Eleições históricas na Madeira. PSD perde maioria. PS mais do que triplica. Coligação de direita à vista
"Bipolarização." A palavra encaixa como uma luva nos resultados das eleições regionais da Madeira. O eleitorado repartiu os seus votos pelo PSD e pelo PS, que mais do que triplicou os votos, e quase esqueceu os outros partidos e até uma coligação popular, a Juntos pelo Povo (JPP). O BE foi o mais penalizado, perdeu os dois deputados, desaparecendo do mapa político regional. Miguel Albuquerque conseguiu vencer, mas sem maioria absoluta, apenas com 21 mandatos dos 47 possíveis no Parlamento Regional e a precisar dos três eleitos do CDS para conseguir formar governo.
Miguel Albuquerque confirmou, na sua reação aos resultados, que PSD e CDS irão iniciar as conversações a dois para formar um governo de coligação. Albuquerque aproveitou para se regozijar com a "votação muito expressiva" no PSD e assinalou a "derrota clamorosa" da esquerda nestas eleições, com uma "transferência quase literal" de votos do BE para o PS e um "quase desaparecimento do PCP". "O PSD manteve a sua votação, o que é extraordinário. Houve uma concentração [à esquerda] do voto útil no PS para derrubar o PSD, mas não conseguiram. Nem ao fim de 43 anos, é extraordinário."
Rui Barreto, líder do CDS-Madeira, foi lesto a esclarecer que "o centro-direita" venceu as eleições e passou imediatamente à carta de encargos para apoiar um governo de Albuquerque. "O CDS tem ideias, apresentou um programa e eu não abdicarei delas. Para formar um governo de maioria absoluta é preciso conversar com o CDS", afirmou, bastante saudado pelos militantes presentes na sede regional. "O nosso programa é o nosso guião, mas também é o nosso caderno de encargos", disse, garantindo que o CDS "não irá para o governo a qualquer preço".
O CDS, que perdeu quase metade dos votos e perdeu quatro eleitos, passando de sete para três mandatos, ganha, ironicamente, um peso político maior na região. De tal maneira que deu margem a Assunção Cristas para escapar a um discurso de derrota e fazer a fuga em frente para um "CDS que é o partido que consegue garantir uma maioria", num centro-direita que "tem condições para governar".
Paulo Cafôfo, o ex-presidente da Câmara do Funchal e independente que encabeçou a lista do PS nestas eleições históricas, se ouviu Rui Barreto (que falou antes), ignorou as suas palavras. E após o canto de glória pelo "fim do poder absoluto" na Madeira, lançou um repto ao CDS, que estendeu às restantes forças. A de uma coligação, uma espécie de geringonça madeirense, para formar governo e "protagonizar a mudança".
António Costa seguiu o trilho de Cafôfo, que terá sido mesmo determinante para este resultado histórico do PS na região autónoma, e assinalou "o melhor de sempre" do PS. O líder socialista tentou ao máximo descolar a eleição regional da nacional que se vai realizar dentro de duas semanas. "Cada eleição é uma eleição."
Curiosamente, Rui Rio utilizou a mesma técnica para escapar às perguntas sobre a perda da maioria absoluta do PSD na região, preferindo valorizar os 48 anos em que aconteceu. "É uma marca dificílima de igualar e não é possível sem um grande trabalho reconhecido pelos madeirenses. E apesar de o seu partido ter saído vencedor destas eleições, também ele separou as águas entre idas às urnas com a mesma frase de Costa: "Cada eleição é uma eleição."
Catarina Martins, essa, não tinha por onde escapar ao "mau resultado". O BE perdeu os dois deputados que tinha no Parlamento Regional - e assumiu por inteiro. "O Bloco falhou", admitiu. A explicação para o desaire eleitoral foi a da "bipolarização entre PSD e PS, que "esmagou os outros partidos". A coordenadora bloquista disse, no entanto, também não temer a contaminação dos resultados para as legislativas nacionais.
O líder comunista, que também saiu beliscado, embora menos do que o BE (ficou com apenas um dos dois deputados) da corrida ao Parlamento Regional da Madeira, disparou sobretudo contra o PS, que andou vários meses a "animar uma bipolarização artificial", quando o PS-Madeira não passa de uma fotocópia do PSD.
O partido liderado por Miguel Albuquerque conseguiu vencer as eleições regionais com 39,42% dos votos, com 21 mandatos no Parlamento Regional, contra um PS que atingiu os 35,76% e 19 mandatos. A lista dos socialistas, encabeçada pelo independente Paulo Cafôfo, triplicou os votos em relação a 2015, quando concorreu em coligação com outras forças. Os sociais-democratas precisam agora de se coligar com os centristas, que deram uma queda brutal nestas eleições, ao passar de sete mandatos para três, para formar governo.
Outras forças que também deram um tombo nestas regionais da Madeira foram a coligação Juntos pelo Povo (JPP), liderada por Élvio Sousa, que passou de cinco deputados eleitos para apenas três, e a CDU, que elegeu um único deputado, Edgar Silva, quando tinha dois. Mas em pior estado ficou o Bloco de Esquerda, que passou de dois para nenhum representante no Parlamento madeirense.
Se se analisarem os resultados, vê-se que os sociais-democratas liderados por Miguel Albuquerque não perderam em termos absolutos muitos votos - passaram de 56 569 em 2015 para 56 448 (121 votos a menos) nestas eleições. É o PS, cuja lista foi liderada pelo ex-presidente da Câmara do Funchal Paulo Cafôfo, que ganhou forte notoriedade como presidente da Câmara do Funchal (que também foi anteriormente presidida por Albuquerque), que sorve os votos aos outros partidos. Os socialistas passaram dos 14 574 votos (e em coligação com o PAN, o PTP e o MPT) há quatro anos, para os 51 207 votos.
Outras forças que tinham esperança de eleger representantes, como o PAN, a Iniciativa Liberal ou a Aliança, ficaram muito longe desse objetivo.
Nas regionais madeirenses de 2015, as primeiras pós-jardinismo, o PSD liderado por Miguel Albuquerque conseguiu manter a maioria absoluta que o partido tinha nas mãos há 43 anos, mas apenas por um deputado. Dos 47 deputados regionais, os sociais-democratas ficaram com uma bancada de 24.
A segunda maior força que das eleições há quatro anos foi o CDS, com sete eleitos; e depois, com seis deputados regionais, uma coligação PS-PTP-PAN-MPT. A fragmentação política foi uma das realidades dessas eleições, já que o Parlamento Regional ficou dividido em sete forças: a quarta maior foi o Juntos pelo Povo (JPP), com cinco deputados, seguida da CDU e do BE (dois deputados cada) e do PND (um).
As sondagens apontaram sempre para uma maior fragmentação da Assembleia da Madeira, até porque partidos que nunca foram nacionalmente a votos - o Chega ou o RIR - fizeram-no pela primeira vez nesta corrida regional. Ao todo concorreram 16 partidos e uma coligação, que disputam os 47 lugares no Parlamento Regional. No caso, PDR, CHEGA, PNR, BE, PS, PAN, Aliança, Partido da Terra-MPT, PCTP/MRPP, PSD, Iniciativa Liberal, PTP, PURP, CDS, CDU, JPP e RIR.
O PSD reconduziu Miguel Albuquerque, mas o PS, desta vez sem coligações, apostou em Paulo Cafôfo - o independente que, encabeçando coligações lideradas pelos socialistas, conquistou a Câmara Municipal do Funchal em 2013 (renovando o mandato em 2017).
Cafôfo é, aliás, há muito, mais do que uma aposta do PS madeirense, é uma aposta do PS nacional: em 2013, teve todo o apoio de António José Seguro (então líder do PS) para ser o candidato do partido ao Funchal, apoio que, a partir de 2014, António Costa manteria. As estruturas regionais do PS não ficaram muito entusiasmadas, mas, em nome da possibilidade de crescimento eleitoral do partido, acabaram por aceitar Cafôfo como candidato do PS a presidente do governo regional. E António Costa foi à Madeira dar-lhe o maior apoio nesta corrida contra Miguel Albuquerque, que também teve Rui Rio a seu lado.
Nestas eleições regionais podiam votar mais de 257 mil eleitores. Segundo dados publicados no site da Secretaria-Geral do Ministério Administração Interna, 252 606 na ilha da Madeira e 5152 na ilha do Porto Santo. Relativamente a 2015, quando se realizaram as últimas regionais na Madeira, estavam inscritos mais 526 eleitores.