Iniciada há quase meio século, a carreira de Ron Howard como realizador distingue-se por uma curiosa diversidade. Lembremos apenas dois dos seus títulos mais recentes: The Beatles: Eight Days a Week (2016), documentário centrado na lendária digressão americana do quarteto de Liverpool, ou a epopeia familiar Lamento de uma América em Ruínas (2020), baseada num livro de memórias de JD Vance (atual vice-presidente dos EUA). Agora, com Eden, reencontramos o gosto pelas adaptações de histórias reais, neste caso inspirando-se na experiência de Margret Wittmer (1904-2000), uma alemã que integrou o primeiro grupo de colonos que se fixaram na ilha Floreana, no arquipélago de Colón (ilhas Galápagos), algures na solidão imensa do oceano Pacífico.Pela singeleza com que tenta retratar uma ilusão utópica, típica de um colonialismo “romântico”, este é um filme fora do seu tempo. Aliás, até mesmo difundido num tempo desgarrado. Ao contrário das grandes produções dos EUA que chegam, quase em simultâneo, aos espetadores internacionais, Eden foi revelado no Festival de Toronto de 2024, estreou-se na Alemanha em abril deste ano, tendo surgido nas salas dos EUA há pouco mais de uma semana.Ron Howard parece procurar o espírito aventureiro de algum cinema de Hollywood produzido, sobretudo, na década de 50 — lembremos A Rainha Africana (1951) de John Huston, com o par Humphrey Bogart/Katharine Hepburn. O certo é que aquilo que Eden tem para oferecer não passa de uma versão meramente instrumental das peculiaridades desse cinema, como se a acumulação de paisagens exóticas, entrecortadas por diálogos de pueril “filosofia”, bastasse para fazer passar alguma vibração genuinamente humana.Friedrich Ritter e Dore Strauch (Jude Law e Vanessa Kirby) são os “símbolos” desse desejo de construir um mundo liberto dos vícios da civilização, mas a sua existência vai-se transfigurando num cruel exercício de sobrevivência. Margaret Wittmer e o marido (Sydney Sweeney e Daniel Brühl) chegam a Floreana esperando encontrar os êxtases da sua imaginação, sendo depois seguidos por uma baronesa algo excêntrica que, além de querer construir um hotel naquele cenário inclemente, “obriga” a talentosa Ana de Armas a um absoluto desastre interpretativo... No final, são-nos mostradas fotografias de Margaret Wittmer e das outras personagens retratadas. Subitamente, durante breves segundos, tais imagens transportam alguma verdade física e anímica que Eden nunca consegue sugerir. O filme de Ron Howard comete mesmo a “proeza” de nem sequer saber tirar partido da exuberância das paisagens (a maior parte do estado australiano de Queensland), filmadas com a retórica grosseira de um anúncio de perfume... A utopia está morta..Highest 2 Lowest. Por amor de Nova Iorque.O Último Azul. Ser ou não ser velho, eis a questão