Kristalina Georgieva, diretora-geral do FMI. Washington (EUA), 17 de abril de 2025.
Kristalina Georgieva, diretora-geral do FMI. Washington (EUA), 17 de abril de 2025.Foto: EPA/SHAWN THEW

FMI. Idosos portugueses têm “capacidades cognitivas” baixas e isso ameaça a economia

Para tirar partido de quem vive mais e tem de trabalhar mais anos, é preciso resolver atrasos. Menor vitalidade mental e física afeta mais indivíduos das zonas rurais, com instrução primária e pobres.
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A população mais idosa em Portugal tem das "capacidades cognitivas" mais baixas num conjunto de três dezenas de países analisados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), um problema que surge associado a níveis inferiores de rendimento por pessoa, a uma menor vitalidade da economia e a uma maior ameaça demográfica, via envelhecimento, à produtividade e à prosperidade futura, alerta o FMI num estudo divulgado no âmbito do novo World Economic Outlook (Perspetivas Económicas Globais), edição da primavera.

De acordo com o trabalho que integra o outlook, a publicação de charneira na qual o FMI atualizará as previsões económicas para cerca de 190 países e territórios do globo, as economias com menor "índice de capacidade cognitiva" - que mede várias aptidões, como "memória, orientação, fluência verbal e matemática básica" dos indivíduos com 50 anos ou mais em vários países desenvolvidos e emergentes - são, por esta ordem, Indonésia, Malásia, Malta, Portugal, Chipre e Espanha.

Os quatro primeiros desta lista (incluindo Portugal, portanto) surgem no ranking com menores níveis de rendimento per capita, em dólares de 2023 e ajustados pelas paridades de poder de compra da respetiva economia).

Recorde-se que Portugal fez uma reforma abrangente do sistema de pensões em 2006 e que esse quadro, que liga a idade de reforma ao andamento da economia e à esperança média de vida, tem permitido expandir a vida ativa (até à reforma) além da idade legal de 65 anos.

Maior dinamismo na economia traduz-se em mais emprego e coleta fiscal, o que ajuda a esbater o efeito do prolongamento da idade de acesso à pensão sem cortes, é essa a ideia plasmada na lei.

Atualmente, a idade efetiva a partir da qual um trabalhador de pode reformar sem penalizações (isto é, sem tentar a reforma antecipada) está em quase 67 anos (66 anos e sete meses), segundo dados oficiais.

Nos lugares opostos do mesmo ranking das capacidades cognitivas dos mais velhos (portanto, com índices de aptidões mais elevados), surgem Alemanha, Países Baixos, República Checa e Suécia, sendo este estado escandinavo o primeiro da lista de 33 países selecionados pela entidade sediada em Washington.

No referido estudo, titulado "A ascensão da economia de prata: implicações globais do envelhecimento da população", o FMI observa que o fenómeno global do envelhecimento (afeta muito os países mais ricos, mas começa a notar nos outros, como os asiáticos) "coloca desafios como o abrandamento do crescimento e o aumento das pressões orçamentais", sendo que "as tendências de um envelhecimento mais saudável oferecem um lado positivo, pois fazem subir a participação da população ativa, prolongam a sua vida ativa e aumentam a produtividade".

O FMI defende que se estudem e se apliquem mais "políticas que apoiem o envelhecimento saudável, aumentem a participação da força de trabalho entre os indivíduos mais velhos e reduzam as disparidades de género".

Tirando partido destas estratégias, "os países podem aproveitar o potencial da economia grisalha para impulsionar o crescimento e reconstruir almofadas orçamentais num contexto demográfico adverso", isto é, uma maior coleta de impostos e contribuições que possa compensar o aumento dos gastos com pensões e cuidados de saúde, por exemplo.

Segundo este trabalho da instituição liderada pela economista búlgara Kristalina Gerogieva, "dado que a longevidade é um fator determinante das alterações na estrutura etária das economias, a questão importante é saber se os indivíduos estão a envelhecer com melhor saúde" para se tirar economicamente o melhor partido do tempo que falta até à idade efetiva de reforma.

Além das "capacidades cognitivas", o FMI destaca a importância da saúde física dos mais velhos, que está profundamente interligada à primeira dimensão, a cognitiva.

Ambas são importantes para que possa haver retornos positivos, resultados benéficos ao nível da produtividade, se o cenário agora é ter de viver e trabalhar mais tempo, defende o FMI.

Segundo a instituição, foram usados "inquéritos" que conseguiram obter "informações sobre várias dimensões da saúde física, cognitiva e mental, bem como sobre a incidência de 18 doenças crónicas (por exemplo, artrite, problemas cardíacos, diabetes, cancro, perturbações psicológicas) e sobre os comportamentos de saúde dos indivíduos (por exemplo, tabagismo, consumo de álcool, atividade física, obesidade)".

"Entre os indicadores de saúde medidos contam-se indicadores de capacidade física (força muscular e função pulmonar) e várias medidas de capacidade cognitiva (memória, orientação, fluência verbal e matemática básica)", acrescenta a pesquisa.

Resultado: "Ao nível dos países, as disparidades na saúde estão relacionadas com as características socioeconómicas. As pontuações médias de saúde são significativamente mais baixas para os indivíduos que vivem em zonas rurais, para os indivíduos que têm, no máximo, o ensino primário e para os agregados familiares com menor riqueza", diz o FMI.

Por sua vez, "as melhorias mais rápidas no envelhecimento saudável nos mercados emergentes (em comparação com as economias avançadas) sugiram alguma recuperação entre países, o ritmo das melhorias na saúde noutras dimensões tem sido semelhante, apesar de condições iniciais que diferem muito".

Para os mesmo peritos, "isto indica que as disparidades socioeconómicas existentes em matéria de saúde - relacionadas com o género, a localização, a educação e a riqueza - persistiram".

E não só. O FMI repara que "uma análise mais aprofundada revela que os fatores relacionados com o estilo de vida, como os níveis de atividade física, o índice de massa corporal e o tabagismo são determinantes significativos da capacidade funcional dos indivíduos mais velhos".

Ganhos económicos podem superar 30%

Em resumo, o FMI defende que "embora existam alguns indícios de convergência entre países, persistem disparidades notáveis nas capacidades físicas e cognitivas dos idosos, tanto no interior dos países como entre eles".

Para dar o saldo, o Fundo defende "o reforço da qualidade dos cuidados de saúde e o alargamento do acesso, em especial no que respeita aos cuidados preventivos e aos grupos desfavorecidos, bem como a criação de incentivos a estilos de vida saudáveis, podem ajudar a reduzir estas disparidades no envelhecimento saudável".

Como exemplo "notável" de aumento da esperança de vida surge Singapura. "Passou do 90.º lugar do mundo em 1950 para o primeiro em 2018, o que sublinha a variedade de políticas que podem ser eficazes, incluindo o subsídio de opções alimentares mais saudáveis, a regulação do teor de açúcar nas bebidas, a construção de ginásios públicos generalizados, a introdução de taxas de congestionamento automóvel e o subsídio de habitações próximas da família para promover ligações sociais intergeracionais", observa o estudo.

Com isto, espera o FMI, pontuações mais elevadas nos indicadores de saúde dos mais velhos surgem "associadas a um aumento dos rendimentos totais do trabalho e da produtividade do trabalho, bem como a resultados positivos no emprego", seja nas taxas de participação, seja no número de horas trabalhadas).

“Os ganhos médios decorrentes de mais saúde cognitiva observados em indivíduos idosos ao longo de uma década estão associados a aumentos nos rendimentos do trabalho e na produtividade do trabalho de cerca de 30%”, conclui o FMI.

Uma melhor saúde está também associada a uma reforma mais tardia, a mais semanas de trabalho por ano, a mais seis horas de trabalho semanais e a uma menor probabilidade de queda no desemprego, acena o Fundo.

FMI

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