“Negação da democracia”. Esquerda francesa na rua contra Macron e Barnier
O novo primeiro-ministro francês, Michel Barnier, ainda está a tentar formar governo e já as ruas se encheram de manifestantes a pedir a sua destituição - e a do presidente Emmanuel Macron. A esquerda, cuja aliança venceu as legislativas, não perdoa ao chefe de Estado a nomeação de um chefe de governo de direita, com os manifestantes por toda a França a denunciar a “negação da democracia”.
“Da Bastilha à Nação, um único e imenso mar de gente. Em 150 lugares, a dignidade de um povo cuja democracia é desprezada”, escreveu no X Jean-Luc Mélenchon, ex-candidato presidencial da França Insubmissa. Só em Paris, o partido da esquerda radical diz que as manifestações juntaram 300 mil pessoas em toda a França, 160 mil pessoas só em Paris - a polícia alega contudo que foram apenas 26 mil.
A partir de um camião, Mélenchon dirigiu-se aos manifestantes em Paris, dizendo que o povo está “numa rebelião” e pedindo aos seus apoiantes para que se preparem para a batalha. “Não haverá pausa”, disse. “A democracia não é apenas a arte de aceitar a vitória, é também a humildade de aceitar a derrota”, acrescentou.
Uma sondagem da Elabe, divulgada na sexta-feira, revela que 74% dos franceses acreditam que Macron desrespeitou o resultado das legislativas, com 55% a dizer que ele as “roubou” - usando a linguagem de Mélenchon e outros dirigentes da esquerda. “A V República está a colapsar”, disse um dos manifestantes, Manon Bonijol, à AFP. “Votar será inútil enquanto Macron estiver no poder”, referiu o jovem de 21 anos.
O antigo negociador do Brexit, de 73 anos, foi escolhido para chefiar o governo na quinta-feira, quase dois meses após a segunda volta das eleições. Barnier é d’Os Republicanos, que ficou apenas em quarto nas eleições. Sem maioria na Assembleia Nacional, o primeiro-ministro está ainda a tentar formar governo, tendo dito na primeira entrevista, na sexta-feira à noite, que espera contar com o apoio do centro aliado a Macron e de esquerda.
Mas tanto a França Insubmissa como os socialistas, parceiros da Nova Frente Popular, já anunciaram que vão apresentar uma moção de censura. Barnier precisa do apoio da extrema-esquerda do Reunião Nacional (RN) para conseguir sobreviver a essa censura. O líder do RN, Jordan Bardella, disse ontem que o governo ficará “sob vigilância”, lembrando que não poderá fazer nada sem a extrema-direita.
O primeiro-ministro, que visitou ontem o hospital Necker em Paris, respondeu que está “sob vigilância de todos os franceses e de todos os grupos políticos”. Em relação aos manifestantes de esquerda, que o acusam de fazer um “golpe” defendeu que não é esse o “espírito”e rejeitou “entrar em polémicas”, deixando claro que não está a usurpar o poder.
susana.f.salvador@dn.pt