Cimeira Presencial. "Presidente Michel valoriza a importância das negociações cara à cara"
O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel declara-se "ansioso", para receber em Bruxelas, os líderes executivos dos 27 Estados-Membros da União Europeia, para uma nova "cimeira presencial".
Os chefes de Estado ou de governo vão reunir-se nestes dois dias na capital da Bélgica, que esta semana se tornou o país com o segundo maior índice de contágio de toda a Europa, imediatamente atrás da República Checa, que por ironia trágica, tinha em julho realizado uma festa de despedida da covid.
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Charles Michel "tem noção" do risco de juntar em Bruxelas as lideranças executivas de toda a União Europeia, mas "o presidente Michel valoriza a importância das negociações cara a cara", declarou uma fonte próxima, admitindo que a organização da cimeira acontece em "circunstâncias exigentes".
Na Bélgica, o número de novas infeções declaradas oficialmente "duplica em cada sete dias", e atinge "níveis alarmantes", admitiu o porta-voz inter-federal para a covid-19, Yves Van Laethem, assumindo que muito em breve sejam detetados 10 mil doentes por dia, no país que o total de infeções já ultrapassa as 173 mil, com um impacto de 10244 mortes.
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Esta semana, o número de novos contaminados com a doença do coronavírus persistiu acima dos 7000 casos diários. O índice de hospitalizações também tem vindo numa tendência crescente, e registou "um aumento explosivo" nos últimos dias.
Os hospitais da cidade anfitriã da cimeira europeia têm desde ontem metade das unidades de cuidados intensivos reservada ao internamento de pessoas afetadas pela doença pandémica. Neste momento, mais de 1621 pessoas estão internadas e 281 dependentes de ventilação artificial.
O porta-voz inter-federal prevê que a meio do próximo mês seja atingido o nível de rutura dos cuidados intensivos e não exclui um agravamento das medidas, no país em que o número de contactos por pessoa já é limitado a três, os cafés e bares estão encerrados e, na região sul, foi decretado um recolher obrigatório, entre a 01h e as 06h da manhã.
Fontes do Conselho Europeu garantem que "serão adotadas normas para garantir a segurança de todos". Os exemplos dados são "o distanciamento e o uso de máscara".
Deslocações em covid-19
Com a Europa mergulhada numa segunda onda de covid 19, o presidente do Conselho Europeu reservou "o último" dos tópicos da agenda da cimeira presencial, para falar sobre alguns aspetos da pandemia, nomeadamente "um balanço dos esforços de coordenação empreendidos ao nível da UE, (...) sobre a restrição da liberdade de circulação".
Já esta semana, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen insistiu na necessidade de melhorar a "clareza" para os viajantes no espaço europeu, tendo apelado à coordenação de medidas, em matéria de restrições de viagens.
Von der Leyen apontou que há uma proposta lançada que "terá um código de cores comum, baseado em critérios comuns". Através de elementos visuais, entre o vermelho, amarelo e o verde, "com base no nível de risco", Bruxelas quer que os europeus consigam rapidamente avaliar as restrições que lhe serão impostas no país de destino.
Ao que o DN apurou, "todos" os líderes "estão de acordo" para que haja "mais coordenação" entre os diferentes países. Mas, "a contradição", é que quando se pretende concertar as medidas, "cada um afirma que - a Europa deve seguir as medidas que eu aplico no meu país", comentou uma fonte ouvida pelo DN.
O que Bruxelas propõe é que "não haja restrições para quem estiver a viajar de uma região indicada a verde. Quando estiver a viajar de uma região laranja, ou vermelha, os governos nacionais podem pedir para ser testado, ou entrar em quarentena. Os governos darão informação clara e completa, antes de introduzirem essas medidas. E, aqueles com um motivo essencial para viajarem, como os trabalhadores dos transportes, ou os que estiverem a viajar por razões familiares importantes, não lhes será pedido para entrar em quarentena", definiu a presidente da Comissão.
Agenda da Cimeira
A agenda propriamente dita tem como tópicos principais as negociações do Brexit, que, como se sabe, não registaram avanços, no prazo dado pela União Europeia, a 31 de setembro, quando terminou a última ronda negocial, antes da cimeira. Principalmente, porque o Reino Unido insistiu em fazer passar legislação que põe em causa o cumprimento da parte mais sensível do acordo de retirada.
O primeiro-ministro britânico reservou para o último instante, uma tentativa para forçar um acordo de última ora, como era previsível. E, ontem, a presidente da Comissão Europeia, aceitou participar num encontro por telefone, a que Charles Michel também assistiu.
Depois do encontro, Charles Michel anunciou que "na véspera do Conselho Europeu, pressionou outra vez para que haja progressos na mesa das negociações".
Em Londres, lamentando a "falta de progressos", do lado europeu, Boris Johnson anunciou aos dois representantes europeus que esperaria pelo "resultado" da Cimeira, para redefinir a sua estratégia.
Já Ursula von der Leyen expressou o seu desejo por um acordo, "mas não a qualquer preço", pois terá de haver "condições adequadas".
O presidente do Conselho Europeu estaria a contar com algum resultado mais evidente, do encontro entre os dois líderes institucionais e o chefe do governo do antigo Estado-Membro.
Se mantiver a agenda como anunciou, esta quinta-feira vai "convidar o negociador" Michel Barnier para dar conta "dos últimos desenvolvimentos", que, como se vê foram nulos, mantendo-se por enquanto as "divergências principais", que incluem "a igualdade de condições [em matéria de concorrência], pescas e governação [do acordo de retirada]".
"A questão crítica é, realmente, saber se o Reino Unido tem vontade política e sentido das responsabilidades para ter uma atitude construtiva nas negociações, e também claro afastar de vez essa ideia de violar o acordo de saída", sintetizou ao DN, Pedro Silva Pereira, membro do grupo coordenador do brexit no Parlamento Europeu, nomeado para relator do controlo da execução do acordo de retirada.
Outros tópicos da agenda principal
Charles Michel pretende, durante o jantar, fazer um "debate construtivo" sobre como alcançar "a ambição climática", lembrando que em dezembro passado houve acordo para "o objetivo de uma UE neutra para o clima até 2050".
"Gostaria que realizássemos um debate construtivo sobre esta questão, de modo a preparar o caminho para um acordo até ao final do ano", afirma Michel, sobre o assunto que coloca com prioridade na agenda da cimeira.
Já na sexta-feira, Michel pretende organizar uma "discussão estratégica" sobre as relações com África, para preparar o próximo encontro com os líderes da União Africana, que deveria acontecer ainda durante a presidência alemã.
Por fim...
A encerrar a cimeira, e como "último" dos tópicos, Michel quer então fazer um balanço sobre a pandemia e "receber uma atualização da presidente da Comissão, Von der Leyen, sobre vacinas".
Recorde-se que, em março, a presidente da Comissão Europeia falou "com os dirigentes de uma empresa europeia de investigação inovadora", que já estavam "a trabalhar em tecnologia promissora, para desenvolverem uma vacina contra o coronavírus", afirmou na altura.
Von der Leyen, que durante quatro anos, entre 1998 e 2002, integrou o departamento investigação de Epidemiologia, Medicina Social e Sistemas de Saúde, da Escola de Medicina de Hannover, na Alemanha, anunciou que a Comissão entregou à empresa alemã "80 milhões de euros".
"Espero que possamos ter uma vacina no mercado, talvez antes do outono", acreditava a presidente, embora não se espere que Von der Leyen pudesse ter novidades a este nível, prevendo-se que a presidente da Comissão faça um balanço dos esforços de Bruxelas, sobre "como garantir vacinas para todos", afirmou uma fonte ao DN, embora a dita vacina ainda não exista.
Temas ausentes
"Após a nossa discussão sobre as relações UE-África, abordaremos outras questões de política externa que requerem a nossa atenção", propõe o presidente do Conselho Europeu, sem esclarecer se nesse tópico se inclui a discussão sobre o caso Navalny, agora que a Rússia colocou mais pressão sobre Bruxelas, a propósito do pacote de sanções a personalidades próximas do poder em Minsk.
Michel também não inclui explicitamente no debate o tema do Mediterrâneo Oriental e as relações com a Turquia, depois de na cimeira anterior, os 27 terem apontando um possível agravamento de medidas contra a Ankara, apostando, para já, na via do diálogo. Ankara ficou com dois meses para cessar as provocações a Chipre e à Grécia, e só será tema de discussão, "dependendo do apetite" que houver na sala para o fazer, admitiu uma das fontes já citadas.
A poucos meses da imperativa aprovação do Quadro Financeiro Plurianual, o tópico não foi incluindo na agenda, por "ainda estar em discussão no Parlamento". Recorde-se que na semana passada, os dois portugueses relatores do Quadro Financeiro pressionaram Bruxelas a apresentar uma proposta que não implique cortes nos envelopes nacionais.
A discussão sobre os planos nacionais de retoma económica também não está incluída na agenda oficial, embora o tema acabe necessariamente por pairar sobre toda a cimeira, marcada para o dia em que termina o prazo para que os Estados-Membros façam chegar a Bruxelas os projetos orçamentais, no âmbito da coordenação de política económica do semestre europeu.