Em 2024, as seis associações religiosas de Macau - budismo, catolicismo, taoismo, protestantismo, fé bahá’í  e islamismo - realizaram um encontro de apreciação musical, transmitindo, através da música, mensagens de paz, fraternidade, inclusão e união, demonstran-do cooperação, admiração e respeito mútuos entre as religiões.
Em 2024, as seis associações religiosas de Macau - budismo, catolicismo, taoismo, protestantismo, fé bahá’í e islamismo - realizaram um encontro de apreciação musical, transmitindo, através da música, mensagens de paz, fraternidade, inclusão e união, demonstran-do cooperação, admiração e respeito mútuos entre as religiões.

Macau: diversidade religiosa em harmonia

Num contexto global em que conflitos religiosos e culturais ainda ocorrem com frequência, Macau (China) apresenta um cenário único.
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Desde 2021, seis religiões - budismo, catolicismo, taoismo, protestantismo, fé bahá’í e Islão - uniram-se consecutivamente durante cinco anos, organizando concertos, exposições de arte, intercâmbios juvenis e outros eventos, promovendo juntas um ambiente harmonioso. Este cenário memorável lembra a bênção conjunta realizada por quatro religiões durante a cerimónia de abertura do Aeroporto Internacional de Macau em 1995, tornando-se uma referência no panorama religioso internacional.

Organizada por seis religiões, a exposição de arte contemporânea Luz Que Funde Sem Palavras, Macau Harmonioso foi inaugurada com pompa no Templo Kun Iam, com quase 400 anos de História, em novembro de 2025. Durante a inauguração, o venerável mestre Shi Jiecheng, presidente da Associação Geral de Budismo de Macau, explicou que a arte serve como uma ponte espiritual que transcende os limites doutrinários, citando o Sutra Avatamsaka: “A mente é como um pintor habilidoso, capaz de pintar todos os mundos.” Por sua vez, D. Stephen Lee, bispo de Macau, citando a encíclica católica Deus é Amor, enfatizou que “a caridade ultrapassa os limites da Igreja”. Apesar das diferentes doutrinas, os dois líderes mostraram um elevado grau de entendimento no que diz respeito à busca espiritual e à responsabilidade social, refletindo vividamente a verdadeira essência da harmonia religiosa em Macau.

Esta cidade, com pouco mais de 32 quilómetros quadrados, foi historicamente um ponto crucial de encontro entre as culturas chinesa e Ocidental. Do Templo de A-Má às Ruínas do Colégio de São Paulo, do Kun Iam Tong à Igreja de São Domingos, edifícios de diferentes religiões erguem-se lado a lado, representando não apenas uma coexistência geográfica, mas também intercâmbio espiritual. Como afirmou o venerável mestre Shi Jiecheng: “Diante do salão de Kun Iam, seis heranças espirituais originárias de diferentes civilizações reúnem-se em mútua valorização.” Isto não suprime as diferenças, mas deixa transparecer aquilo que estas tradições têm em comum.

Na exposição de arte, foram exibidas mais de 70 obras de caligrafia, escultura e arte digital. A exibição de vídeos em streaming ao lado de antigas estátuas de Buda, e a realização de oficinas digitais de ilustração entre os sons dos sinos matinais e do crepúsculo representaram, por si só, um diálogo profundo entre a religião e a vida contemporânea. A arte não fala, mas aponta diretamente para o coração; a fé não debate, mas encontra eco na experiência estética.

Parte das obras da exposição de arte contemporânea das seis religiões, que, através de diferentes figuras religiosas e diversas formas de expressão artística, transmitem os ideais partilhados de compaixão, sabedoria e paz.
Parte das obras da exposição de arte contemporânea das seis religiões, que, através de diferentes figuras religiosas e diversas formas de expressão artística, transmitem os ideais partilhados de compaixão, sabedoria e paz.

A harmonia religiosa em Macau não foi alcançada num dia, sendo antes o resultado natural de uma longa evolução histórica e cultural. Mais notável é que esta série de atividades inter-religiosas se tornou uma prática social consciente, organizada e contínua. Desde o Ano do Intercâmbio Juvenil, em 2021, até às duas edições consecutivas do concerto religioso, e depois às exposições de relíquias religiosas e de arte contemporânea, as seis religiões estabeleceram gradualmente um mecanismo de cooperação maduro. Os jovens tornaram-se a força principal na organização das iniciativas, com os líderes religiosos a desempenharem um papel de orientação e apoio, formando um círculo virtuoso de testemunho intergeracional e reforço contínuo da cooperação.

Esta cooperação sustentada ao longo de cinco anos está enraizada no solo social único de Macau e na sabedoria da sua governação, com o apoio de instituições como o Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) e o Gabinete de Ligação do Governo Central na RAEM fornecendo garantias políticas e recursos, e a confiança mútua entre os diversos grupos religiosos constituindo a motivação interna para a continuidade das atividades. Sob a estrutura “um país, dois sistemas” e a cultura chinesa ao centro, Macau integra várias culturas religiosas, formando um padrão singular de “unidade na diversidade”. Além de ponto de encontro entre culturas, a região é também um “laboratório” e um “transformador” para a coexistência harmoniosa das civilizações humanas.

Numa perspetiva mais ampla, a prática de Macau tem profundas implicações para o mundo de hoje. Numa era em que a globalização enfrenta retrocessos e a política identitária se intensifica, Macau prova que diferentes crenças podem não apenas coexistir pacificamente, mas também colaborar e desenvolver projetos em conjunto. A aprendizagem mútua entre civilizações não é um discurso idealista, mas sim um projeto social tangível. Como afirmou o venerável mestre Shi Jiecheng: “No diálogo entre cores e linhas, já nos compreendemos mutuamente.” Esta compreensão, que transcende a linguagem, constitui a esperança no futuro comum da Humanidade.

As seis associações religiosas de Macau organizaram em conjunto, no Templo Kun Iam (um templo budista), uma exposição de arte contemporânea com o tema Luz Que Funde Sem Palavras, Macau Harmonioso, aberta ao público até 5 de dezembro de 2025.
As seis associações religiosas de Macau organizaram em conjunto, no Templo Kun Iam (um templo budista), uma exposição de arte contemporânea com o tema Luz Que Funde Sem Palavras, Macau Harmonioso, aberta ao público até 5 de dezembro de 2025.

As atividades religiosas de Macau funcionam como uma escritura sem palavras, transmitindo três ideias fundamentais: as diferenças são uma fonte de inovação, não de divisão; a juventude é, por excelência, uma mensageira natural que transpõe fronteiras; e a harmonia duradoura só pode ser alcançada através da construção conjunta de instituições e de espírito comunitário. Cinco anos de atividades conjuntas elevaram Macau de “ponto de cruzamento cultural” a “transformador civilizacional”. Enquanto o mundo ainda procura caminhos para a coexistência, Macau, com a sua postura de “luz que funde sem palavras”, prova que a harmonia reside em cada ato de cooperação conjunta.

Com a sua prática de convivência religiosa, Macau, esta “Terra do Lótus”, não só demonstra a abertura e inclusividade da cultura chinesa, tornando-se um ativo valioso no desenvolvimento nacional, como também oferece ao mundo uma possível visão civilizacional, em que até a natureza mais simples - do bambu verde às flores amarelas -, é portadora de sentido espiritual. Aqui, a caridade não tem fronteiras e a luz da harmonia difunde-se sem ruído. Desejo que esta luz ténue acenda, um dia, um rio de estrelas que ilumine a civilização humana.

Texto de Wu Zhiliang, Académico em História e Cultura de Macau

UMA INICIATIVA DO "MACAO DAILY NEWS"

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