No início de junho, acabada de chegar à Polónia no rescaldo das presidenciais que levaram o nacionalista Karol Nawrocki ao poder, escrevia aqui: “Com a guerra na Ucrânia do outro lado da fronteira, por aqui reina a ideia de que a Polónia pode ser a próxima na mira das ambições imperialistas da Rússia de Vladimir Putin, se não tiver um poderio militar capaz de dissuadir o senhor do Kremlin”. A crónica intitulava-se “Se a Polónia cair, ninguém na Europa está a salvo”. Passados três meses, a entrada de drones russos em espaço aéreo polaco, forçando caças polacos e neerlandeses ao serviço da NATO a derrubá-los veio mostrar que a preocupação dos polacos era mais do que simples alarmismo. Mesmo que Moscovo negue que fosse intencional e diga que os drones eram dirigidos à Ucrânia.Em Varsóvia, muitos não escondiam, naquela altura, receio de que o novo presidente afastasse o país de Bruxelas, bloqueando as decisões do governo do primeiro-ministro pró-europeu Donald Tusk. Eleito com a promessa de Fazer a Polónia Grande Outra Vez, slogan emprestado a Donald Trump, e com apoio do presidente americano, desde que tomou posse, em agosto, Nawrocki vetou vários projetos de lei do governo. O veto mais noticiado foi o que travou a extensão do subsídio a refugiados ucranianos, ainda uns 900 mil hoje na Polónia. E se logo após a invasão russa o acolhimento foi quase unânime, têm surgido relatos de abusos e xenofobia. Apesar disso, e de ser contra a adesão precipitada da Ucrânia à UE e à NATO, Nawrocki deixou claro que quanto à Rússia, tal como a esmagadora maioria dos polacos, só vê perigo. Numa recente visita à Finlândia, garantiu que Vladimir Putin está “preparado para atacar outros países” e “não confiamos” no presidente russo. Na quarta-feira, horas após a notícia dos drones russos, Nawrocki escrevia no X: “A segurança da nossa pátria é a nossa maior prioridade e requer uma cooperação estreita”. Já Tusk alertava que a Polónia nunca esteve tão perto de um conflito militar “desde a II Guerra Mundial”. Que dois rivais políticos, que tudo separa - da imigração aos direitos dos LGBT - falem em uníssono perante a possibilidade de confronto com a Rússia não espanta. Afinal a rivalidade histórica com os russos é bem conhecida dos 40 milhões de polacos, depois da partição entre Rússia, Prússia e Áustria no século XVIII, que apagou o país do mapa durante 123 anos, e de mais de quatro décadas de um regime comunista pró-Moscovo só derrubado em 1989.E nem foi preciso a ameaça de drones russos para o governo polaco tomar medidas para se proteger das ambições do gigante vizinho: sexta economia da UE, a Polónia deverá gastar 4,7% do PIB em defesa este ano. E há meses o executivo de Tusk anunciou planos para dar treino militar a todos os cidadãos. “Nesta desconfiança em relação a Moscovo quase todos os polacos parecem unidos - memória histórica oblige! E deixam o alerta: se a Polónia cair, ninguém na Europa está a salvo”, escrevi em junho. O perigo, visto de Varsóvia e não só, é agora mais real do que nunca.Editora-executiva do Diário de Notícias