Confusão no parlamento. A AD teve uma amostra do que aí vem
Putin liga Kiev a ataque. Uma tese a que falta lógica
Sábado, 23 de março
Mesmo depois do Estado Islâmico ter reivindicado o atentado contra o Crocus City Hall, em Moscovo, o presidente russo, Vladimir Putin, não deixou de estabelecer no sábado uma ligação entre Kiev e o ataque. E continuou a insistir nessa tese durante a semana. O atentado que fez mais de 140 mortos, além de uma evidente falha de segurança, evidenciou também alguma debilidade nos serviços de informação russos, mais grave ainda por terem sido ignorados alertas feitos semanas antes pelos Estados Unidos para o risco iminente de um ataque extremista na capital russa.
A tentativa de Putin em colar Kiev ao ataque é explicada como uma forma para justificar a escalada da guerra na Ucrânia, algo que se notou nas horas imediatamente seguintes, com a execução de ataques aéreos na capital ucraniana e na região de Lviv. Mas a teoria de Putin carece, à primeira vista, de um aspeto essencial: lógica. A Ucrânia está fortemente pressionada pela ofensiva russa, com carências de toda a ordem de armamento e de efetivos, completamente dependente do apoio ocidental para responder a Moscovo. Perpetrar um ataque terrorista em solo russo, contra alvos civis, não só hipotecaria a solidariedade europeia e norte-americana como entregaria os cidadãos da Ucrânia à sua própria sorte.
Como é que estudar se tornou incomportável?
Domingo, 24 de março
Domingo assinalou-se o Dia Nacional do Estudante, numa altura em que não faltam motivos de preocupação para quem frequenta a escola e que vão muito para além daquilo que realmente os devia preocupar: o desempenho académico. Se a falta de professores é, hoje, o principal problema nos ciclos de ensino obrigatório, já no Superior é, sobretudo, o custo elevado das rendas que tem mobilizado a classe estudantil. Os alunos deslocados são os principais prejudicados e, como se pôde ler em reportagem do DN, sobram exemplos de quem é obrigado a sujeitar-se a condições pouco dignas para ter onde viver, mesmo pagando preços elevados (o custo médio de um quarto para estudantes é superior a 400 euros). Ou de quem tem de sujeitar a família a um esforço financeiro desajustado, que não raras vezes se torna incomportável e acaba por obrigar o estudante a desistir do curso.
Os problemas estão longe de se esgotar na falta de quartos a preços acessíveis (e falta de residências públicas), pois à equação é preciso somar o valor das propinas, as dificuldades no acesso a bolsas e, em alguns cursos, o custo elevado dos materiais. O Governo de Costa diz, ainda assim, que deixa como legado à AD um plano para duplicar, até 2030, o número de camas em residências universitárias. Mas a verdade é que o plano pouco ou nada resolve no imediato, quando a crise é mais feroz. O Governo assistiu da primeira fila ao agravamento da crise de habitação e reagiu ao ralenti. E, assim, deixou a porta aberta à repetição de mais casos da (infelizmente típica) injustiça social de serem os alunos mais desfavorecidos que acabam travados no seu percurso académico. Mesmo quando se trata de ensino público.
Marcelo e Costa: uma despedida, muitos elogios
Segunda-feira, 25 de março
O último Conselho de Ministros dirigido por António Costa teve como convidado especial Marcelo Rebelo de Sousa. A ocasião serviu para mostrar ao Presidente da República o novo edifício-sede do Governo (antiga sede da Caixa Geral de Depósitos) e para os dois políticos falarem publicamente sobre os oito anos de relações institucionais, que tiveram mais altos do que baixos. “Não quer dizer que houve sempre acordo, mas houve sempre um bom relacionamento institucional e, acima disso, solidariedade nacional. (…) Um clima de estabilidade, quando o mundo não está estável. Não é fácil encontrar muitos casos na história político-constitucional portuguesa", disse o Chefe do Estado.
O primeiro-ministro fez a mesma leitura: “Dificilmente será possível encontrar outro período da vivência constitucional onde as relações entre Governo e Presidência da República tenham seguido de uma forma tão fluida, tão cooperativa e tão solidária como aconteceu no essencial destes oito anos". Elogios à parte, Costa teve oportunidade de confirmar a Marcelo, neste dia, que o Governo deixa para o Executivo da AD um excedente orçamental, referente a 2023, que é o maior da história da democracia, equivalente a 1,2% do PIB (cerca de 3193 milhões de euros). Pelo menos por um dia, a política portuguesa viveu numa espécie de mundo cor de rosa.
Parlamento. A primeira amostra do caos?
Terça-feira, 26 de março
Confusão e impasse. As duas palavras são a melhor síntese dos acontecimentos do primeiro dia da legislatura, que começou pelas 10.00 e se arrastou noite fora sem que, ainda assim, fosse possível eleger José Pedro Aguiar-Branco para a presidência da Assembleia da República. O Chega, depois da repetição do “não é não” de Luís Montenegro, que bloqueou o acesso do partido de André Ventura a lugares no Governo, deu ao PSD a primeira amostra do que poderão ser os trabalhos parlamentares nos próximos tempos, não permitindo que o ex-ministro da Defesa de Passos Coelho fosse eleito ao cabo de três votações, abrindo até espaço ao PS para apresentar um candidato próprio (Francisco Assis, que acabaria por somar mais votos que o proposto pela AD).
Todos os partidos apontaram baterias ao Chega, tendo a Iniciativa Liberal protagonizado um dos ataques mais duros a Ventura, falando em “birra” e “infantilidade”, talvez já a pensar no duelo que tem de travar à direita na oposição a PSD e CDS e colando, ao mesmo tempo, o PS à responsabilidade pela não eleição de Aguiar Branco. “O Chega não é um partido confiável e a qualquer momento rói a corda. O PS e o Chega são responsáveis por começarmos esta legislatura já neste ambiente indesejável", afirmou Rui Rocha, no dia em que também se confirmou a falta de entendimento com a AD para a IL integrar o novo Governo. A eleição do novo presidente da AR teve de passar para quarta-feira...
Uma solução que mostra a fragilidade da AD
Quarta-feira, 27 de março
O dia começou com sucessivos adiamentos dos horários para apresentação e votação das novas candidaturas à presidência da Assembleia da República. E com a notícia de que Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos estavam a tentar, numa reunião à distância, sem registo fotográfico, uma solução para o impasse. O 'bloco central' lá se entendeu, assumindo um compromisso inédito – e que não faz parte do regimento – que passa pela rotatividade da presidência: primeiro, dois anos de Aguiar Branco (eleito à quarta tentativa, com 160 votos a favor) e, depois, outros dois com um socialista a conduzir os destinos da AR (isto se a legislatura aí chegar...).
PS e Chega não perderam tempo em tentar rentabilizar politicamente este desfecho. Os socialistas salientam que, ao serem os autores desta proposta, foram o partido que mostrou a atitude mais responsável, o adulto na sala, que permitiu normalizar o arranque dos trabalhos parlamentares, perante a falta de entendimentos à direita e face à falta de “capacidade de iniciativa e de liderança” do Governo (as palavras são de Pedro Nuno Santos). Já o Chega carregou na ideia de esta ser mais uma demonstração da tão criticada alternância entre PS e PSD nos cargos de poder. Ventura deixou um recado direto a Montenegro: “Cara a cara te digo: governarás com o PS, porque com o Chega não contarás neste ciclo político”. Já o PSD dificilmente poderá capitalizar seja o que for desta eleição de Aguiar-Branco. O que ficou evidente foi a frágil posição desta maioria relativa e do novo Governo, que terá de tentar conduzir o país sempre na sombra de poder cair a qualquer momento, assim PS e Chega o desejem.
Montenegro blinda Governo com núcleo duro do PSD
Quinta-feira, 28 de março
Dificilmente algum dia Luís Montenegro o assumirá, pois tal fragilizaria as suas escolhas, mas o contexto em que terá de governar, apoiado por uma maioria relativa muito curta em números e em pontes para entendimentos (pelo menos enquanto o “não é não” ao Chega permanecer válido), e o risco de este ser um Governo a prazo se, em outubro, o Orçamento for chumbado, terão condicionado as suas escolhas para ministros e as respostas que recebeu de quem convidou. Perante a tensão permanente que se adivinha no Parlamento, o primeiro-ministro indigitado escolheu o conforto de estar rodeado no Governo pelo núcleo duro da direção social-democrata, chamando para ministros 8 dos 13 membros da Comissão Permanente do PSD e também três dos eurodeputados do partido (metade dos que elegeu nas Europeias de 2019). É, assim, um governo de matriz claramente partidária, com espaço para poucos independentes, e com o CDS a ficar com uma pasta, a da Defesa, nas mãos do presidente dos centristas, Nuno Melo. Uma boa novidade foi a recuperação de um Ministério dedicado à Juventude. Que traga políticas capazes de convencer os mais jovens a ficarem no país. É urgente.
Um tornado no Tejo. E ainda vai ficar pior
Sexta-feira, 29 de março
Centenas de partilhas de imagens nas redes sociais, que documentavam a passagem de um fenómeno extremo de vento pela região sul de Lisboa, que o IPMA admite tratar-se de um tornado, fizeram furor na tarde de quinta-feira pela sua raridade. Mas estas imagens podem, infelizmente, tornar-se comuns nos próximos anos. O alerta foi feito ontem pelo vice-presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, José Carlos Pimenta Machado, advertindo que devido às alterações climáticas o país deve estar preparado para lidar com um número crescente de fenómenos extremos, com consequências cada vez mais severas. Deu como exemplo o facto de entre o final de outubro e o início de novembro, no espaço de 15 dias ter chovido mais no rio Lima (que atravessa o Alto Minho) do que chove em dois anos em toda a região do Algarve. Sobre o que há a fazer, a APA não tem dúvidas: “Preparar as cidades, territórios e infraestruturas para esta nova realidade, para viver com picos de precipitação, longos períodos de seca e ondas de calor”. Iremos a tempo?