O ano ainda agora começou e já morreram pelo menos quatro mulheres em 2025, duas das quais no âmbito do mesmo crime, uma média de quase uma por semana durante o mês de janeiro. O primeiro destes homicídios aconteceu a 7 de janeiro. Um homem de 80 anos matou a mulher, de 72 anos, no interior da casa onde residiam em Lisboa, num crime que segundo a Polícia Judiciária ocorreu “em contexto de disfuncionalidade familiar”. O suspeito foi detido no dia seguinte e ficou em prisão preventiva. Não havia registo de queixas de violência doméstica, mas os vizinhos revelaram já ter ouvido gritos e discussões.Na madrugada de 9 de janeiro, no Barreiro, um homem matou a mulher com uma tesoura, à frente dos dois filhos do casal, de seis e 14 anos, sendo que o mais velho ainda terá tentado impedir a agressão. A PSP recebeu um alerta para “uma ocorrência de violência doméstica a decorrer”, mas quando chegou ao local já encontrou a vítima sem sinais vitais. O suspeito entregou-se numa esquadra duas horas depois do crime. Ao contrário do crime de 7 de janeiro, neste já era conhecido um contexto de violência doméstica, uma vez que a mulher já teria feito uma queixa contra o marido em 2022, que acabou por ser arquivada..Mulher assassinada no Barreiro. Filho menor terá tentado impedir agressão e suspeito entregou-se à polícia . O caso mais recente ocorreu esta quinta-feira na localidade de Almoinha, concelho de Sesimbra. Um homem de 43 anos matou a mulher, de 45, e a enteada, de 17, com uma faca de cozinha, suicidando-se em seguida. Quando chegaram à habitação, os militares da GNR depararam-se com três cadáveres e um bebé 16 meses, que escapou ileso e foi entregue a familiares. A adolescente ainda pediu ajuda a um primo com o qual estava a jogar online quando foi atacada pelo padrasto, mas familiares e autoridades não chegaram a tempo de impedir o crime. Segundo o JN, o casal estava junto há dez anos, mas a mulher havia saído recentemente de casa com as filhas e, entretanto, regressado após uma reconciliação. Porém, não havia qualquer registo de queixas por violência doméstica. .Homem mata mulher e enteada em Sesimbra e suicida-se. Bebé escapa ileso .Assassinadas 25 mulheres em Portugal entre 1 de janeiro e 15 de novembro do ano passadoSegundo um relatório preliminar do Observatório de Mulheres Assassinadas (OMA), promovido pela União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) e divulgado a 20 de novembro, foram assassinadas 25 mulheres entre 1 de janeiro e 15 de novembro do ano passado.O número é similar ao do período homólogo de 2023, mas apresenta uma diferença importante: cresceu o número de assassinatos catalogados como femicídio - ou seja, motivados por violência de género. Em 2024, 20 dos 25 casos de mulheres assassinadas referem-se a situações de femicídio, um aumento de 33% face ao ano anterior.Desses 20 casos de femicídio, 16 deles ocorreram em contexto de intimidade e, destes, 15 foram cometidos por homens e um por mulheres. Segundo os dados apresentados pela equipa do OMA/UMAR, 12 desses casos ocorridos em contexto de intimidade aconteceram em relações que estavam atuais, enquanto quatro ocorreram em contexto de relações que já tinham terminado..Já foram assassinadas 25 mulheres em Portugal este ano. Em oito desses casos de femicídio em contexto de intimidade havia filhos em comum entre ofensor e vítima, e em três deles os filhos eram menores.Dos outros quatro casos de femicídio, três reportam a situações de contexto familiar não íntimo e um aconteceu em contexto de violência sexual.Segundo o relatório apresentado pelo Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR, metade dos femicídios podia ter sido prevenido com atuações atempadas, pois já existia violência prévia e era conhecida de familiares, vizinhos ou amigos.Seis dos 20 casos ocorridos tinham já sido identificados pelas autoridades pois havia queixas na polícia, e em três desses casos havia mesmo ameaças de morte reportadas.De resto, três dos agressores tinham já um historial criminal, incluindo de violência doméstica. E num dos casos havia mesmo historial de femicídio de uma ex-namorada.Quanto ao perfil das vítimas de femicídio este ano, a maioria tinha mais de 36 anos, 14 tinham filhos e em seis dos casos os filhos eram menores de idade.Quanto aos agressores, a maioria tem entre 51 e 64 anos. Dos 20 ofensores, 11 tinham filhos na altura do crime e em quatro desses casos as crianças eram menores.Doze dos crimes de femicídio ocorreram na residência conjunta de agressor e vítima, enquanto cinco casos ocorreram na via pública.O meio empregue para o crime foi, na maioria, armas de fogo ou armas brancas, mas houve também femicídios concretizados com objetos contundentes ou outros meios.Em seis dos casos existiu mesmo mais do que um meio para matar e a agressividade e violência do assassinato demonstrou não apenas intuito matar a vítima como de a desfigurar.Segundo o relatório do OMA/UMAR, quatro dos 20 ofensores suicidaram-se, três tentaram e 12 encontram-se em prisão preventiva..Violência doméstica: sobe, desce ou ninguém sabe?.Crimes contra menores estão em crescimento desde 2021O mais recente Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) mostra que os casos de violência doméstica cometidos contra menores estão em crescimento desde 2021 em Portugal. Naquele ano, foram 639 ocorrências. Em 2022, houve 819 registos. Em 2023, foram 964 casos. Entre as vítimas, 28,3% tinham menos de 16 anos e 9,2% tinham entre 16 e 24 anos. No cenário geral da violência doméstica em Portugal, tipo de crime que já é o segundo mais denunciado no país, o RASI regista 27 203 ocorrências.Já a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), que tem os números mais atualizados, registou, até setembro de 2024, 23 032 ocorrências, com 4 208 acolhimentos feitos na Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica. Deste total, 2 016 foram crianças e 2 127 foram mulheres..Governo está a trabalhar na informatização da nova ficha de avaliação de riscoO Governo está a proceder a informatização da nova ficha de avaliação sobre o risco de violência doméstica, confirmou ao DN a ministra da Juventude e Modernização. "Estamos a trabalhar para que a informatização da ficha revista seja uma realidade, de modo a facilitar a sua aplicação", afirma Margarida Balseiro Lopes a 23 de janeiro.Oficialmente chamado Instrumento de Avaliação de Risco de Violência Doméstica (RVD), este documento é utilizado pelas forças de segurança quando uma vítima denuncia uma situação de violência. O objetivo é avaliar o risco ao qual estarão sujeitas de poderem sofrer atos de agressão física grave ou de serem assassinadas.A ficha agora aplicada foi criada em 2014 e, desde então, nunca tinha sido revista. O documento acaba de ser reformulado e, pela primeira vez, inclui, questões específicas para melhorar o atendimento às crianças, jovens e idosos, população que não era contemplada pela ficha atualmente em vigor. O trabalho de atualização foi feito pela Faculdade Egas Moniz..Violência doméstica. Ministra revela que Governo está a trabalhar na informatização da nova ficha de avaliação de risco.De acordo com a coordenadora do projeto de atualização, “a atual ficha, que ainda está em vigor, está muito direcionada à violência no contexto das relações de intimidade, especificamente às mulheres vítimas”, explica Íris Almeida ao DN. “Nós sabemos que esta é uma realidade em Portugal e também em todos os outros países, mas não nos podemos esquecer de que a violência doméstica tem outras vítimas”, diz a professora.Atualmente, a faculdade está a dar formações aos profissionais para aplicação da novo instrumento. "Estamos na primeira fase de formações. O passo seguinte, que se iniciará em fevereiro, passará pela replicação interna das formações por forma a chegar a todos os operacionais", explica Margarida Balseiro Lopes.Conforme avançou o DN, testes feitos à ficha atualizada em novembro e dezembro passados revelaram que instrumento atual já poderia estar a falhar. “Embora, no curto espaço do piloto, a maioria foram vítimas mulheres no contexto de relações de intimidade, tivemos outras vítimas. Conseguimos perceber que os novos fatores são preditivos para a reincidência da violência”, diz a professora Iris Almeida.Com as formações em andamento e o trabalho de informatização a ser realizado em simultâneo, não há ainda, segundo a ministra Margarida Balseiro Lopes, "condições de precisar a data exata da entrada em vigor da nova ficha".