Ana Paula Martins, ministra da Saúde
Ana Paula Martins, ministra da SaúdeANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Governo vai forçar médicos do Barreiro a trabalhar na urgência obstétrica em Almada

O bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, considera “absolutamente lamentável” a intenção de transferência forçada de médicos para garantir o funcionamento das urgências obstétricas.
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A equipa de obstetrícia do Hospital do Barreiro vai ser mobilizada, por despacho, para garantir as escalas na urgência do Hospital Garcia de Orta, em Almada, noticia esta sexta-feira, 19 de setembro, o jornal Expresso. Uma decisão que o bastonário da Ordem dos Médicos veio entretanto dizer ser "absolutamente lamentável".

Segundo o Expresso, que cita fonte do gabinete da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, a transferência forçada deverá ocorrer logo que o Governo avance com a concentração das urgências de obstetrícia na margem sul em Almada, tal como anunciou esta semana no parlamento.

Na altura, Ana Paula Martins disse que para a concentração da urgência no Hospital Garcia de Orta, em Almada, com o apoio do Hospital de Setúbal (a receber casos enviados pelo INEM e pelo SNS 24), seriam necessárias sete equipas completas para o Hospital Garcia de Orta e três de prestação de serviço.

Contudo, os sindicatos, ouvidos pelo Expresso, defendem que tal só será possível em regime de voluntariado ou relativamente aos médicos em dedicação plena, que são obrigados a garantir urgências que distem até 30 quilómetros do hospital a que pertencem.

“O despacho só depende da assinatura da ministra e não exige negociação. Está já com os juristas”, explicaram ao Expresso os assessores de Ana Paula Martins.

Em declarações à agência Lusa, Carlos Cortes considerou a decisão “absolutamente lamentável”, sublinhando que “a Ordem dos Médicos censura qualquer tipo de intervenção colocada, logo à partida, desta forma”.

“Em primeiro lugar, temos de garantir sempre a segurança clínica”, que não deve ser imposta “por decreto”, mas com a tomada das opções técnicas mais adequadas.

O bastonário defendeu que é necessária uma reorganização das urgências de ginecologia obstetrícia na península de Setúbal, que, segundo disse "tem tido uma "história de sucessivos falhanços", e avisou que “esta postura de querer fazer as coisas à força, obrigando, sem dialogar, sem falar, sem explicar os objetivos, sem explicar como é que as coisas vão ser feitas, sem ouvir também outras opções, outras possíveis soluções, pode levar a mais um falhanço”.

O bastonário lembrou que já houve tentativas em todo o país de obrigar médicos a deslocarem-se para outros locais, “contra aquilo que é a razoabilidade técnica, a evidência técnica”, o que acabou com a saída dos médicos como aconteceu no Hospital Santa Maria, em Lisboa, de onde saíram sete obstetras.

“Temos esta experiência em Portugal, por isso é que eu acho este anúncio lamentável. É de alguém que não conhece a realidade de Portugal”, vincou.

“Tudo aquilo que é feito à força, posso-lhe garantir, não vai correr bem e nunca terá o apoio da Ordem dos Médicos”, declarou.

Esta forma de transferir equipas já ocorreu no verão de 2023, no Hospital de Santa Maria, aquando do fecho da maternidade para obras e construção da nova unidade. Na altura, Ana Paula Martins estava na administração do Santa Maria.

A mudança forçada de profissionais - para o Hospital São Francisco Xavier - foi justificada com a superior proteção da saúde pública, mas a situação não correu bem e, na altura, sete obstetras decidiram rescindir com o Serviço Nacional de Saúde.

A junção de profissionais na urgência de São Francisco Xavier durou cerca de um mês.

Em declarações ao Expresso, o ex-ministro da ministro da Saúde, Manuel Pizarro, chamou a atenção para as diferenças para com a concentração na margem sul: “Não foi fácil e alguns médicos nunca chegaram a sair do Santa Maria. Mas havia um motivo de força maior, o fecho da maternidade para obras, e por isso a urgência [estava impedida] de continuar a assegurar cuidados. E tinha um caráter temporário.”

Mas já antes, em maio de 2023, o anterior Governo conseguiu a partilha de escalas de urgência em obstetrícia com elementos dos hospitais das Caldas e de Leiria, mas neste caso dispensou qualquer despacho pois a alteração ocorreu de forma voluntária.

Os sindicatos garantem que, à exceção dos médicos em dedicação plena, não vai ser possível obrigar as equipas a mudarem de local de trabalho contra a sua vontade pois “os acordos coletivos protegem os médicos da deslocação do seu local de trabalho”, disse a presidente da FNAM, Joana Bordalo e Sá.

A dirigente sindical explica que a concentração dos cuidados “foi possível entre o Santa Maria e o São Francisco Xavier porque estão no mesmo concelho”.

O secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos, Nuno Rodrigues, não tem dúvidas de que a “mobilização dos médicos terá de ser em regime voluntário”.

Diz que o sindicato apoia a ideia de uma urgência metropolitana, mas com quatro garantias: “A adesão voluntária, a existência de equipas completas e incentivos remuneratórios e não remuneratórios, porque se os médicos vão trabalhar mais também têm de descansar mais.”

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