" da troika, quando o país esteve sob assistência financeira externa.

Foi o momento para Jorge Pinto revelar que Seguro liderava o PS quando o agora deputado do Livre se desfiliou desse partido, enviando-lhe uma carta que presumiu nunca ter sido lida. E de avançar com a previsão de que os próximos cinco anos, correspondentes ao mandato presidencial que estará em jogo nas eleições de 18 de janeiro, podem ser tão ou mais difíceis do que os anos da troika. "Falar do passado é essencial para falar do futuro", acrescentaria, num tom quase orwelliano.

Os dois candidatos também falaram de revisão constitucional, com Jorge Pinto a reafirmar a ideia de que, sendo eleito para o Palácio de Belém, poderia dissolver a Assembleia da República em caso de uma "revisão drástica", concertada apenas entre os partidos de direita - acrescentou, mais tarde, que tomaria igual decisão abrangesse apenas partidos de esquerda -, apontando exemplos como o fim do semipresidencialismo e ameaças a direitos, liberdades e garantias.

António José Seguro contrapôs que uma dissolução da Assembleia da República por esse motivo transformaria a campanha eleitoral para as eleições legislativas seguintes num plebiscito à revisão constitucional, à medida do que sucedeu com a Constituição de 1933, que estabeleceu os alicerces do Estado Novo. "Por alguma razão nunca houve um referendo à Constituição", acrescentou.

Também houve desacordo entre os dois candidatos no que toca à hipótese de eliminação do artigo 288.º da Constituição da República Portuguesa, com Seguro a considerar infundados os receios de que sejam levantados obstáculos a novas revisões. Até por ser necessária uma maioria de quatro quintos dos deputados, em vez dos dois terços atualmente existentes entre PSD, Chega, Iniciativa Liberal e CDS.

Antes disso, o deputado do Livre alertou para o Pacote Laboral defendido pelo Governo, considerando-o "um retrocesso tremendo" ao qual prometeu obstar caso venha a ser eleito. Por seu lado, Seguro realçou que o Presidente da República não deve interferir enquanto o processo de concertação social está a decorrer, mas admitiu uma "clara inclinação" para não aceitar as alterações legislativas tal qual estão a ser apresentadas.

No tema da Saúde, com os dois debatentes a convergirem na ideia de que o Serviço Nacional de Saúde "é a mais bela das conquistas desta democracia", Jorge Pinto aproveitou para defender a importância de avançar com a regionalização, considerando-a "um imperativo constitucional que continua por cumprir 50 anos depois".

Para resolver os problemas existentes, Jorge Pinto prometeu, enquanto Presidente da República, organizar uns Estados Gerais dedicados à defesa do Serviço Nacional de Saúde, juntando partidos, utentes e profissionais. Nada demasiado distante da posição de António José Seguro, para quem o Chefe de Estado deve ter capacidade de exigir aos partidos que se sentem à mesa e assumam compromissos para um plano a cinco ou dez anos.

No que toca à Imigração, o deputado do Livre recorreu à sua experiência de ter estado 15 anos fora de Portugal, e de ser filho e neto de emigrantes, para partilhar a "muita tristeza" com que assiste a "este clima envenenado em que se discute a imigração". "Enquanto Presidente da República vai ser minha prioridade não deixar que os portugueses se deixem levar por este clima de ódio", sustentou.

António José Seguro concordou que "o país precisa de imigração", realçando o "contributo muito positivo para a economia" e os 2,2 mil milhões de euros em contribuições para a Segurança Social, acrescentando que essa imigração "tem de ser regulada e organizada na entrada, no acolhimento e na integração".

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