Num processo que tem sido um grande imbróglio como o de Tancos, o Ministério Público parece ter decidido ter alguma clareza em relação a Azeredo Lopes. O ex-ministro da Defesa será acusando no processo que começou como de roubo de armas dos paióis militares e acabou com um estratagema de "descoberta" falsa das armas. O processo tem duas partes - a do assalto em si e a do estratagema. A acusação envolverá, ao que o DN apurou, a ideia de que Azeredo sabia o que a Polícia Judiciária Militar estaria a engendrar, neste último caso - e que estava ciente de que a PJM estaria a trabalhar à revelia da investigação oficial da PJ..Azeredo Lopes tinha sido inocentado pela comissão parlamentar de inquérito - que afastou qualquer culpa da sua parte, mas o Ministério Público considerou que o ex-ministro pode ser acusado dos crimes de denegação da justiça e prevaricação. Aliás, a conduta de Azeredo, ao permitir que acontecesse o conluio entre a PJM, a GNR e os próprios assaltantes terá prejudicado a descoberta do que tinha acontecido no assalto, feito por traficantes de droga e armas. A obrigação do ministro era, quando soube que a Polícia Judiciária Militar (PJM) estava a fazer uma investigação paralela à do MP, denunciar a trama e impedi-la. O MP terá tido informações sobre isto com testemunhos e provas documentais que recolheu..Azeredo Lopes tinha sempre dito que não tinha tido consciência do que estava a passar-se. Mas logo na investigação ficou claro que o próprio diretor da PJM, Luís Vieira, estivera várias vezes com Azeredo Lopes, no ministério e até na sua casa. E foi nesses encontros, como terão dito várias testemunhas, que o ministro foi informado do desenrolar dos acontecimentos na investigação paralela..O ministro também teria tido conhecimento do que estava a acontecer, nomeadamente do pedido de proteção de um dos suspeitos do roubo de Tancos, em troca da entrega das armas, de acordo com as regras que a PJM impôs. Azeredo Lopes nunca terá informado o MP, nem tão-pouco a PJ, de nada disto. Embora soubesse do conflito que existia entre as duas polícias. E, também, do mal-estar que a decisão de atribuir a investigação à PJ tinha causado na Polícia Judiciária Militar - algo que lhe terá sido profusamente comunicado por Luís Vieira..O conhecimento ou não do ministro foi o principal assunto político depois de se ter descoberto a "encenação" da descoberta das armas. O que é que cada uma das personalidades intervenientes sabia ou não foi uma questão debatida na praça pública. Agora, a acusação do Ministério Público estará prestes a acabar com as dúvidas..A questão política será também referida pelos procuradores - que não podem ignorar o impacto que esta decisão terá, em plena campanha eleitoral, para as eleições de outubro. Ao que o DN apurou, os interveninentes estavam conscientes também de que a recuperação do material assumia um papel muito importante na imagem do governo no período pós-incêndios de 2017. Na altura, António Costa terá sido informado erradamente por Azeredo Lopes. Tanto que no dia do "achamento" o primeiro-ministro chegou a elogiar o trabalho da PJM e da GNR. .O MP teve o chefe da Casa Militar do presidente da República também na sua mira, assim como vários generais de topo da GNR, mas acabou por considerar as provas insuficientes..O Ministério Público irá corroborar a versão da investigação de que foi por uma questão de orgulho ferido que os membros da Polícia Judiciária Militar agiram, tentando salvar a face de fracassos passados. Era esse o sentido do título da investigação da PJ que desmantelou a trama: Hubris, ou autoconfiança em excesso..Segundo a acusação, Luís Vieira, Vasco Brazão e o seu grupo da PJM, com ajuda da GNR de Loulé, arquitetaram um plano totalmente à margem da lei para afastar a PJ do processo - negociaram com um dos suspeitos do assalto e garantiram a sua proteção, para ter as armas de volta. Tudo isto atrasou e adiou meses a captura dos assaltantes, que só foi conseguida cerca de três meses depois de este grupo ser detido, quando o MP e a PJ ficaram com o terreno livre da ação da PJM.