Violência doméstica. Criada linha de SMS para as mulheres que estão em isolamento com os agressores

Para quem não pode falar, foi criada a linha 3060 para onde pode dirigir mensagens escritas. É gratuita e não fica registada na fatura mensal. Na semana passada, houve 40 pedidos de ajuda.
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O estado de emergência e o isolamento social para combater a propagação do coronavírus trouxe outra realidade para as vítimas de violência doméstica: o confinamento no mesmo espaço doméstico que o agressor. E, ao mesmo tempo que vêem agravado o risco de poderem ser agredidas, por outro, as vítimas sentem-se limitadas para pedir ajuda. Por entender que é necessário disponibilizar novas formas de comunicação para denunciar atos de violência neste altura, o Governo criou uma linha de apoio para onde podem enviar mensagens - o número 3060 é gratuito e está disponível desde esta sexta-feira, 27 de março.

"No isolamento estamos consigo, escreva quando não puder falar", é o slogan desta linha de SMS.

A Comissão para a Igualdade de Género (CIG) está a monitorizar o que se está a passar na rede de apoio às vítimas de violência doméstica, mas ainda é cedo para perceber se estas duas semanas de isolamento social levaram ao aumento das agressões - explica ao DN a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro.

Até porque as realidades transmitidas pelas congéneres e ONG de países onde o surto de covid-19 chegou mais cedo são distintas. "Temos relatos da diminuição de procura porque as vítimas estão mais limitadas para pedir ajuda, mas também de que as medidas de confinamento social são usadas pelos agressores para o agudizar ainda mais - o isolamento, como se sabe, é usado pelos agressores contra as suas vítimas."

A linha telefónica e o email já existentes para pedidos de ajuda em situação de violência doméstica receberam 40 contactos na última semana, desde a declaração de estado de emergência - dados que não incluem queixas à polícia.

E embora sublinhe que ainda não tem dados para dizer se estes números significam que os casos de agressão aumentaram, a governante aponta um ponto importante: "As pessoas isoladas em casa estão mais vulneráveis e expostas à violência que, neste período de tensão, se exacerba."

Prevenir foi a palavra de ordem que esteve por detrás da criação da linha de SMS 3060. Que, explica Rosa Monteiro, não substitui o serviço telefónico de informação às vítimas de violência doméstica 800 202 148, funcionando antes como um complemento.

Outra justificação para a criação desta nova linha: "Uma mulher confinada em casa com o agressor não pode falar, a não ser numa saída às compras ou à farmácia. Há outros canais de comunicação como o mail, mas 20% não tem acesso a um email e é preciso também ter em conta a limitação de wifi."

O endereço de email violência.covid@cig.gov.pt está disponível para quem quiser usá-lo para pedir ajuda ou fazer denúncias - a violência doméstica é um crime público e quem tenha conhecimento de alguma situação deve reportá-la.

O serviço de mensagens rápidas foi criado em pouco mais de uma semana pela Fundação Vodafone Portugal. O mecanismo, além de ser gratuito, garante a confidencialidade, uma vez que não fica qualquer registo no detalhe mensal das faturas.

Sempre que uma vítima envia um SMS, do outro lado está a responder-lhe a equipa especializada da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), em articulação com toda a Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica, à semelhança do que já acontece com a linha telefónica (800 202 148). É também esta equipa que responde ao novo email de emergência criado para responder ao confinamento social.

A secretária de Estado explica que foram tomadas outras medidas, entre elas uma lista com todos os contactos da rede de apoio às vítimas de violência doméstica, a nível nacional e regional. Esse folheto deverá passar a estar isponível nas farmácias, postos de abastecimento de combustível, hipermercados. "Também a Carris e o Metro irão passa-los nos mupis e redes internas", adianta Rosa Monteiro.

Pode aceder a esta informação através do link https://www.cig.gov.pt/2020/03/covid-19-seguranca-isolamento/. Aqui encontram-se também conselhos de segurança para as vítimas e como os vizinhos devem agir quando têm conhecimento de agressões no seu prédio.

Mais 100 vagas de acolhimento disponíveis

Todas estas medidas contemplam um plano de contingência e proteção para estes tempos de quarentena devido à pandemia de coronavírus destinado às vítimas de violência doméstica. Que passa igualmente pela criação de mais 100 vagas de acolhimento com duas novas estruturas no norte e no centro do país.

A necessidade de criar mais vagas explica-se pela necessidade de criar espaços de isolamento (o que rouba camas) e também pelo facto de durante este período não ser expectável que aconteçam situações de autonomia, ou seja, que mulheres saiam das casas de abrigo para refazerem as suas vidas.

Na procura de resposta para distintas situações, Rosa Monteiro bateu a todas as portas. Um exemplo são as cadeias de abastecimento para garantirem que não faltará nada nas casas de abrigo durante o surto. E também pediu junto de parceiros do setor tecnológico o reforço do equipamento informático para que as crianças que ali vivem com as mães possam continuar em contacto com as escolas.

Mais crimes e mil detidos

Estas medidas foram divulgadas no mesmo dia em que se ficou a saber as forças policiais receberam em 2019 um total de 37752 participações de crimes de violência doméstica, tendo o número de denúncias no último trimestre desse ano aumentado 11,5% face ao mesmo período de 2018.

Segundos os dados divulgados pelo gabinete da ministra de Estado e da Presidência, no último trimestre de 2019 a PSP e GNR registaram 8279 queixas, mais 279 do que no trimestre anterior. No segundo semestre houve registo de 16 279 queixas, a que se somam 13 194 queixas nos primeiros três meses do ano.

Também foi divulgado que o número de agressores presos por violência doméstica no último trimestre de 2019 cresceu cerca de 23% face ao período homólogo de 2018 para 1 010 reclusos. A maioria está a cumprir pena de prisão efetiva.

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