Manuel Serrão é um dos principais suspeitos na Operação Maestro.
Manuel Serrão é um dos principais suspeitos na Operação Maestro.Carlos Carneiro / Global Imagens

O jornal T e a associação Selectiva Moda: os negócios de Serrão no centro da Operação Maestro

Os indícios apresentados pelo Ministério Público mostram uma complexa teia criada à volta de várias sociedades, todas com um rosto comum: Manuel Serrão, que o DN tentou, em vão, contactar.
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No centro da Operação Maestro, que levou a mais de 80 buscas por todo o país para recolher provas, está um jornal de nome T, criado com o objetivo de "divulgar a indústria têxtil e de vestuário portuguesa", e, segundo a ficha técnica, propriedade da Associação Textil e de Vestuário de Portugal (ATP).

Mas o DN sabe que o Ministério Público (MP) suspeita das ligações entre empresas, num esquema complexo.

Alegadamente, diz o MP, algumas das pessoas que colaboram no T serão, ao mesmo tempo, funcionários de outras duas empresas: a Associação Selectiva Moda (Manuel Serrão é vogal da direção e beneficiário ativo e a ATP é associada) e da Nicles. Segundo documentos a que o DN teve acesso, há indícios de que as remunerações possam ser imputadas em projetos da Selectiva Moda, cofinanciados com fundos europeus, e nos quais a Nicles consta como fornecedora.

A associação Selectiva Moda é beneficiária de vários apoios do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), nomeadamente através de um outro projeto, chamado Portugal Fashion News.

E, ao que tudo indica, outro esquema de fraude pode ter sido a adulteração de documentos, para que a associação não possa ser enquadrada como entidade adjudicante -- o que faria com que estivesse sujeita às regras de contratação pública. E, beneficiando a associação de vários fundos comunitários desde 2014, devia ser enquadrada como tal.

Olhando para um período posterior (entre 2015 e 2022), o MP refere que esses subsídios representaram sempre um peso ligeiramente inferior a metade dos rendimentos da associação. A análise técnica às operações coube à Agência para o investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), que terá procedido também à verificação de reembolsos e apuramento de despesas financiadas e, depois, validadas pela Autoridade de Gestão do COMPETE 2020. O MP suspeita que Manuel Serrão teria uma ligação privilegiada com o presidente desta autoridade, Nuno Mangas.

Ao todo, a associação Selectiva Moda terá recebido, em doze operações com fundos do FEDER, cerca de 41,8 milhões de euros, dos quais mais de 40,5 milhões enquanto beneficiária líder. A ATP, dona do jornal T, terá sido copromotora em metade dessas operações, tendo direito a cerca de 1,1 milhões de euros.

Outras sociedades (No Less e House of Project - Business Consulting), que o MP diz serem controladas de facto por Manuel Serrão, também são visadas na investigação.

Além da suspeita do MP de que, também elas, tenham beneficiado de fundos comunitários, inseridos no âmbito do Sistema de Incentivo à Qualificação e Internacionalização das PME e do Programa Operacional Regional do Norte (Norte 2020), há ainda indícios de que a gestão ao nível de pagamentos da No Less fosse assegurada por Manuel Serrão, em colaboração com a administradora da sociedade.

Por sua vez, a House of Project (HOP) teve participações da No More, sociedade a que pertence Manuel Serrão.

Com isto, o MP suspeita que as três (Selectiva Moda, No Less e House of Project) estão interligadas entre si, e de que essas beneficiárias usaram sociedades prestadoras de serviços controladas pelos suspeitos. O objetivo seria garantir a aquisição simulada de serviços a imputar aos projetos, havendo também a intenção de manter certos fluxos financeiros para garantir mais proveito dos fundos comunitários que lhes haviam sido atribuídos.

As empresas fornecedoras de bens e prestadoras de serviços, diz o MP, têm muitos corpos sociais em comum entre si, o que levanta a suspeita de uma existência de relações entre todas estas entidades.

Ao que foi possível apurar, neste esquema, foram identificadas dez empresas prestadoras de serviços de operações da Selectiva Moda financiadas com fundos FEDER (entre as quais a já referida Nicles) . As próprias beneficiárias House of Project e No Less figuram como fornecedoras.

O DN tentou, sem sucesso, contactar Manuel Serrão na manhã desta quarta-feira.

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