Os portugueses vão votar a 12 de outubro para escolherem presidentes de câmaras, assembleias municipais e juntas de freguesia.
Os portugueses vão votar a 12 de outubro para escolherem presidentes de câmaras, assembleias municipais e juntas de freguesia.LEONARDO NEGRÃO

Se Lisboa repetisse voto das legislativas, Moedas seria reeleito e só quatro freguesias trocariam de mãos

Transpondo os votos das legislativas de maio para as coligações Por ti, Lisboa (PSD, CDS e IL) e Viver Lisboa (PS, Livre, BE e PAN), qual seria o desfecho das autárquicas de outubro? DN conta-lhe tudo
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O exercício que propomos parte de uma premissa, quase impossível de se concretizar, que é a de os lisboetas repetirem nas autárquicas de 2025 exatamente o mesmo voto que tiveram em maio nas legislativas, quando Luís Montenegro foi reeleito primeiro-ministro. No entanto, a proximidade entre atos eleitorais (menos de cinco meses de diferença) permite pensar que a tendência de voto dos lisboetas não tenha mudado radicalmente num intervalo de tempo tão curto e dá espaço para observar tendências que se podem repetir, agora, em outubro. Se tal acontecesse, as principais conclusões a reter são duas: Carlos Moedas seria reeleito presidente da câmara; e em apenas quatro das 24 freguesias do concelho de Lisboa o poder mudaria de mãos.

Mas vamos por parte e comecemos pelas diferenças. A 18 de maio, os portugueses escolheram os futuros deputados da Assembleia da República, com base em círculos distritais. No de Lisboa, as escolhas das principais forças políticas para cabeças de lista recaíram, na sua maior parte, nos líderes dos partidos: André Ventura (Chega), Rui Tavares (Livre), Paulo Raimundo (CDU), Mariana Mortágua (Bloco de Esquerda) e Inês de Sousa Real (PAN). A Aliança Democrática (PSD+CDS) apostou no ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento; o PS em Mariana Vieira da Silva (ex-ministra nos Governos de António Costa) e a Iniciativa Liberal na deputada Mariana Leitão, que mais tarde, após as eleições, viria mesmo a tornar-se presidente da IL sucedendo a Rui Rocha. Ou seja, em outubro nenhum destes protagonistas vai a votos nas autárquicas em Lisboa.

Outra diferença, a principal, e que dá azo a esta projeção do DN: enquanto que nas legislativas a única coligação formada foi a da AD, tendo todos os outros partidos candidatos próprios, agora nas autárquicas temos quatro forças reunidas na coligação Viver Lisboa (PS, Livre, BE e PAN), liderada por Alexandra Leitão, e, além disso, a Iniciativa Liberal juntou-se à AD no apoio à reeleição de Carlos Moedas, na coligação Por ti, Lisboa.

Carlos Moedas procura a reeleição em Lisboa. Conta com o apoio de PSD, CDS e Iniciativa Liberal na coligação Por ti, Lisboa.
Carlos Moedas procura a reeleição em Lisboa. Conta com o apoio de PSD, CDS e Iniciativa Liberal na coligação Por ti, Lisboa.Reinaldo Rodrigues

Dito isto e em modo de advogado do diabo, a noção (que é a de muitos envolvidos nas duas coligações que disputam a Câmara de Lisboa, mesmo que não a admitam, escudando-se na frase batida de que as eleições para o poder são uma ciência que os resultados nacionais desconhecem) é que as legislativas de 2025 são um termo de comparação muito mais fiável do que as autárquicas de 2021. Basta recordar que, no dia em que Moedas destronou Medina, André Ventura ainda era o deputado único do Chega, tal como João Cotrim de Figueiredo o era da Iniciativa Liberal, e Rui Tavares nem sequer estava na Assembleia da República, com o Livre a perder representação pela passagem de Joacine Katar Moreira a deputada não inscrita.

Olhemos agora para os resultados nas legislativas, começando pelo distrito (composto por 16 concelhos). A AD foi a vencedora, com 28,47% dos votos e 15 deputados eleitos, seguida de PS (23,67%, 12 deputados), Chega (20,87%, 11 deputados), Iniciativa Liberal (7,62%, 4 deputados), Livre (6,87%, 3 deputados); PCP (3,57%), BE (2.35%) e PAN (1,84%), cada um com um deputado.

Façamos agora um zoom aos resultados no concelho de Lisboa e suas 24 freguesias, que são aqueles que realmente permitem fazer a ponte para as próximas eleições autárquicas. Aqui, a ordem dos partidos mais votados foi quase idêntica ao que se passou no distrito, com apenas uma diferença – no concelho, o Livre (9,40%) ultrapassou o número de votos da IL (9,27%), sendo o quarto mais votado, atrás da AD (31,65%), PS (23,30%), Chega (14,53%) e à frente dos já mencionados liberais, da CDU (3,67%), BE (2,69%) e PAN (1,68%).

Nem CDU salvaria Viver Lisboa

Chegou a altura de fazer contas, importando recordar que a referência são os resultados das recentes legislativas de 18 de maio. Se os lisboetas repetissem a suas escolhas, Carlos Moedas seria reeleito presidente da principal câmara municipal do país, contando com 40,92% de votos na coligação Por ti, Lisboa (somatório dos resultados eleitorais de AD e IL em maio). Alexandra Leitão, à frente da coligação Viver Lisboa, somaria apenas 37,07%. E a história não seria diferente mesmo se a CDU, em vez de se apresentar João Ferreira como candidato à câmara, tivesse também aderido à coligação de esquerda formada por PS, Livre, BE e PAN. Com os votos da CDU, Alexandra Leitão somaria 40,74%, ficando a uma curta margem de superar Moedas e ser ela a sentar-se na cadeira do poder dos Paços do Concelho, tornando-se assim a primeira mulher a exercer o cargo de presidente de câmara em Lisboa.

Alexandra Leitão conseguiu juntar na coligação Viver Lisboa quatro partidos: PS, Livre, Bloco de Esquerda e PAN.
Alexandra Leitão conseguiu juntar na coligação Viver Lisboa quatro partidos: PS, Livre, Bloco de Esquerda e PAN.LEONARDO NEGRÃO

Em entrevista ao DN, publicada no passado dia 24 de julho, João Ferreira explicou a razão porque a CDU quis ter candidato a Lisboa e deu a sua opinião sobre a junção de forças de PS, Livre, BE e PAN na cidade: “Se alguns entendem que é por aqui que vamos encontrar uma alternativa de governo na cidade, não temos mais do que respeitar essa posição. Embora possa haver aí também outro tipo de motivações, nomeadamente preservar algum tipo de lugares. Não trocamos princípios por lugares. Os lugares são uma forma de concretizar princípios e um programa e um projeto e uma visão para a cidade que temos. Essa visão e esse projeto confronta-se com o que foram os últimos quatro anos de Moedas, mas também com o que foi a atuação do Partido Socialista antes disso. Algumas dessas forças, em áreas importantes na vida da cidade, votaram de forma antagónica na Câmara Municipal ao longo dos últimos anos, de forma recorrente. Só lhe posso dizer que mantemos a nossa coerência.”

Quatro trocas nas freguesias

Puxemos agora de uma lupa ainda maior para olhar as 24 freguesias de Lisboa, que, como se sabe, têm candidatos próprios e são uma eleição à parte da escolha do presidente de câmara (tal como acontece em relação às Assembleias Municipais). Os resultados das autárquicas de 2021 deram a vitória à coligação PS/Livre em 13 freguesias (Ajuda, Alcântara, Beato, Benfica, Campo de Ourique, Campolide, Marvila, Misericórdia, Olivais, Penha de França, Santa Clara, Santa Maria Maior e São Vicente), 10 foram ganhas pela coligação Novos Tempos, que juntava PSD, CDS, Aliança, MPT e PPM (Alvalade, Areeiro, Arroios, Avenidas Novas, Belém, Estrela, Lumiar, Parque das Nações, Santo António e São Domingos de Benfica) e uma ficou na posse da CDU (Carnide). Agora, neste mapa particular, à luz dos resultados das legislativas de maio, em apenas quatro freguesias o poder trocaria de mãos.

Carnide, único bastião comunista nas juntas da cidade que resistiu nas autárquicas de 2021, passaria a ser liderada por Cláudio Masi. O candidato apoiado por PSD, CDS e IL, que já concorrera em anos anteriores em listas do CDS-PP, somaria 40,4% dos votos. De notar que, nas últimas legislativas, a CDU não foi além dos 3,53% em Carnide, freguesia cuja junta é governada há mais de 30 anos pelos comunistas. Além disso, o atual freguês, Fábio Sousa, atingiu a limitação de mandatos, o que é um sério revés para os comunistas, já que foi ele o principal responsável por a CDU manter na sua posse a junta em 2021 (com 45,53% dos votos), quando a maioria da população de Carnide (32,30%) preferiu dar o voto a Fernando Medina (PS/Livre) para liderar a câmara municipal.

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Carlos Moedas vs. Alexandra Leitão. O duelo em pano de fundo

Esta situação é semelhante ao que aconteceu em Campo de Ourique. Lá, Carlos Moedas foi o mais votado para a câmara, mas a Junta de Freguesia, por uma diferença de apenas 25 votos, foi ganha por Pedro Costa, da coligação PS/Livre (o político, filho do antigo primeiro-ministro António Costa, demitir-se-ia do cargo em abril de 2024, alegando “incompatibilidades” com o executivo camarário de Moedas, que estariam a limitar o alcance das suas políticas locais). Agora, se os resultados das legislativas de 2025 de repetissem em Campo de Ourique, a eleita seria Ana Mateus, da coligação Por ti, Lisboa, com 44,53% dos votos.

Outra freguesia que a coligação PSD, CDS e IL conquistaria aos socialistas seria Campolide, com 39,36% dos votos contra os 36,81% de PS, Livre, BE e PAN juntos, que se registaram nas legislativas. Neste caso, ao contrário do que aconteceria em relação à câmara municipal, se a CDU integrasse a coligação Viver Lisboa a junta permaneceria a ser governada pela esquerda, em vez de ter como líder José Cerdeira, candidato indicado pela Iniciativa Liberal.

Por fim, falemos de Arroios. A junta é, atualmente, da AD. Nas legislativas, o acumulado de votos da AD+IL na freguesia correspondeu a 36,23%, mas PS+Livre+BE+PAN juntos alcançaram 43,84%, logo o presidente eleito seria João Jaime Pires, ex-diretor do Liceu Camões e candidato da Viver Lisboa. E a derrotada, caso se reflitam os resultados das legislativas, seria a centrista Madalena Natividade, nascida em Moçambique, e que sucedeu em 2021 à polémica socialista Margarida Martins, cujos escândalos, noticiados pela comunicação social (uma reportagem da “Sábado” mostrava-a a ficar com produtos de comerciantes do Mercado de Arroios sem pagar nada), contribuíram para a derrota de Fernando Medina.

Uma nota de rodapé ainda para o caso de Marvila. Nas legislativas, foi a única freguesia lisboeta onde o Chega ganhou a votação, com 31,09%, mas, nas autárquicas, tal resultado não garantiria a eleição de um presidente de junta ao partido de André Ventura, pois PS, Livre, BE e PAN juntos arrecadaram 38,81% dos votos. Nesse caso, a favor do partido de André Ventura estará a condenação do recandidato José António Videiro por prevaricação na contratação de funcionários, pese embora tal sentença tenha sido anulada pela Relação de Lisboa.

Contas finais: se os resultados das legislativas se repetissem a 12 de outubro, Carlos Moedas seria reeleito presidente da câmara, a coligação Por Ti, Lisboa ficaria com a presidência de 12 juntas e a Viver Lisboa também com 12, um curioso empate. Ainda mais curioso seria que os lisboetas votassem exatamente igual ao que fizeram há seis meses. A probabilidade estatística rondará os 0,muuuuuitoszeros1%, mas, como dizem os nossos vizinhos espanhóis, “yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay”.

Os portugueses vão votar a 12 de outubro para escolherem presidentes de câmaras, assembleias municipais e juntas de freguesia.
Autárquicas. Mais de um terço dos candidatos à Câmara de Lisboa vivem fora da cidade

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