Odramaturgo Edward Albee (1928/2016) começou a escrever a peça A Senhora de Dubuque no final dos anos 1960 e terminou-a cerca de dez anos depois. Pelo meio viu morrer duas pessoas que o marcaram: a avó, e o companheiro - que também era seu mentor. E isso marcou aquilo que escreveu e que está em palco na sala Carmen Dolores, no Teatro da Trindade, em Lisboa. A peça começa com três casais a jogar às 20 questões, em casa de Jo e Sam. Apesar da tensão criada pelo jogo, e pelo álcool, o grupo parece estável e divertido. Contudo, isso altera-se e a animosidade surge e as boas maneiras vão-se esvanecendo. Até que aparece inesperadamente um novo casal, uma mulher elegante, de vestido preto, e um homem sofisticado, e isso expõe ainda mais o potencial destrutivo do grupo.Apenas a anfitriã cria uma relação empática com a enigmática mulher. A pergunta inicial coloca-se: será a sua mão ou um anjo da morte? Este é o ponto de partida da peça que estreou em 1980 na Broadway..Uma das peças malditas de Edward Albee, que também escreveu Quem tem Medo de Virgínia Woolf, como explicou em conversa o encenador, e também ator na peça, Álvaro Correia, “começou a escrevê-la no final dos anos 1960 e terminou no final dos anos 1970, início da década de 80”. O encenador recorda que este foi um período conturbado nos Estados Unidos com Nixon na presidência, a guerra no Vietname e o caso Watergate, e isso sente-se esporadicamente na peça. Álvaro Correia sublinha ainda uma característica desta peça, a forma como as personagens, oito no total, falam para o público, “como se fosse necessária uma nona personagem, o público como cúmplice”..A escolha de Albee.Álvaro Correia, Cucha Cavaleiro e Manuela Couto queriam voltar a trabalhar juntos, no passado faziam-no com frequência no Teatro da Comuna. Essa vontade levou-os a Edward Albee e a proporem a Diogo Infante, diretor artístico do Teatro da Trindade, que a incluiu no programa desta temporada. Manuela Couto, ao DN, justificou a escolha, “é um autor de exceção, de que gostamos muito e esta peça nunca tinha sido representada em Portugal”, explica a atriz, que interpreta o papel de Jo.Esta personagem foi das mais difíceis que já fez, conta, “foi extremamente difícil, pelo sítio em que a personagem está. Ela está a morrer e acaba por morrer fora de cena, que é um dos elementos das tragédias. Aliás, este texto tem vários elementos das tragédias”.Questionada sobre a mensagem que fica no final da peça, a atriz acredita que cada pessoa sairá com o que já leva quando entra na sala. “A peça é muito divertida e as pessoas terão as suas reflexões consoante os momentos que estão a passar. Mas é também muito uma reflexão sobre a vida. A determinada altura, a grande questão é, quem sou eu?”. E dá exemplos, “o jogo que as personagens fazem no início da peça é sobre isso: quem sou eu? E, no limite, a grande questão da peça é essa”. A morte também está muito presente. “Albee teve um período de luto muito complicado. A história é contada na perspetiva de Sam (interpretado por Fernando Luís) e é ele que nos relata os acontecimentos, é ele que trata da mulher e que tem o encontro com o casal misterioso. E é ele que, até ao final, não consegue responder à questão sobre quem é.O elenco conta com Alberto Magassela, Álvaro Correia, Benedita Pereira, Renato Godinho e Sandra Faleiro e os já mencionados Cucha Carvalheiro, Fernando Luís e Manuela Couto. A peça estará em cena até 21 de abril.filipe.gil@dn.pt