Mergulhos de Marcelo, pipocas para Costa e fim da linha para Boris
Sábado, 2 de julho
É conhecido o gosto do Presidente da República por um bom mergulho. E estando em Copacabana, no Rio de Janeiro, não deixou de aproveitar parte de uma manhã de inverno para nadar no mar da famosa praia carioca, surpreendendo os brasileiros que por ali andavam. Bolsonaro já tinha feito saber pela imprensa que iria cancelar o encontro com Marcelo em Brasília - numa atitude que o líder da oposição do Senado do Brasil classificaria como sendo de "um moleque mimado" -, desagradado com o facto de o presidente português também ter reunião marcada com Lula da Silva, ex-presidente e de novo na corrida ao cargo contra o antigo capitão militar (lidera destacado as sondagens). Aparentemente indiferente ao revés diplomático, Marcelo fez o que melhor sabe: entre centenas e centenas de selfies e abordagens da rua, distribuiu elogios ao "país irmão", ao seu povo, e à comunidade brasileira residente em Portugal, que aumenta de dia para dia e está já a caminho dos 250 mil residentes. Negando sempre a existência de um problema, o presidente português deixaria o Brasil com uma última alfinetada ao homólogo brasileiro: "A visita correu muitíssimo bem e superou as expectativas (...). Aquilo que podia ser um amargo de boca foi uma coisa muito doce, vista numa perspetiva de médio-longo prazo. Permitiu que se falasse de Portugal ainda mais e gerou-se uma grande simpatia. (...) Os crentes dizem que Deus escreve direito por linhas tortas. E a linha tortinha deu para escrever muita coisa direita".
Domingo, 3 de julho
Correu bem o congresso do PSD ao novo líder, Luís Montenegro. Não pela ausência de vozes dissonantes ao projeto que tem para o partido (que, de resto, ninguém esperava ouvir nesta altura), mas principalmente pela forma como construiu as listas que apresentou aos delegados. Nestas destacaram-se escolhas que não só o deixam mais protegido de oposição interna como mostram, pelo menos no papel, um partido teoricamente mais unido - algo que o seu antecessor, Rui Rio, nunca conseguiu ou promoveu - para enfrentar os desafios colocados pela maioria absoluta socialista e o crescimento de outras forças de direita como o Chega e a Iniciativa Liberal. Paulo Rangel e Miguel Pinto Luz, que já foram opositores de Montenegro em eleições, tornaram-se vice-presidentes, enquanto que Carlos Moedas e Maria Luís Albuquerque, dois potenciais candidatos à liderança no futuro, integram o Conselho Nacional. O desafio de Montenegro também passará por conciliar tantos egos e tê-los alinhados com a sua liderança. Para já, a sua moção de estratégia foi aprovada por 91,7% do congresso e no discurso de encerramento o novo presidente quis posicionar o partido: "Somos e seremos moderados, mas não somos nem seremos socialistas! É por sermos moderados que também não somos nem populistas nem ultraliberais".
Segunda-feira, 4 de julho
Numa extensa entrevista à agência Reuters, o papa Francisco afastou, pelo menos para já, a ideia de que se prepara para renunciar por motivos de saúde, mas não deixou de elogiar a atitude do seu antecessor, Bento XVI (hoje com 95 anos), que se afastou da gestão da Igreja Católica em 2013 por considerar que entrara numa fase de algum declínio físico e mental que o impedia de exercer as funções na sua plenitude. "Esse foi o grande exemplo do Papa Bento XVI. Foi uma coisa muito boa para a Igreja. Ele disse que os papas devem parar a tempo", afirmou agora Francisco. O Papa argentino, de 85 anos, revelou na mesma entrevista o desejo de visitar em breve a Rússia e a Ucrânia, para "servir a causa da paz". A decisão do Supremo Tribunal dos Estados Unidos em revogar o antecedente que estabelecia o direito ao aborto, foi outro dos assuntos abordados. Sem se alongar, Francisco disse respeitar a decisão e reforçou a sua condenação à interrupção voluntária da gravidez, que compara "à contratação de um assassino".
Terça-feira, 5 de julho
Segunda-feira, 5 de julho, foi um dia histórico para a NATO, com a formalização da adesão de dois novos países à Aliança Atlântica de defesa. A Suécia e a Finlândia já têm o aval dos atuais 30 membros, mas falta a ratificação nos respetivos parlamentos, sendo que logo no próprio dia a Dinamarca tornou-se o primeiro país a fazê-lo. Esta rapidez no processo de adesão teve um acelerador muito poderoso: o medo que a invasão russa da Ucrânia despertou na Europa. O alargamento não deixa de ser uma afirmação de força na NATO perante o regime de Putin, mesmo que Jens Stoltenberg garanta que não há planos para novas bases nos dois países nórdicos, já depois de Moscovo ter sublinhado que em caso de reforço militar na vizinha Finlândia e na Suécia iria responder "simetricamente e levantar as mesmas ameaças". Mas não será isso que vai fazer parar a guerra. Na Ucrânia, os ataques russos no Donbass prosseguem sem tréguas. Os avanços de Moscovo foram até celebrados no espaço, com três astronautas russos a desfraldarem as bandeiras dos territórios autodeclarados separatistas de Lugansk e Donetsk a bordo da Estação Espacial Internacional.
Quarta-feira, 6 de julho
Antes da votação, já se sabia que a moção de censura do Chega iria ser chumbada e que os únicos votos que teria a favor seriam os da própria bancada - como já tinha acontecido em abril, quando o partido de Ventura apresentou uma moção de rejeição ao Programa de Governo. Mas o debate não deixou de ser quente. É óbvio que o primeiro-ministro e a ação do governo que lidera, ainda na ressaca da enorme turbulência gerada com o despacho revogado do ministro Pedro Nuno Santos sobre o novo aeroporto, foram os principais alvos da oposição na tarde de quarta-feira, mas António Costa também teve oportunidade de puxar de um balde de pipocas e ficar a assistir na 1.ª fila ao combate à direita, entre Chega, PSD e IL (os dois últimos abstiveram-se na votação) sobre quem é, afinal, o líder da oposição ao PS no parlamento. E, na verdade, são esperadas cenas dos próximos capítulos, até tendo em conta que o novo líder do PSD tem vindo a dizer que as ideias do Chega são uma linha vermelha que não pretende ultrapassar. Costa, o PS e os spin doctors que tentam passar para segundo planos as trapalhadas do governo agradecem.
Quinta-feira, 7 de julho
Encostado à parede, após cerca de 60 demissões no governo em apenas 48 horas, e sem encontrar refúgio no próprio partido, Boris Johnson, à enésima polémica, lá cedeu e anunciou a demissão da liderança dos Conservadores, abrindo assim caminho ao um sucessor que, por inerência, será também o novo primeiro-ministro britânico. Um mérito indiscutível de Boris foi a arte da sobrevivência: já depois de vencer eleições, resistiu às primeiras atribulações económicas e sociais geradas pelo Brexit que tanto advogou; ao caso grave de covid-19 que o atirou para os cuidados intensivos; às suspeitas de corrupção relacionadas com o financiamento da remodelação do seu apartamento oficial em Londres e, ainda, ao caso partygate que tornou públicas as festas privadas com membros do governo em Downing Street quando os britânicos estavam sujeitos a fortes medidas restritivas de combate à pandemia. O último caso, que acelerou a vaga de demissões, foi o pinchergate, em que Boris foi acusado de ter feito vista grossa face às acusações de conduta sexual imprópria a um membro do governo, Chris Pincher, mantendo a sua nomeação. Desta vez, pedir desculpa não bastou ao PM britânico. No entanto, ficou claro na carta de demissão de Rishi Sunak, da pasta das Finanças, que os motivos de descontentamento iam muito para além deste último "escândalo", pois o que estava em causa era incapacidade de Boris Johnson de garantir um governo que funcionasse de "forma adequada, competente e séria".
Sexta-feira, 8 de julho
Morreu, aos 79 anos, em Barcelona, José Eduardo dos Santos, o homem que liderou os destinos de Angola durante 38 anos, de 1979 (após a morte de Agostinho Neto) até 2017, quando renunciou a recandidatar-se, abrindo portas ao seu sucessor na presidência e no MPLA, João Lourenço, deixando um legado em que se salienta o papel na construção da paz no país mas também várias acusações de corrupção e nepotismo relacionadas com o regime que conduziu. O atual executivo angolano decretou 5 dias de luto nacional e destacou o político "que regeu durante muitos anos com clarividência e humanismo os destinos da Nação Angolana, em momentos muito difíceis". Uma das primeiras reações foi a de Durão Barroso, ex-PM português e presidente da Comissão Europeia, que, antes de assumir esses cargos, trabalhou como mediador dos acordos de paz para Angola e recordou Eduardo dos Santos como "alguém de excecional inteligência, que foi capaz de garantir a unidade nacional angolana num contexto geopolítico extraordinariamente difícil".