Serviço de Saúde britânico é dos que mais depende de médicos estrangeiros: Portugal no top 4 da UE
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Serviço de Saúde britânico é dos que mais depende de médicos estrangeiros: Portugal no top 4 da UE

Especialistas portugueses lideram em áreas como Anestesia e Cirurgia, mas números têm vindo a reduzir-se, o que deverá agravar-se dada a escalada de taxas que é desincentivo à entrada no país.
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O Serviço Nacional de Saúde britânico (NHS) enfrenta no final de 2025 uma dependência estrutural de profissionais estrangeiros que já duplica a de outros países ocidentais. De acordo com os dados mais recentes do NHS Digital e do General Medical Council (GMC), publicados em novembro de 2025, o Reino Unido conta com uma das maiores proporções de médicos formados no exterior em todo o mundo: 42% dos clínicos licenciados (cerca de 138.405 profissionais) obtiveram o seu diploma fora do país, enquanto 36,3% reportam uma nacionalidade não britânica.

Neste mapa, Portugal é como uma das principais fontes de talento qualificado, com cerca de 1403 médicos no ativo naquele país. O país ocupa a quarta posição entre as nacionalidades da UE com clínicos a trabalhar nas ilhas britânicas, sendo apenas superado pela Irlanda, Grécia e Itália.

Prestígio português em áreas de alta complexidade

A "escola portuguesa" de medicina continua a ser um dos ativos mais valorizados dentro das unidades hospitalares britânicas. Ao contrário de outras nacionalidades que se concentram maioritariamente em medicina geral, os médicos portugueses têm uma penetração acima da média em especialidades de alta complexidade.

Dados do GMC (novembro 2025) e dos relatórios de especialidade do Royal College of Anaesthetists indicam que os clínicos formados em Portugal são preferencialmente selecionados para as áreas de Anestesia, Cuidados Intensivos e Cirurgia. Esta valorização deve-se à natureza intensiva do internato em Portugal, que prepara os médicos para uma elevada autonomia clínica.

"Os especialistas portugueses entram no sistema britânico com uma maturidade técnica que o NHS dificilmente consegue formar em tempo útil", refere um dos relatórios da British Medical Association (BMA).

O custo do talento: taxas a subir em 2025

Um dos fatores que tem ajudado a moldar o perfil do corpo clínico em 2025 são as novas exigências financeiras impostas pelo Ministério do Interior (Home Office) do governo trabalhista britânico.

A subida das taxas, aplicada em abril de 2025, representou um agravamento direto nos custos de entrada: o Visto de Saúde e Cuidados (até 3 anos) tinha uma taxa de 284 libras (aprox. €326), que passou para os atuais £304 (aprox. €349). Já um visto de Saúde e Cuidados (mais de 3 anos), tinha um custo de £551 (aprox. €632), mas foi fixada em £590 (aprox. €676).

Pior foi o Certificado de Patrocínio (CoS), que disparou: o governo impôs-lhe uma subida de 120%. Se até abril de 2025 os hospitais pagavam £239 (aprox. €274) por cada médico contratado, o valor atual situa-se nos £525 (cerca de €602).

Para os médicos portugueses e outros europeus, que antes do Brexit beneficiavam de livre circulação, todos estes custos -- somados aos processos burocráticos de patrocínio -- funcionam como uma barreira psicológica e financeira. A Academy of Medical Royal Colleges escreve mesmo, no seu relatório de dezembro deste ano, que este "ambiente oneroso" é o principal responsável pela estagnação do recrutamento na UE -- esta, segundo os dados estatísticos de novembro, está fixada nos 5,2%.

Apesar da força europeia na medicina, a verdadeira base do sistema do NHS é agora garantida pela Ásia e África. A Índia lidera o recrutamento externo no Reino Unido (8% do total de médicos), seguida pelo Paquistão (3,7%) e Egito (2,9%). No entanto, um dado novo de 2025 revela que 9% dos médicos do Reino Unido provêm de países que integram a "lista vermelha" da Organização Mundial de Saúde (OMS) -- ou seja são países com carências críticas de pessoal clínico, sendo que esta organização internacional proíbe o recrutamento ativo por parte de nações mais ricas destas nações para proteger sistemas de saúde vulneráveis.

Este facto coloca o governo britânico sob pressão internacional, devido às implicações éticas de retirar profissionais de saúde a países com carências severas.

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O êxodo e o risco estrutural

Pela primeira vez em anos, a curva de crescimento de médicos no país está a estagnar. O número de médicos estrangeiros que abandonam o NHS disparou 26% num só ano, com 4880 clínicos a deixarem o sistema em 2024.

Para os médicos portugueses, mercados como a Suíça ou a Alemanha -- que não exigem vistos dispendiosos ou processos de patrocínio complexos -- oferecem agora condições mais atrativas.

O cenário neste fim de 2025 é de preocupação. O Reino Unido regista apenas 3,2 médicos por cada 1.000 habitantes, um rácio significativamente inferior aos 3,9 da média da OCDE. O GMC avisa que a incapacidade de reter especialistas europeus altamente qualificados, como os portugueses, coloca o NHS numa encruzilhada: sem uma reforma profunda nas condições de acolhimento e nos custos de imigração, o sistema arrisca um colapso em especialidades vitais que hoje dependem inteiramente de quem vem de fora.

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