Pedro Simas: "Ainda estamos bem. Só não pode haver mais de 5 mil casos por semana"

A semana que terminou revelou um aumento de 1235 casos em relação à anterior. Desde o período do estado de emergência que não existiam sete dias consecutivos com tantas infeções. O virologista Pedro Simas aponta que estes resultados "são perfeitamente normais", uma vez que os novos casos dizem respeito a pessoas mais novas e não se refletem na letalidade.
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Portugal registou entre os dias 7 e 13 de setembro uma das semanas com maior número de casos de covid-19 confirmados, desde que a pandemia do novo coronavírus começou. Foram encontradas 3725 novas infeções, mais 1235 que na semana anterior. O aumento tem sido constante, mas, para Pedro Simas, virologista e investigador do Instituto de Medicina Molecular (IMM) João Lobo Antunes, em Lisboa, não há motivo para alarme. "Ainda estamos bem, estes resultados são perfeitamente normais", diz, ao DN. Se a preocupação tem um referencial, Pedro Simas fixa-o nos cinco mil casos por semana.

"É natural que com a vinda de mais pessoas para Portugal, em agosto, e mesmo com as movimentações dos portugueses nas férias os casos aumentem, mas está tudo controlado", assume o virologista, que se tornou um dos rostos conhecidos dos portugueses desde o início da pandemia.

As infeções estão a atingir, cada vez mais, as faixas etárias dos jovens. Se na semana passada e na anterior, a faixa etária com mais casos era dos 40 aos 49 anos, esta semana passou a ser a dos 30 aos 39. E se a população vulnerável - em geral, associada aos mais velhos - tiver menos contacto com o vírus, a letalidade também desce, como têm vindo a comprovar os dados divulgados pela Direção-Geral da Saúde.

A taxa de letalidade do país situa-se atualmente nos 2,9%, quando na semana passada era de 3,1% e na semana anterior de 3,2%. A diminuição do número de mortes globais está diretamente ligada à redução da taxa de letalidade nos mais velhos, aponta Pedro Simas. A taxa de letalidade portuguesa acima dos 70 anos é agora de 14,5%, menos 0,7% que na semana passada e menos 1% que na anterior.

Em sentido inverso e de forma constante está o indicador que mede os novos contágios. Há três semanas consecutivas que o número de casos de covid detetados é superior a dois mil. No entanto, entre segunda e hoje o ritmo de contágio aumentou ainda mais. Esta semana foram registados 3725 infeções pelo novo coronavírus, quando na anterior tinham sido 2490 e na antes dessa 2171.

Em média, desde segunda-feira, foram encontrados diariamente 532 casos. O que significa mais 176 que na semana passada.

DestaquedestaquePortugal regista agora em média 532 casos diários

O pior dia foi sexta-feira, quando foram confirmados 687 novos casos, sendo que, por três vezes, o valor das infeções diárias ultrapassou o patamar dos 600. O número menor desta semana diz respeito a segunda-feira (249 casos).

Apesar deste aumento, "está tudo entre os parâmetros que se considera de segurança", refere Pedro Simas. "Só não pode haver mais de cinco mil casos por semana. Há um dado epidemiológico considerado no mundo inteiro que nos diz que se [os novos contágios] andarem à volta dos 50 casos por cem mil habitantes, a disseminação não está descontrolada".

É um valor indicativo e como tal tem uma boa dose de relatividade. O investigador do IMM lembra que se há países onde menos de cinco mil casos por semana podem dar origem a dificuldades; outros, "porque têm uma grande capacidade de proteção das populações de risco", conseguem lidar com mais infeções ainda. Como exemplos de sucesso apresenta o caso da Alemanha e da China.

"A Alemanha tem sido um fenómeno, porque tem tido sempre uma taxa de infeção por cem mil habitantes baixa, mas tem tudo muito controlado. É um país grande, industrializado, que continua a produzir, não tem confinamento total, mas tem uma situação muito controlada desde o início. Também na China, com distanciamento social e com as máscaras, foi possível erradicar as cadeias de transmissão locais", diz Pedro Simas. No caso chinês, de acordo com a Comissão de Saúde, há 28 dias que a China não regista surtos e os dez casos diagnosticados nas últimas 24 horas tiveram origem no exterior.

"Os chineses confinaram durante algum tempo, por causa da surpresa que foi a pandemia, mas depois controlaram o vírus usando máscaras e apps [de rastreio de contactos]".

O mesmo se poderia aplicar em Portugal, acredita o virologista, para quem um confinamento igual ao do estado de emergência não faz sentido. A solução é "desconfiar usando as regras" sanitárias: distanciamento físico, uso de máscaras, cuidados de higiene e desinfeção de superfícies.

DestaquedestaquePedro Simas defende que Portugal não pode passar novamente por um período de confinamento idêntico ao anterior.

A sua maior preocupação é para com os mais velhos, mas não os que estão em lares, uma vez que considera que esses estão sob vigilância constante. "A sociedade portuguesa tem de assumir a responsabilidade de proteger as pessoas mais vulneráveis também fora dos lares e isso tem de ser uma responsabilidade coletiva. Se o meu filho vem da escola e vive com uma pessoa de risco, se calhar tem de usar máscara, especialmente, se houver um surto na escola", continua o especialista.

O aumento dos casos em Portugal espelha o que já vem acontecendo na Europa, especialmente em Espanha e França, onde o número de casos diários de covid já chegou a ultrapassar os 10 mil. Vários especialistas começam a referir-se mesmo a este crescimento como a segunda vaga pandémica.

Também o chanceler austríaco, Sebastian Kurz, declarou, este domingo, que o país estava "no início da segunda vaga", depois de terem sido confirmadas 870 novas infeções em 24 horas no país que tem nove milhões de habitantes. No total, a Áustria conta com 33 000 infetados e 750 vítimas mortais desde o início da pandemia.

Sobre o caso português, Pedro Simas distingue duas formas de pensar na chegada de uma segunda vaga. "Se não for associada a uma coisa desastrosa, a um descontrolo, a uma sobrecarga do sistema nacional de saúde então não estamos na segunda vaga ", afirma.

"Se é um acréscimo controlado do número de infeções" é possível que este possa ser o começo de uma onda de planaltos consecutivos mas controlado.

Independentemente do que possa significar o aumento dos novos casos, a maior mobilidade numa altura de regresso ao trabalho e às aulas presenciais (que começam esta segunda-feira) preocupa. Por isso, o Governo decretou que todo o país entra em estado de contingência a partir da próxima terça-feira, dia 15 de setembro, o que implicará restrições.

Significa que os ajuntamentos ficam limitados a dez pessoas; restaurantes, cafés e pastelarias localizados a 300 metros das escolas não podem receber grupos com mais de quatro elementos (exceto se estes pertencerem ao mesmo agregado familiar); está proibido o consumo de álcool na via pública e a venda de bebidas alcoólicas, a partir das 20:00, nos estabelecimentos de comércio a retalho, incluindo supermercados e hipermercados.

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