De banqueiro que geria fortunas a condenado pela justiça portuguesa, João Rendeiro foi encontrado, esta sexta-feira, morto numa cela do estabelecimento prisional de Westville, uma das prisões mais perigosas da África do Sul. Completava 70 anos no próximo dia 22 de maio..O antigo presidente do Banco Privado Português (BPP) estava há seis meses em prisão preventiva na prisão sul-africana a aguardar o desfecho do processo de extradição para Portugal, cujo julgamento estava marcado para junho. Rendeiro sempre se opôs a este processo de extradição. Estava previsto que fosse hoje a tribunal..O ex-banqueiro sempre afirmou, aliás, que não tencionava regressar a Portugal. Disse-o quando estava já em fuga e também durante uma das audições no tribunal sul-africano, que lhe decretou a medida de prisão preventiva..Foi no final de setembro do ano passado que se ficou a saber que João Rendeiro tinha fugido à justiça portuguesa para não cumprir pena. Tinha sido condenado em três processos distintos relacionados com o colapso do BPP, sendo que apenas um tinha transitado em julgado, sem possibilidade de mais recursos, com Rendeiro a ter de cumprir uma pena de prisão efetiva de cinco anos e oito meses..Foi ainda condenado a 10 anos de prisão num segundo processo e a mais três anos e seis meses num terceiro processo, sendo que estas duas sentenças ainda não transitaram em julgado. O tribunal deu como provado que o ex-banqueiro retirou do banco 13,61 milhões de euros..A 29 de setembro, em paradeiro desconhecido, João Rendeiro confirma, num texto publicado no blogue "Arma Crítica", que não tencionava voltar a Portugal. Disse que se sentia injustiçado, que a pena que lhe tinha sido aplicada era "manifestamente desproporcionada".."No decurso dos processos em que fui acusado efetuei várias deslocações ao estrangeiro, tendo comunicado sempre o facto aos processos respetivos. De todas as vezes regressei a Portugal. Desta feita não tenciono regressar", começava o texto, intitulado "Legítima defesa ante uma justiça injusta". "É uma opção difícil, tomada após profunda reflexão", lia-se ainda..Rendeiro dizia também que a sua ausência do país era um "ato de legítima defesa contra uma justiça injusta"..Conforme o DN noticiou, Rendeiro saiu de Londres no dia 14 de setembro e só chegou a Joanesburgo quatro dias depois, dia 18. A PJ sabe que nesse período João Rendeiro fez escala em países do Médio Oriente, designadamente o Qatar..Chegado a Joanesburgo, terá tido o apoio de um amigo durante uns dias, tendo ficado nesta cidade algumas semanas. Seguiu depois para Nelspruit, no zona do Kruger Park, 330 km a leste de Joanesburgo, a apenas 100 km da fronteira com Moçambique..O ex-banqueiro terá então viajado para Durban e instalou-se no hotel de cinco estrelas, o Forest Manor Boutique Guesthouse, onde acabaria por ser detido em dezembro..Ainda fugido da justiça, Rendeiro dá uma entrevista à CNN Portugal. Na ocasião, afirmou que só regressaria a Portugal caso fosse ilibado pela justiça ou se o Presidente da República lhe desse a garantia de um indulto..Nesta entrevista, feita em colaboração com o jornal Tal e Qual, Rendeiro comparou-se mesmo com o antigo homem-forte do BES, Ricardo Salgado, de forma desmerecedora para si mesmo: Salgado é "protegido pelo sistema", afirmou..Rendeiro diz que só regressa a Portugal com indulto de Marcelo."Como nunca paguei nada a ninguém e não tenho segredos de Estado, sou um poderoso fraco", considerou o ex-banqueiro do Banco Privado Português. Já Salgado "segue com a sua vida tranquila em Lisboa", disse.."Dois pesos e duas medidas" da justiça portuguesa que Rendeiro justificou com o facto de Salgado ser "uma pessoa que tem muita informação sobre operações delicadas e intervenientes também complexos"..Numa das perguntas feitas pelo jornalista Júlio Magalhães, sobre se regressaria a Portugal pela mulher, Maria de Jesus Rendeiro, que está, atualmente, em prisão domiciliária, o ex-banqueiro respondeu: "Não. Nem isso me faz regressar, porque se a ideia ao atacar a Maria é fazer-me regressar a Portugal, o que seria uma metodologia muito incorreta do ponto de vista institucional, não terá qualquer êxito"..E acrescentou: "Eu escrevi uma carta que saiu no Tal & Qual que terminava de uma maneira um pouco dramática, mas verdadeira, dizia: liberdade ou morte..Rendeiro quebra o silêncio para defender a mulher. "Foi responsabilidade minha".Antes, Rendeiro tinha prestado declarações ao portal SAPO24, para defender a mulher - atualmente em prisão domiciliária - no caso das obras de arte que era fiel depositária. "Como é evidente, ela era fiel depositária só de nome. Aliás, pensava que já não era", disse então..Estava há cerca de três meses fugido à justiça portuguesa quando, na manhã de 11 de dezembro, é detido pelas autoridades sul-africanas num hotel de cinco estrelas na cidade de Durban..A Polícia Judiciária (PJ) acompanhou em tempo real a detenção de João Rendeiro no hotel onde estava instalado - o Forest Manor Boutique Guesthouse, em Umhlanga, na província de Kwazulo Natal..Rendeiro foi detido por uma pequena equipa de agentes de investigação criminal da polícia nacional sul-africana que andava no seu encalço há várias semanas, sempre trocando informações com a PJ..Estava a dormir e mostrou-se "estupefacto", nas palavras de uma fonte que acompanhou a situação. Desta equipa fazia também parte um oficial da Interpol, responsável pela localização de fugitivos à justiça. Não ofereceu qualquer reação de resistência..O DN sabe que Rendeiro passou por vários hotéis e alojamentos de luxo do país, pelo menos quatro, em vários pontos da África do Sul, deixando inclusivamente vários dos seus pertences para trás à medida que ia abandonando esses locais, para não levantar suspeitas..PJ acompanhou detenção em direto. Ex-banqueiro estava dormir e não resistiu."Ele já estava sob nossa vigilância e assim que a necessária documentação chegou prendemos este indivíduo, esta manhã (11 de dezembro), em Umhlanga Rocks, norte de Durban", disse o porta-voz do comissário nacional da polícia sul-africana Vishnu Naidoo, à Lusa..O porta-voz policial sul-africano adiantou, na altura, que o ex-banqueiro, sobre quem pendia um mandado de detenção internacional, encontrava-se detido numa esquadra da polícia, em Durban, e que iria comparecer no Tribunal da Magistratura de Durban como parte do processo de extradição.."Descuido" com passaporte terá tramado ex-banqueiro.A 17 de dezembro, o juiz sul-africano Rajesh Parshotam decretou que João Rendeiro iria continuar detido preventivamente, tendo considerado insuficiente o pagamento de uma fiança de 40 000 rands (2187 euros) proposta pela defesa do ex-banqueiro, assim como liberdade sob o pagamento dessa caução e apresentações diárias às autoridades, uma vez que na África do Sul não há meios para controlar um detido durante 24 horas e que o arguido mostrou desrespeitar o processo ao fugir de Portugal..O magistrado argumentou que João Rendeiro "saiu de Portugal, logo que esgotou possibilidades de recursos na justiça, para evitar prisão". "Ele [João Rendeiro] é um fugitivo, contra as ordens dos tribunais", referiu o magistrado, sublinhando: "Se não respeita processos judiciais em Portugal porque iria respeitar na África do Sul?"..O juiz adiantou que o ex-banqueiro "quase de certeza que fugiria" caso fosse libertado agora. "Libertá-lo não seria pelo interesse da justiça, nem aqui nem em Portugal", acrescentou..João Rendeiro manteve-se então em prisão preventiva no estabelecimento prisional de Westville, uma das maiores e mais perigosas da África do Sul..June Marks, a advogada de João Rendeiro, denunciou as "condições desumanas" em que estava detido o ex-banqueiro, o que a levou a apresentar uma queixa às Nações Unidas..Estava detido na prisão de Westville desde 13 de dezembro e em janeiro foi divulgada uma carta ao secretário-geral da ONU, António Guterres, escrita por June Marks, a denunciar as condições de "insalubridade" do estabelecimento prisional. É pedida uma inspeção o mais rápido possível devido à alegada violação dos direitos humanos.."É uma questão de vida ou de morte". É desta forma que era descrita a situação de João Rendeiro na prisão de Westville no início deste ano. .Rendeiro queixa-se de violação dos direitos humanos. "É uma questão de vida ou de morte".Na altura, a carta a que a CNN Portugal teve acesso, dava conta que o ex-banqueiro estava numa cela com mais 50 prisioneiros, tendo sido alvo de "tentativas de extorsão", convivendo "com criminosos violentos", não tendo como se proteger..A advogada recordava que o ex-banqueiro sofria de um problema cardíaco causado por febre reumática e que "tal condição requer uma monitorização constante" do seu cliente. "Não há instalações médicas reais na cadeia de Westville e não há equipamento para monitorizar a condição", referia June Stacey Marks, que solicitou um cardiologista, mas não obteve uma resposta..Reforçou a gravidade da situação ao afirmar que a "idade e a saúde" de Rendeiro, juntamente com as condições horrendas" na prisão, representavam "uma bomba-relógio". "Somos instruídos a denunciar as atrocidades e violações de direitos na esperança de ajudar outros presos"..Na ocasião, June Marks, indicou as condições do ex-banqueiro na prisão sul-africana são "claramente uma violação dos direitos humanos", pelo que afirma: "somos instruídos a solicitar que a Comissão de Direitos Humanos da ONU compareça e inspecione a prisão de Westville o mais rápido possível para garantir que as condições sejam melhoradas"..Numa altura em que Rendeiro iria voltar ao tribunal de Durban, estando previsto que fossem acordadas as datas para o julgamento em junho referente ao processo de extradição, surge a notícia da sua morte numa cela da prisão de Westville.