"Uma coisa que digo sempre é que não devem ter medo de falhar. Isso faz parte da cultura americana"
Os Estados Unidos são muitas vezes criticados pelas suas políticas, mas uma coisa é certa: têm as melhores universidades do mundo. Oito no top 10 do ranking de Xangai. Que importância tem este poderio educacional para a América?
Como disse, temos as melhores universidades do mundo. Queria dizer aos estudantes que estejam a pensar ir para os Estados Unidos que temos uma enorme diversidade de escolas. Temos 4700 escolas superiores e universidades, e estamos apenas a 5% da nossa capacidade. Encorajo fortemente os estudantes portugueses a pensarem nos Estados Unidos para se formarem. Em primeiro lugar, porque poderão melhorar o seu inglês. Podem viver em zonas diferentes e fazer isso pagando um preço reduzido; é um modelo que muitos americanos usam. A educação é muito importante, mas não é tudo. O mais importante são as relações pessoais. Quando me perguntam o que são os Assuntos da Educação e Cultura, eu respondo: nós movemos pessoas para mover ideias. Não há nada mais transformador do que a relação entre estudantes portugueses ou de outros países e os cidadãos americanos. A mobilidade é uma das prioridades que promovemos. E funciona nos dois sentidos. Por isso também encorajamos mais estudantes americanos a virem estudar para Portugal. E o número aumentou 23%.
Estamos a falar de quantos estudantes neste momento, sejam portugueses nos Estados Unidos ou americanos em Portugal?
São cerca de 850 estudantes americanos que se encontram em Portugal. Ao contrário, o número é ligeiramente maior. Mas o que importa é que tem vindo a aumentar. A FLAD, por exemplo, tem feito um trabalho ótimo para reforçar a relação entre Portugal e os Estados Unidos.
O que atrai os estudantes americanos para virem para Portugal?
Portugal tem uma cultura maravilhosa e os EUA e Portugal têm uma longa relação. Portugal é um dos nossos mais antigos aliados. O consulado norte-americano nos Açores tem 225 anos. Esta história comum é incrivelmente importante. Por isso acho que os americanos deviam vir cá e tentar descobrir este país. Eu sou da Califórnia e a minha mãe é do Massachusetts, por isso tive muitos amigos portugueses. E tive proximidade com a cultura luso-americana.
Conheceu muitos portugueses na Califórnia e no Massachusetts, mas diria que hoje os americanos sabem mais sobre Portugal?
Um das coisas mais interessantes é que Portugal vai estar na presidência da União Europeia. Estamos muito entusiasmados. Tive alguns encontros aqui em Lisboa e os Estados Unidos estão interessados em saber de que forma vos podemos apoiar durante essa presidência. Outra coisa importante é que estou aqui na sequência da visita do subsecretário de Estado, Keith Krach. E há muito trabalho a fazer em comum na área da tecnologia e da energia. A minha visita coincide também com os 60 anos da Fulbright em Portugal. A Comissão Fulbright foi estabelecida em 1960 e desde então já houve alguns milhares de fulbrighters. E o que é ótimo em Portugal é que o contributo de ambos os países é percentualmente semelhante. Temos outros parceiros também - é uma verdadeira parceria público-privada, com todas as partes a trabalhar para apoiar os estudantes. E temos ainda um outro programa que é essencial, chama-se International Visitor Leadership Program. Faz 80 anos que foi criado e já permitiu a muitos líderes portugueses irem aos Estados Unidos.
Esse programa destina-se a pessoas que já tenham uma carreira consolidada?
No International Visitors Leadership Program estão por norma pessoas a meio da carreira ou no topo. Neste ano estamos a divulgar 80 rostos do IVLP. O primeiro foi revelado em Washington em janeiro e foi a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher. Ela esteve nos Estados Unidos ao abrigo deste programa. E temos uma carta dela datada de 1990 na qual garante que será para sempre "uma amiga dos Estados Unidos". Foi uma das suas primeiras experiências enquanto deputada. O que tentamos fazer é trabalhar com líderes - e podem ser líderes de várias áreas. Há um programa no qual tenho trabalhado com o embaixador George Glass aqui em Lisboa e com o embaixador de Portugal em Washington, Domingos Fezas Vital, e que me deixa muito orgulhosa. É um programa de intercâmbio que inclui um estágio e vai permitir a 400 estudantes portugueses ir para os Estados Unidos aperfeiçoar os seus conhecimentos nas áreas da tecnologia e inovação e 400 estudantes americanos virem para Portugal.
Esse programa já começou?
Sim, começou com a assinatura do memorando de entendimentos, mas por causa da pandemia tivemos de abrandar. Uma das coisas que fiz nesta visita foi tentar encorajar mais parcerias. Incentivar as empresas a aceitarem estudantes como estagiários no futuro próximo. O processo já está a avançar e gostaria de deixar a mensagem: são todos bem-vindos a este programa.
Quando pensamos nos Estados Unidos, especialmente no sistema educativo americano, pensamos no conceito de meritocracia. Essa ideia ainda alimenta o sonho americano?
Bom, nós temos as tais 4700 escolas superiores e universidades. Eu própria andei numa universidade estatal e tive de trabalhar como empregada de mesa enquanto estudava. Isso faz parte da experiência americana. Qualquer um tem uma oportunidade, numa sociedade livre e democrática. E estou aqui também para trazer um pouco dessa cultura para Portugal. Nos EUA temos uma forte cultura do empreendedorismo. O meu pai foi um empreendedor, eu fui empreendedora, além de ter dado aulas na universidade. A Casa Branca tem uma iniciativa chamada Women's Global Development Prosperity Initiative. O objetivo é trazer mais 50 milhões de mulheres para a força de trabalho global até 2025. Assenta em três pilares. O primeiro é trazer a mulher para o mercado de trabalho, o segundo é ter sucesso como empreendedora e o terceiro é remover as barreiras legais que limitam a sua plena participação no mercado de trabalho. Fui convidada a participar, mas este é um programa que mobiliza todo o governo. Nesta visita a Portugal, trouxe este programa - sobretudo focado nos dois primeiros pilares - através da Academy for Women Entrepreneurs (AWE). As mulheres que se candidatarem vão receber formação através de uma plataforma online da Thunderbird School of Global Management, chamada Dream Builders, e outro dos nossos principais parceiros é a Freeport MacMoRan, uma empresa de mineração. As alunas vão aprender técnicas de marketing, como criar um plano de negócios, como recolher fundos, todos os aspetos essenciais para montar um negócio. Muitas mulheres têm ideias ou até já têm um negócio, mas não têm formação empresarial. O objetivo é dar formação a estas mulheres e olhar para a comunidade, para o setor privado, para as empresas e até para o governo para nos ajudar a dar formação a mais mulheres. A embaixada está envolvida neste esforço. E é muito importante para mim desenvolver esta cultura. Uma coisa que digo sempre é que não devem ter medo de falhar. Isso faz parte da cultura americana.
Associamos os EUA com o mito de Silicon Valley, a ideia de startup que começa numa garagem e depois vale milhões. Acha que essa imagem está a desaparecer?
Não, esse mito está bem vivo. Sobretudo durante a pandemia, esse modelo é mais importante do que nunca. Uma coisa que estamos a ver é que as pessoas se estão a virar para o mundo digital. Por exemplo, uma empresária que trabalhava no mundo do exercício físico e que achou que ia deixar de ter clientes mudou-se para uma plataforma online onde todos fazem exercício através do ecrã. Eu própria estou a ter aulas de culinária online. Antes nunca teria conseguido ir às aulas, mas agora estou com o chef online. Há uma enorme criatividade. Isto na verdade trouxe uma oportunidade para muitas pessoas. Muitas pessoas infelizmente perderam o emprego e estão a pensar no que podem fazer. Esse espírito empreendedor é mais forte do que nunca.
No ano passado, um filme sul-coreano ganhou o Óscar de melhor filme. Mas quando pensamos no cinema, pensamos em Hollywood. Quando ouvimos música, muita é americana. O soft power cultural norte-americano ainda domina o mundo?
A cultura nos EUA é muito poderosa. Temos o cinema, a música, o desporto, e temos programas para promover todas estas áreas. No cinema, por exemplo, temos o American Film Showcase, com documentários de realizadores, alguns deles premiados, que mostram em vários países o que é a América. Também a música - seja jazz, country, hip hop. E, claro, o desporto. Temos vários programas de aconselhamento ligados aos desportos. Todas as áreas culturais são muito fortes. Antes de vir para cá estive na Albânia e falámos de música e de como alguma dela, como o jazz, era proibida. Desde os anos 50 que temos o Jazz Envoy Program, que levou artistas como Louis Armstrong ou Duke Ellington a países como o Egito, o Paquistão, etc. Muitas vezes era a primeira vez que as pessoas que assistiam aos concertos viam um americano ao vivo e eram expostas à cultura americana.
Que quase toda a gente fale inglês é uma vantagem, por exemplo, em relação à China, que é uma potência económica mas tem mais dificuldade em exportar a sua cultura?
Sim. Uma das coisas que mais promovemos é o ensino da língua inglesa. Porque é a língua global dos negócios, os jovens ficam muito felizes por aprenderem inglês e terem acesso a toda a cultura americana. Durante a pandemia assistimos a um aumento do interesse. Houve centenas de milhares de pessoas a assistir aos nossos webinars sobre o ensino do inglês. Em Portugal estamos a promover seis locais onde as pessoas podem juntar-se para saber mais sobre a língua inglesa, sobre a cultura norte-americana e receber aconselhamento gratuito. A Universidade de Lisboa, por exemplo, tem o American Corner.
A cultura americana é mais forte do que qualquer mudança política que possa acontecer?
Sim, sem dúvida. Estes programas duram há muitas décadas. E são muitas as pessoas que através deles tiveram experiências que transformaram as suas vidas. Eu própria em jovem participei num programa de intercâmbio e estive na Polónia e na Hungria. E como eu, muitos outros líderes, membros do Congresso, da Administração. Hoje, com a covid, é mais difícil viajar para os Estados Unidos, mas tentamos manter os programas sob a forma virtual.