Maria Matos e Teatro do Bairro Alto: "rentrée" adiada nas duas salas de Lisboa
Em agosto do ano passado, Mark Deputter anunciou a sua saída da direção artística do Teatro Maria Matos, um dos teatros municipais de Lisboa. Em vez de abrir um concurso para novo diretor, antes do final de 2017 a vereadora da Cultura, Catarina Vaz Pinto, anunciou uma reestruturação dos teatros da cidade: a gestão do Maria Matos seria concessionada a um privado, "com uma nova missão", vocacionado para "espetáculos de grande público, predominantemente teatro"; e aquela que era a programação desta sala seria dividida por outros espaços municipais, cada um com a sua direção artística - enquanto o Teatro do Bairro Alto (antiga Cornucópia) teria a responsabilidade de apresentar uma programação mais independente, o renovado Teatro Luís de Camões, em Belém, ficaria com a programação infanto-juvenil.
Apesar da muita contestação por parte da comunidade artística, o novo modelo foi aprovado. A vereadora contava pôr o modelo em prática a partir de setembro deste ano, para que até ao início de 2019 todos os espaços estivessem a funcionar. Porém, neste início da nova temporada, apenas o Teatro Luís de Camões, agora rebatizado como Lu.Ca e tendo como diretora artística Susana Menezes (que transitou da programação infanto-juvenil do Maria Matos) está a funcionar em pleno.
O concurso do Teatro Maria Matos encontra-se em stand-by. No Teatro do Bairro Alto prosseguem as obras. Para já, ambas as salas continuam de portas fechadas. Até quando?
A 3 de julho foi anunciado que a Força de Produção iria gerir o Maria Matos, teatro situado perto da avenida de Roma, e Sandra Faria declarava ao DN a sua satisfação. "Na curta vida da Força de Produção andámos sempre a saltitar", comentava a responsável pela produtora que em Lisboa costuma apresentar os seus espetáculos em salas como o Teatro Villaret, o Tivoli ou o Trindade. A produtora é a responsável por espetáculos como Mais respeito que sou tua mãe! , com Joaquim Monchique, ou Uma Nêspera no Cu , com Nuno Markl e Bruno Nogueira.
No entanto, a empresa que ficou em segundo lugar no concurso, a Yellow Star Company, reclamou da decisão. E assim o concurso ficou em suspenso. "O concurso ainda não está fechado, decorrente do recurso apresentado pela Yellow Star, que está a ser respondido", explica a EGEAC ao DN.
Paulo Sousa Costa, da Yellow Star Company, a produtora que tem neste momento em cena o musical Grease, com Diogo Morgado e Mariana Marques Guedes, no Casino do Estoril, garante ao DN que não quer entrar em polémicas, mas explica que assim que soube do resultado do concurso, em julho, apresentou uma reclamação pois afirma que o processo foi "ferido de várias ilegalidades", pela "violação dos critérios da igualdade, imparcialidade, proporcionalidade e boa fé".
O júri do concurso foi composto pela jornalista Pilar del Rio; a presidente da EGEAC, Joana Gomes Cardoso; a atriz e encenadora Natália Luiza; o dramaturgo e crítico Jorge Louraço Figueira; e o jornalista e escritor Nuno Galopim.
A empresa diz que "da análise do relatório preliminar não é possível compreender a que critérios e subcritérios o júri do procedimento recorreu para as pontuações atribuídas" às duas candidaturas em causa. Por exemplo, no que toca à programação para públicos de várias faixas etárias e adoção dos mecanismos de inclusão social, dois dos objetivos definidos pela EGEAC para o espaço, a Yellow Star garante que a sua proposta é muito mais completa do que a da Força de Produção, não compreendendo por isso a discrepância de pontuação a favor da concorrente. Além disso, na sua queixa, aponta algumas irregularidades processuais que, no seu entender, prejudicaram a sua candidatura.
"Neste momento, já recebemos a resposta da EGEAC, que está a julgar em causa própria. E como não obtivemos respostas concretas quanto às ilegalidades do processo por nós levantadas, e porque achamos que não deve ser a entidade que vota a decidir o nosso recurso, decidimos recorrer aos tribunais", explica o responsável da Yellow Star Company. A ação judicial deu entrada no Tribunal Administrativo de Lisboa ainda em setembro. A empresa pede a suspensão do concurso e a impugnação das decisões do júri. "Aguardamos a diligência da Justiça. Vamos até às últimas consequências para defendermos aquilo em que mais acreditamos", diz.
Já a Força de Produção prefere manter-se em silêncio neste momento, enquanto aguarda a decisão final. Entretanto, o Teatro Maria Matos continua de portas fechadas.
O concurso para a direção artística do Teatro do Bairro Alto, na rua Tenente Raul Cascais, junto da rua da Escola Politécnica, recebeu 27 candidaturas. A autarquia procurava um projeto que fosse ao encontro do seu formato black box, direcionado, sobretudo, para a criação artística contemporânea. No início de junho ficou a saber-se que Francisco Frazão, que tinha assumido a programação de teatro da Culturgest nos últimos anos, seria o diretor artístico do espaço, com um caderno de encargos de 650 mil euros.
Em declarações à Agência Lusa nessa altura, Francisco Frazão explicava que planeava uma programação onde estivesse bem presente "a ideia do experimental dos artistas emergentes" e ainda algumas propostas internacionais, apostando "numa abertura à cidade, com parceiros na zona e parceiros institucionais, mas também aberto às vozes dos espetadores, dos artistas e dos outros trabalhadores do espetáculo, que tenham uma palavra a dizer no funcionamento do teatro".
Frazão já tem a equipa constituída e está a trabalhar na programação do espaço que está neste momento a sofrer obras de remodelação. Havia algumas obras que já se sabia serem necessárias - nomeadamente na questão dos acessos e da renovação de alguns equipamentos mas, como é costume, depois de se começar a trabalhar percebeu-se que a intervenção teria de ser mais profunda.
O Teatro do Bairro Alto "será inaugurado no próximo ano", garante a EGEAC ao DN, embora não possa ainda anunciar uma data: "Depende da evolução das obras que vão ser mais extensas do que inicialmente previsto, uma vez que o espaço não era intervencionado há vários anos".