"Nós não temos ninguém com visão industrial para o país e também capacidade financeira" para assegurar o futuro da indústria cimenteira em Portugal. Esta foi a reação de Luís Fernandes, antigo CEO da Cimpor, ao anúncio da venda da Secil aos espanhóis da Molins, por 1,4 mil milhões de euros. A Semapa, dona da Secil, comunicou na passada sexta-feira ter chegado a acordo com a Molins para a venda de 100% da sua cimenteira, operação que deverá ficar concluída no primeiro trimestre de 2026.Luís Fernandes, que também viveu em 2018 a alienação da Cimpor (agora nas mãos da Taiwan Cement Corporation), lamenta que o país vá ficar "sem indústria cimenteira em mãos portuguesas". Mas reconhece que o valor do negócio "é bem considerável". Nada mais nada menos do que o dobro do que pagou na altura o grupo turco Oyak pelos ativos da Cimpor em Portugal e em Cabo Verde aos brasileiros da InterCement, que tinham adquirido a cimenteira em 2012. E demonstra "que o mercado português é apetecível", diz ainda.Para este profundo conhecedor do setor, "o panorama da indústria cimenteira revela-se, a médio e longo prazo, um pouco difícil. Exige investimentos elevadíssimos" para cumprir com os requisitos da União Europeia de descarbonização da indústria até 2050. As cimenteiras – grandes emissoras de CO2 para a atmosfera -, têm de reduzir a incorporação de clínquer, matéria-prima essencial à fabricação de cimento, que resulta da transformação de calcário (grande fonte poluidora).Têm ainda de substituir o uso de coque, combustível fóssil oriundo de resíduos de refinarias de petróleo, por combustíveis alternativos (resíduos orgânicos, biomassa, pneus). Segundo foi já revelado, a indústria cimenteira portuguesa prevê que sejam necessários investimentos da ordem dos 500 milhões de euros até 2030, e de mil milhões entre 2030 e 2050, para atingir a neutralidade carbónica em 2050.Na opinião de Luís Fernandes, há ainda outro fator que deve ser levado em conta neste desinvestimento da Semapa: "Hoje em dia, a indústria cimenteira não é sexy". A somar à pegada ambiental, há o impacto visual das pedreiras e das próprias cimenteiras, diz.A Secil detém três fábricas de cimento no país (Outão, Maceira e Pataias) e está presente em Angola, Tunísia, Líbano, Cabo Verde, Espanha, Holanda e Brasil. Com oito fábricas de cimento, entre Portugal e o exterior, assegura uma capacidade anual de produção de cerca de dez milhões de toneladas."A venda da Secil insere-se na estratégia de gestão ativa do portefólio da Semapa, que visa a diversificação industrial e a criação de valor sustentável a longo prazo", justificou o grupo detido pela família Queiroz Pereira, em comunicado. Com o dinheiro da operação, a Semapa pretende "acelerar a execução da sua estratégia, investindo em novas avenidas de crescimento e consolidando a sua posição como plataforma de investimento industrial diversificada".Na mesma nota, Ricardo Pires, CEO da Semapa, realça que "esta operação representa um movimento estratégico para o Grupo, permitindo fortalecer a nossa capacidade de investimento, dentro da estratégia delineada de diversificação do portefólio".Recorde-se que a Semapa é um grande grupo industrial português, que integra no seu universo empresas como The Navigator Company, ETSA, Semapa Next, UTIS, Triangle’s, Imedexa e, para já, a Secil. No ano passado, registou um volume de negócios de 2,8 mil milhões de euros e resultados líquidos de 310 milhões. O negócio do cimento e outros materiais de construção contribuiu com 701 milhões para a faturação. No total o grupo emprega mais de oito mil pessoas, sendo que 2900 trabalham na Secil.Com esta aquisição, os espanhóis da Molins dão mais um passo na sua estratégia de internacionalização, iniciada já no século XX. Consolidam também a sua posição na Península Ibérica e na Tunísia, onde já estão presentes. A Molins é um grupo com quase 100 anos de experiência, com atividade no cimento, betão, agregados, soluções para construção, pré-fabricados, paisagem urbana e economia circular. Emprega mais de sete mil profissionais em Espanha, Portugal, Bósnia, México, Argentina, Uruguai, Bolívia, Colômbia, Croácia, Turquia, Tunísia, Bangladesh e Índia. .Incumprimentos em pagamentos duplicam por salários em atraso.Empresas de defesa ganham via verde para financiamento na Euronext