O presidente russo, Vladimir Putin, promulgou este domingo, 28 de dezembro, uma lei que extingue a obrigatoriedade de apresentação de declarações de rendimentos por parte de uma fatia significativa do funcionalismo público. A decisão, que altera diversas normas relativas ao combate à corrupção e ao controlo de bens, remove a exigência de transparência que até agora incidia sobre figuras centrais do Estado, incluindo membros do Governo, representantes ministeriais, magistrados e a totalidade das forças de segurança.Até agora, todos os funcionários públicos russos eram obrigados a entregar, com data limite de 1 de abril de cada ano, relatórios detalhados sobre os seus rendimentos e os dos seus cônjuges e filhos. Com a nova legislação, esta obrigatoriedade desaparece para a elite política e militar, embora se mantenha para outros setores, como o dos professores. As autoridades supervisoras apenas exigirão estas informações em situações excecionais, nomeadamente em casos de transferência entre agências ou quando as transações financeiras ultrapassarem o equivalente a três anos de rendimentos do visado.Blindagem das elites e controlo internoA iniciativa é interpretada por especialistas como um reforço estratégico do sigilo financeiro da Rússia, dando continuidade a um decreto de dezembro de 2022 que já proibia a publicação destas declarações em portais de transparência ou órgãos de comunicação social. Entre os principais objetivos de Vladimir Putin com esta medida, está a proteção contra o Escrutínio Externo, pois ao ocultar a evolução patrimonial da cúpula do poder, o Kremlin dificulta a identificação de novos ativos que possam ser alvo de sanções internacionais; a garantia de fidelidade dos visados -- a isenção funciona como um privilégio concedido aos setores que garantem a sobrevivência do regimenum ano em que as tensões internas e externas permanecem elevadas; e uma forma de gerir os conflitos que estão a surgir com a elite. Embora o país tenha levado centenas de funcionários a julgamento por corrupção desde o início da guerra na Ucrânia, as substituições têm servido frequentemente para resolver disputas entre fações rivais dentro da elite, e não para alterar métodos de governação..Elites económicas russas em revolta: economia de guerra de Putin revela-se um castelo de cartas.Reações de condenaçãoEsta nova lei gerou de imediato uma onda de críticas, até do interior da Rússia. Setores da oposição (que ainda resta) classificaram a medida como "antidemocrática", alertando para a criação de um ambiente propício à impunidade e ao enriquecimento ilícito longe do olhar público.Observadores internacionais sublinham que os novos nomes que têm ascendido a cargos de poder não demonstram práticas diferentes dos seus antecessores, e que a remoção da transparência obrigatória apenas facilita a perpetuação destes modelos.No plano internacional, a medida é vista como um sinal claro do isolamento russo e da intenção de Moscovo de operar à margem dos sistemas globais de vigilância financeira. Enquanto o Estado retém o poder discricionário de investigar transações suspeitas, a sociedade civil perde o último instrumento formal de monitorização da riqueza daqueles que governam o país.