Há quem pense que tendemos para um Mundo Multipolar e que existe um novo pólo alternativo ao que se convencionou designar de “Sistema Ocidental”, centrado nos BRICS alargados, isto é, na China, na Índia, na Rússia, no Brasil, na África do Sul e nos seis países que entraram recentemente na sobredita organização, a saber, a Indonésia, a Etiópia, o Egipto, o Irão, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos.Não sou dos que acreditam nesse pólo alternativo.A China tem um PIBpc de 29,3% do PIBpc da UE e de 19,58% dos EUA (valores de 2024), um PIB que ronda os 17,5% do PIB mundial (enquanto que os EUA chegam aos 27,58% do PIB mundial e a UE chega aos 18,3%), sendo certo que, em termos de reservas líquidas cambiais está, em larga medida, dependente do dólar americano e do euro.Por outro lado, a mesma China depende, no atinente ao investimento alógeno, do IDE-Investimento Directo Estrangeiro proveniente dos EUA e do Japão.E existem, ainda, outros factores limitativos da “corrida hegemónica” da China, nomeadamente, o facto de, ao nível do segmento de mão-de-obra qualificada, não dispor de uma oferta ilimitada, o que, em larga medida, explica os aumentos salariais reais em alguns sectores da economia chinesa da ordem dos 8-9% ao ano, no decurso dos últimos 10 a 15 anos, o que nos permite chegar a conclusões muito diferentes das habituais no que concerne à evolução das vantagens competitivas dinâmicas de uma parte importante do aparelho produtivo chinês , no contexto geral da economia mundial.Paralelamente, convém, ainda, referir que a economia chinesa ainda não atingiu o “commercialization point” “a la Ranis e Fei”, isto é, ainda não generalizou o desenvolvimento a todos os sectores da actividade produtiva.A China avançou muito na inovação e, muito em particular, na Inteligência Artificial, mas, por exemplo, também tem conhecido problemas no sector da habitação e, por conseguinte, na construção, bem como no sector financeiro.A Índia é, em boa verdade, a maior democracia do mundo, mas apresenta um grau de desenvolvimento médio-baixo, com um PIBpc da ordem dos 2682 US Dls, isto é, inferior ao de Cabo Verde.O Brasil, que é um país com um grau de desenvolvimento intermédio, apresenta uma economia dual com fragilidades, tendo um PIBpc que é de 35,4% do português (valores de 2024), não tendo, também, atingido o “commercialization point” “a la Ranis e Fei”.A África do Sul está, ainda, a tentar atingir o “shortage point” “a la Ranis e Fei” (isto é, uma fase de emergência de uma classe média endógena forte, com um sector avançado competitivo à escala internacional), sendo o seu PIBpc o equivalente a cerca de 22% do português (valores de 2024).A Rússia é um país cuja economia ultrapassa em pouco a metade do PIBpc português (isto é, 53,6%, em 2024, para se ser mais exacto), tendo optado por um sistema de “capitalismo selvagem”, em que emergem oligarcas que, aparentemente, prestam contas a uma “estrutura de poderes “de natureza “siciliana”. Tudo isto completado por um regime que se apelidava si próprio de “democracia soberana”, mas que se apresenta manifestamente autocrático.Dos cinco países fundadores dos BRICS, dois optaram por regimes autocráticos e três por regimes democráticos.Mas, se considerarmos os novos seis países aderentes aos BRICS, apenas teríamos a juntar ao grupo dos países democráticos a Indonésia, pelo que em onze países teríamos quatro com regimes democráticos.Com excepção da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos, países produtores de combustíveis fósseis, todos os outros apresentam um PIBpc compreendido entre os 1113 e os 6300 US Dls, o que diz muito sobre o seu grau de desenvolvimento.É verdade que os BRICS representam quase metade da população mundial (cerca de 49%), mas também é verdade que só representam 29,6% da produção mundial.Já os países “ocidentais” desenvolvidos (correspondentemente aos EUA, à UE, ao Japão, ao Reino Unido, ao Canadá, à Coreia do Sul, Noruega, Suíça, Nova Zelândia e Islândia) representam, 56,7% da produção mundial (isto é, quase o dobro dos BRICS), embora representem, apenas, 13,6% da população mundial.Por outras palavras, a média ponderada dos PIBpc dos BRICS representa cerca de 14% da dos “países ocidentais ou de matriz ocidental” desenvolvidos.Se ao que se disse acrescentarmos que o peso relativo do dólar americano e do euro nas reservas líquidas cambiais do sistema financeiro internacional ultrapassa os 60%, então não será difícil concluir que não se apresenta fácil aos BRICS construir um sistema financeiro alternativo ao actual.É sempre um erro subestimar novas experiências de cooperação que venham a surgir no horizonte.Mas, daí a confundirmos a necessidade de não subestimarmos essas experiências com sonhos utópicos ditados pelo excesso de optimismo ou pelo ódio a experiências hegemónicas que se procura desprezar deve ir uma grande distância.Nem mais, nem menos… Economista e professor universitárioEscreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico