Ao todo, eram 2375 os médicos que fizeram a prova de acesso no início de novembro para ingressar no internato médico da especialidade de 2026. Ao todo, havia também 2331 vagas lançadas pelo Ministério da Saúde através do organismo que gere este processo, a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS). Mesmo assim, com menos vagas e mais candidatos, ao início da manhã desta sexta-feira, dia 28 de novembro, antes de se iniciarem as candidaturas deste dia, a Federação Nacional dos Médicos (Fnam) fez as contas e apurou que havia 765 vagas por preencher e 283 desistências. No início da semana, o presidente do Conselho Nacional do Médico Interno da Ordem dos Médicos, José Durão, tinha lançado o alerta para o “ritmo das candidaturas”, quando já havia quase 100 dos melhores classificados que tinham desistido e 500 vagas por preencher em Medicina Geral e Familiar e 164 em Medicina Interna, áreas basilares para o Serviço Nacional da Saúde (SNS). Como o DN noticiou na altura, também para José Durão, a este ritmo poderia ser o ano em que se perderia mais novos médicos no serviço público. Mas, esta sexta-feira, a Federação Nacional dos Médicos (Fnam) vem dizer que a situação ainda está pior e que os números “não enganam”. Até ao início deste dia, na reta final do prazo, que termina sábado, dia 29, o internato de 2026 pode ser “o pior de todos até aqui”, aquele em que se “perde mais médicos que poderiam ir para o SNS”, argumentando que se tal acontece “é porque o governo não lhes dá condições para ficar”. Segundo referiu ao DN a presidente da Fnam, Joana Bordalo e Sá, “a situação é absolutamente intolerável e já enviámos uma missiva formal à ministra Ana Paula Martins e à Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), exigindo a revisão urgente do regime e regulamento do Internato Médico, assim como medidas concretas para travar a destruição em curso. Cada dia sem resposta é mais um dia a perder médicos no SNS”..Melhores classificados no internato esgotam vagas de Dermatologia e Oftalmologia. “Fator económico é decisivo”, diz conselho da Ordem. De acordo com as contas da Fnam, um terço das vagas estavam por preencher, “um número que não é apenas preocupante: é uma demonstração clara da falta de vontade política do governo de Luís Montenegro e da tutela de Ana Paula Martins em tornar as condições de trabalho dos médicos internos atrativas”, reforça Joana Bordalo e Sá.A grande preocupação é que as “as vagas que ainda se encontram vazias concentram-se exatamente nas áreas estruturantes que permitem o funcionamento do SNS”, sublinha. A saber: 386 vagas em Medicina Geral e Familiar (56%), que representam 51% de todas as vagas sobrantes; 132 vagas em Medicina Interna (65%); 51 vagas em Patologia Clínica (91%); 42 vagas em Saúde Pública (70%); 37 vagas em Medicina Intensiva (50%) e 17 vagas em Medicina de Urgência e Emergência (55%).A médica ressalva que esta questão ainda se agrava mais quando “há 283 que já desistiram da candidatura e que este número deve aumentar até amanhã, que é o último dia”. Ou seja, sublinha, “12% do total de candidatos, o que não é apenas um detalhe estatístico. É um aviso sério. Estes médicos desistiram antes de escolherem uma especialidade, porque o SNS lhes oferece precariedade, sobrecarga e ausência de perspetiva de carreira”, sendo “o governo que os está a empurrar para fora do serviço público”, acusa.A região mais afetada é a de Lisboa e Vale do Tejo, que a sindicalista diz que continua “sem conseguir fixar médicos”, acrescentando que a sua estrutura também vai exigir que sejam negociadas novas medidas para a mobilidade, argumentando: “O governo oferece vagas no papel, mas recusa oferecer condições no terreno. E o resultado está à vista: equipas por completar, serviços em rutura e centenas de médicos que são afastados do SNS como opção de futuro”.A dirigente sindical relembra que dos cerca de 31 mil médicos do SNS, “11 mil são médicos internos, que sustentam diariamente serviços inteiros — muitas vezes sozinhos em urgências, expostos, desprotegidos e obrigados a assumir responsabilidades que não correspondem ao seu estatuto”. E, em vez de “os proteger, o governo mantém-nos fora da carreira médica, numa posição laboral indefensável”, destacando ainda que em todas as negociações a Fnam continua a exigir a integração dos médicos internos na carreira médica. “Era uma forma de reconhecer o seu trabalho sem custos orçamentais”, explicou ao DN.Para Joana Bordalo e Sá, “as condições de trabalho destes médicos têm vindo a piorar”, referindo mesmo um estudo da “Ordem dos Médicos, publicado em 2023, onde já se demonstrava que 25% dos internos estavam em burnout e 55% em risco. O alerta era claro, os números eram públicos e a urgência estava identificada. O governo atual nada fez para inverter esta realidade”.E reforça: “Vamos exigir nova negociação para a reintegração do Internato Médico como primeira categoria da carreira médica; para a valorização do médico interno como trabalhador e formando com condições dignas e formação de qualidade; a criação de um fundo de formação que garanta acesso a cursos, congressos e produção científica; a atualização dos apoios à mobilidade e alojamento e o cumprimento rigoroso da lei laboral por todas as instituições”.De acordo com dados da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), organismo que gere este processo de candidaturas, em 2023 foram lançadas 2133 vagas, houve 1991 ocupadas, ficando vazias 142 vagas. Em 2024, foram lançadas 2187, preenchidas 1939 e ficaram vazias 248. Em 2025, foram lançadas 2190, com 1915 ocupadas e 275 vazias. Ao todo, nos últimos três anos ficaram por preencher 665 vagas.A presidente da Fnam diz que resta esperar pelas 20:00 horas de amanhã, sábado, para se saber ao certo o cenário que aguarda o internato de 2026.