O livro de Marco Koskas pode ganhar um prémio mas não está à venda nas livrarias
Entre os 17 romances escolhidos pelo júri do Prémio Renaudot este ano, há um que está a chamar mais a atenção: Bande de Français, de Marco Koskas. O que se passa é que este livro não foi publicado por nenhuma editora tradicional em França mas antes através do serviço de auto-publicação da Amazon, CreateSpace. É a primeira vez que tal acontece e os primeiros protestos vieram do sindicato dos livreiros franceses que se queixam de o júri os ter colocado numa situação impossível: para venderem esta obra teriam de encomendá-la no site e eles recusam-se a fazê-lo pois a Amazon é também a mais poderosa distribuidora de livros online e por isso uma das grandes concorrentes das livrarias.
"Querem que demos dinheiro ao nosso mais feroz concorrente para que ele nos possa matar?", pergunta Mélanie Le Saux, uma livreira de Paris, numa carta aberta aos elementos do júri do prémio:
Ao elementos do júri do Renaudot, os livreiros perguntam: "Têm consciência que, se atribuírem o prémio a este autor, estão a privá-lo de uma distribuição nas nossas 3500 livrarias?". Em resposta, num texto publicado no site BiblioObs, Marco Koskas considera que o que os livreiros estão a fazer chama-se chantagem. Estão, na verdade, a ameaçar o júri dizendo-lhe que se premiarem este livro isso poderá ser mau para o prémio porque ele não terá tanta visibilidade.
O escritor francês de 67 anos, nascido na Tunísia mas a viver em França desde os 11 anos, é autor de mais de uma dúzia de livros publicados por editoras tradicionais. Porém, tal como explicou ao jornal britânico The Guardian, nenhuma delas se mostrou interessada em editar Bande de Français. Então, não teve outra opção a não ser recorrer à plataforma da Amazon, que lhe permitiu publicar um livro sem custos, oferecendo-lhe 50% dos lucros obtidos com as vendas.
Quando soube que o seu livro tinha sido nomeado para o prémio, Koskas confessa que se sentiu "divertido e orgulhoso". Os livreiros não deveriam estar zangados com ele nem com o júri do prémio mas sim com os editores que "cometeram ao erro" ao recusar o seu livro, explica. "Virarem-se contra a Amazon não faz qualquer sentido. A Amazon oferece aos autores um contrato muito mais flexível do que as editoras e, acima de tudo, a Amazon não tem opinião literária. Isso é importante. Eles não se intrometem no que eu escrevo. Não me pedem dinheiro para publicar o meu livro e são pagos quando o produto é vendido. Do que me poderei queixar?"
Patrick Besson, um dos elementos do júri do Prémio Renaudot, explicou ao Le Pointque Bande de Français é um dos romances "mais originais e mais interessantes" da estação. "Conta as vidas dos judeus franceses que emigraram para Israel", disse. "Tem uma frescura, é inteligente. Eu devorei-o." Besson disse que nem reparou que o livro tinha sido auto-publicado na Amazon, apenas se interessou pelo texto.
Criado em 1926, este é um dos principais prémios literários em França e é visto como um complemento ao mais conhecido Prémio Goncourt. Destina-se a livros franceses considerados inovadores pelo seu estilo. De acordo com o autor francês Laurent Binet, citado pelo The Guardian, é compreensível que os livreiros tenham ficado aborrecidos uma vez que em França os prémios literários "são muito importantes e geram muitas vendas de livros": "Em França, o negócios dos livreiros está melhor do que noutros países porque existem leis muitos rígidas e também porque as pessoas ainda gostam muitos de livros em papel, a venda de ebooks é marginal. Mas este é um equilíbrio frágil e a Amazon é vista claramente como o adversário número 1." Esta polémica no meio literário é equivalente ao bruá provocado no meio cinematográfico pelo facto de a Netflix estar a ganhar prémios em festivais de cinema.
O vencedor do prémio Renaudot será anunciado no dia 7 de novembro.