Lei atribui ao MP e à PJ a averiguação preventiva que envolve Montenegro
"Recebimento ou oferta indevidos de vantagem, corrupção, peculato e participação económica em negócio" estão entre o leque de crimes cuja investigação pode ser feita no âmbito de uma "averiguação preventiva" como a que hoje foi anunciada pelo Procurador-Geral da República (PGR), Amadeu Guerra.
O PGR revelou que o Ministério Público (MP) abriu uma averiguação preventiva relacionada com o primeiro-ministro e com a empresa Spinumviva, da família de Luís Montenegro, tendo por base três denúncias anónimas.
Ao DN, fonte oficial da PGR precisou que "estas ações de prevenção encontram-se previstas na Lei 36/94, de 29 de setembro" - enquadra as "Medidas de combate à corrupção e criminalidade económica e financeira" - e que neste caso o objetivo será "aprofundar nesse âmbito a recolha de elementos e a análise que já vinha a ser feita das denúncias recebidas", sendo que o processo "correrá os seus termos no DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação Penal)".
Amadeu Guerra deixou claro que a PGR já esteve a “recolher elementos” e que “até agora não há fundamento para abrir qualquer inquérito”.
Segundo o Código de Processo Penal a "denúncia anónima só pode determinar a abertura de inquérito se dela se retirarem indícios da prática de crime ou constituir crime".
Quando a denúncia anónima "não determinar a abertura de inquérito, a autoridade judiciária competente promove a sua destruição".
Neste caso, a destruição não foi o destino das denúncias, o que quer dizer que há pistas a seguir. Acresce que, nas suas declarações, Amadeu Guerra adiantou que com esta averiguação iriam ser recolhidos "elementos adicionais relativamente a entidades terceiras".
Estão vedadas práticas de investigação para as quais é exigida autorização de juiz, como, por exemplo, escutas, mas os responsáveis pelo processo podem questionar quem entenderem e pedir informações às entidades em causa. Ou seja, é possível verificarem contas, contratos, clientes, fluxos financeiros da empresa da família do primeiro-ministro.
Averiguações atribuídas ao DCIAP e PJ
Logo no seu primeiro artigo este diploma indica que "compete ao Ministério Público e à Polícia Judiciária, através da Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC) realizar" estes processos.
Pode, por isso, ser a PJ a responsável por esta averiguação preventiva, cujas regras exigem que, “para análise e acompanhamento” seja o diretor nacional (atualmente Luís Neves) a “informar mensalmente o Procurador-Geral da República dos procedimentos iniciados no âmbito da prevenção a que se refere o artigo anterior”.
Ainda assim, o MP pode decidir não delegar da Judiciária.
Além dos crimes já referidos, estão também previstas estas ações de prevenção quando estão em causa "administração danosa em unidade económica do setor público; fraude na obtenção ou desvio de subsídio, subvenção ou crédito; infrações económico-financeiras cometidas de forma organizada, com recurso à tecnologia informática; infrações económico-financeiras de dimensão internacional ou transnacional".
De acordo com o último Relatório do MP, relativo a 2023, nesse ano foram instauradas quatro averiguações preventivas, que se somaram a 26 transitadas do ano anterior.
Neste ano, duas foram convertidas em inquérito e 19 arquivadas. Ficaram pendentes nove averiguações preventivas para 2024, cujo desfecho ainda não é público.
Branqueamento de capitais e financiamento de terrorismo
Embora, segundo a PGR, esta averiguação preventiva esteja enquadrada na lei do combate à corrupção e à criminalidade económico-financeira, todos os anos são efetuados também, todos os anos, milhares de operações destinadas a prevenir o branqueamento de capitais e a combater o financiamento de terrorismo.
Existem várias entidades, como os Bancos, obrigadas a reportar operações financeiras que considerem suspeitas que são depois analisadas pela Unidade de Informação Financeira da PJ e pelo DCIAP.
Segundo o relatório do MP, em 2023 foram instaurados 18.096 "procedimentos de prevenção", um aumento em relação aos 14.393 do ano anterior.
O aumento de 25,7% do número de procedimentos instaurados em 2023 relativamente ao ano anterior foi acompanhado pelo aumento de 72,1% de suspensões de operações bancárias - um total de 1203.
Foram ainda abertos 920 inquéritos, mais 25% que no ano anterior.
As designadas "Pessoas politicamente expostas e titulares de outros cargos políticos ou públicos" são especialmente visadas nestas operações de prevenção, estando as entidades obrigadas a estas comunicações sujeitas a várias regras de controlo, "em complemento aos procedimentos normais de identificação e diligência":
1- Detetam a qualidade de «pessoa politicamente exposta», adquirida em momento anterior ou posterior ao estabelecimento da relação de negócio ou à realização da transação ocasional;
2- Asseguram a intervenção de um elemento da direção de topo para aprovação do estabelecimento de relações de negócio ou da execução de transações ocasionais; da continuidade das relações de negócio em que a aquisição da qualidade de «pessoa politicamente exposta» seja posterior ao estabelecimento da relação de negócio;
3- Adotam as medidas necessárias para conhecer e comprovar a origem do património e dos fundos envolvidos nas relações de negócio, nas transações ocasionais ou nas operações em geral, para o efeito;
4- Monitorizam em permanência e de forma reforçada as relações de negócio, tendo particularmente em vista identificar eventuais operações que devam ser objeto de comunicação.
Este regime é aplicável às relações de negócio ou transações ocasionais com clientes, seus representantes ou beneficiários efetivos que sejam membros próximos da família e pessoas reconhecidas como estreitamente associadas, titulares de outros cargos políticos ou públicos, em que seja identificado um risco acrescido de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo.