A investigação da Polícia Judiciária (PJ) aos oito portugueses suspeitos de terrorismo no serviço do autodenominado Estado Islâmico revelou também que, pelo menos, quatro das suas mulheres são perigosas e podem constituir uma ameaça à segurança pública. A PJ considera que foram recolhidas provas suficientes que demonstram a participação consciente destas mulheres nas atividades terroristas do califado e decidiu, juntamente com o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), abrir um inquérito criminal para investigar estas suspeitas..Em dezembro último, o DCIAP acusou os três irmãos Costa (Celso, Edgar e Rómulo), Nero Saraiva, Fábio Poças, Sandro Marques e os irmãos Sadjo e Cassimo Turé, todos de nacionalidade portuguesa, pelos crimes de adesão e apoio a organização terrorista, recrutamento para terrorismo internacional e financiamento de terrorismo..As mulheres alvo da PJ são Zara Iqbal, casada com Sadjo, Reema Iqbal, mulher de Celso, Fatuma Majengo, cônjuge de Edgar, e Mayibongwe Sibandam, casada com Sandro Marques..Segundo um relatório da PJ que faz parte do processo e descreve toda a investigação aos jihadistas portugueses, existem "indicadores de relevo que inevitavelmente concorrem para a perceção do risco elevado que estas pessoas representam para a segurança pública, não só por eventual envolvimento em atos violentos mas também no papel que poderão ter no domínio das atividades de apoio logístico, de radicalização e de recrutamento de outras pessoas para a causa terrorista"..As mulheres, assinala a Unidade Nacional contra Terrorismo (UNCT) da PJ responsável por esta avaliação, "tendo vivenciado os mesmos locais e acontecimentos conturbados naquela zona, não podiam, obviamente, deixar de conhecer o conflito que assolava a Síria". Por isso, acrescenta esta unidade especial, quando "acompanharam os maridos de regresso à Síria (...) sabiam e entendiam bem os propósitos políticos e religiosos que os norteavam, o intuito de participarem na jihad na Síria e no Iraque, integrados nos grupos terroristas fundamentalistas islâmicos"..Para a Judiciária a decisão de acompanhar os maridos, tendo filhos bebés, "apenas encontra razão no seu profundo alinhamento político e religioso com os ideais dos seus maridos" sendo qualquer outra explicação "surreal" para "explicar a disposição mental de jovens com vivência na metrópole Londrina, sobretudo Reema e Zara Iqbal. Tendo estas testemunhado in loco, na Turquia, o fluxo de milhares de refugiados sírios, homens, mulheres e crianças que fugiam à guerra civil, ousarem regressar para aquele sítio, de elevado risco para a vida, ainda mais, levando consigo os seus filhos de tenra idade"..Conclui a PJ que, tendo tudo isto em consideração, não "restam dúvidas de que estas mulheres, (...) que defendem valores radicais islâmicos, como os restantes suspeitos, abraçaram convictamente a causa jihadista dos maridos, tudo apontando para a sua efetiva adesão aos grupos terroristas fundamentalistas islâmicos em que militavam os seus companheiros na Síria"..Os portugueses casaram na Síria, alguns com mais de uma mulher cada, e tiveram mais de duas dezenas de filhos com direito a nacionalidade portuguesa..PJ inquiriu figuras públicas.A maior parte das mulheres e filhos dos combatentes do daesh estão nos campos de refugiados das forças curdas na Síria, como é o caso dos familiares dos portugueses. Dos oito acusados pelo DCIAP, Nero Saraiva está detido pelas autoridades sírias; seis estão em paradeiro desconhecido, dados como mortos; Rómulo Costa está detido em Portugal e Cassimo Turé está sujeito a termo de identidade e residência (TIR)..No interrogatório judicial, Rómulo Costa confirmou o que os investigadores já tinham ouvido nas escutas, sobre ter contactado com várias personalidades e entidades nacionais e estrangeiras para ajudarem a repatriar as mulheres dos irmãos e os sobrinhos. Também o pai dos irmãos Costa, Manuel Costa, pediu esse apoio. O governo português ainda não revelou qual vai ser a decisão..A ex-eurodeputada e ativista de Direitos Humanos Ana Gomes, e a secretária-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Graça Mira Gomes, foram duas das figuras públicas contactadas. E foram inquiridas pela PJ, a pedido da defesa de Rómulo, confirmou ao DN fonte judicial que está a acompanhar a investigação aos terroristas..Ana Gomes adiantou ao DN que foi "contactada por e-mail por alguém de Londres de apelido Costa" (Rómulo viveu naquela cidade até ser detido em Portugal) e recebeu "uma carta de um senhor Manuel Costa" (pai) "a pedir que ajudasse a repatriar os netos que estão ainda na Síria". A destacada militante do PS diz que reencaminhou tudo para o governo, "nomeadamente para os ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Administração Interna" e que "não houve qualquer outro contacto com a família"..Para a ex-diplomata, "Portugal, tal como os outros países europeus que têm cidadãos ainda na Síria, suspeitos terroristas e familiares, devem tratar do seu repatriamento urgentemente - do ponto de vista de segurança, para deter e controlar quem tem responsabilidade criminal; do ponto de vista humanitário quando se trata de crianças tão pequenas que precisam de ser apoiadas e reintegradas". "É de uma irresponsabilidade tremenda não fazer nada", critica Ana Gomes..Falsos certificados escolares de Massamá pagavam viagens ao Califado.Certificados de habilitações falsos, passados a alunos fictícios, com um carimbo da escola secundária Stuart Carvalhais, em Massamá, serviram para obter fraudulentamente subsídios no sistema educativo britânico que foram utilizados para financiar as atividades terroristas dos jihadistas portugueses..Esta é uma das conclusões da investigação da Unidade Nacional contra Terrorismo (UNCT) da Polícia Judiciária (PJ), que sustentou a acusação do Ministério Público (MP) aos oito portugueses suspeitos de terem financiado e recrutado jovens para o Estado Islâmico. Este inquérito-crime teve início, recorde-se, em 2013, depois de a polícia inglesa (Metropolitan Police - Counter Terrorism Command) ter informado sobre o eventual envolvimento de dois dos jihadistas portugueses acusados - Sadjo Turé e Edgar Costa - no rapto dos jornalistas John Cantlie e Jeroen Oerlemens , em 2012, na Síria..Sublinha a PJ, num dos relatórios que faz parte da investigação, que "durante a sua primeira estada na Síria, os suspeitos dedicavam-se à prática de raptos, como atividade instrumental do financiamento dos grupos de combatentes jihadistas"..No entanto, foram as fraudes ao sistema educativo do Reino Unido que vieram depois a pagar as viagens e estadas dos jihadistas portugueses e dos seus recrutados, atingindo as dezenas de milhares de euros. As provas recolhidas pela UNCT demonstram o papel de Sadjo Turé, que terá tido acesso a um carimbo da escola em Massamá onde estudou, "enquanto medianeiro e facilitador em processos de obtenção de vagas no ensino superior britânico destinadas a candidatos-estudantes estrangeiros"..O esquema "envolvia o recurso a documentação falsificada - documentos de identificação pessoal e certificados de habilitações, muitos deles supostamente emitidos por entidades competentes em Portugal -, sendo certo que Sadjo Turé assumia pessoalmente a organização dos processos de crédito e financiamento de diversos candidatos junto das Autoridades Educativas do Reino Unido"..Foram criadas contas de e-mail para estudantes fictícios, para onde as autoridades inglesas enviavam os códigos para levantamento dos subsídios. "Enquanto não fosse detetado que os alunos não frequentavam as aulas, os códigos continuavam a cair nas caixas de correio eletrónico criadas exclusivamente para o efeito", alega a PJ. O dinheiro era transferido para os outros jihadistas em Portugal e na Síria..Nas buscas à casa dos irmãos Costa, quando foi detido Rómulo, em julho passado, a PJ encontrou um livro de apontamentos onde estavam anotados os nomes fictícios, e-mails e códigos dos subsídios para universitários..Mulheres alvo de processo-crime em Portugal.Zara Iqbal - 30 anos Mulher de Sadjo Turé, nascida no Paquistão, com passaporte britânico, com morada no Reino Unido. Sadjo e Zara tiveram três filhos: Yusha, atualmente com 7 anos, nascida na Tanzânia; Yunus, com 6 anos, nascido na Síria; e Asya, de 4 anos, nascida na Síria..Reema Iqbal - 31 anos Mulher de Celso Costa, nascida no Paquistão, com passaporte britânico. Celso e Reema tiveram dois filhos: Ibraheem, de 6 anos, que nasceu no Reino Unido; e Musa, de 5 anos, nascida na Síria..Fatuma Majengo - 27 anos Mulher de Edgar Costa, nascida na Tanzânia e com passaporte deste país. Edgar e Fatuma tiveram três filhos: Zakarya, de 6 anos, nascido em Portugal; Miriam, de 4 anos, nascida na Síria; e Yahya, de 3 anos, nascida também na Síria..Mayibongwe Sibandam - 29 anos Mulher de Sandro Marques, natural do Zimbabwe, com passaporte britânico e moradas em Londres e em Portugal (Queluz). Tiveram uma filha, Yaminah, atualmente com 7 anos, nascida no Reino Unido.