Socos, pontapés, cinturadas e um garrafão de 25 litros de água. Quem e como foram agredidos os jogadores?
Depois de trocarem várias mensagens e pedir "tochada neles" e prometer "f**** a boca a todos", principalmente a "esses merdas", William e Patrício, um grupo de cerca de 40 adeptos atacou a Academia, em Alcochete, no dia 15 de maio, com o objetivo de "criar um ambiente de pânico e sofrimento físico e psicológico nos ofendidos (...) e impedir os jogadores da equipa principal de futebol de participar noutras competições, designadamente no jogo da final da Taça de Portugal, face às lesões de que foram vítimas e ao estado emocional em que se encontravam", segundo a acusação divulgada esta sexta-feira.
Acredita a acusação que o ataque foi "planeado", com "a concordância do arguido Bruno de Carvalho", segundo se pode ler no documento de 143 páginas, que refere mesmo a presença do ex-presidente numa reunião para a concretização do plano, na véspera, a 14 de maio.
"Organizados" e com batedores para não haver polícia no caminho, os invasores já levaram definido quem ia agredir a quem, com Acunã, William e Patrício a serem alvo da maior ira dos adeptos. Aliás, na troca de mensagens, só um jogador pareceu escapar e por ordem expressa de um elemento da Juve Leo: Bruno Fernandes.
Segundo o Ministério Público, além de Jorge Jesus, alguns elementos da equipa técnica, o diretor técnico e o diretor de comunicação, foram agredidos mais oito jogadores.
Se a imagem de Bas Dost com a cabeça aberta correu mundo e chocou o País, sabe-se agora que o holandês foi de facto um dos que mais sofreu durante a invasão ao balneário. O avançado levou uma cinturada, caiu, e já no chão levou murros e pontapés, tendo sido o único a ser observado no hospital, além de socorrido pela equipa médica leonina logo no local.
William levou socos e cinturadas enquanto ouvia um indivíduo a gritar "tira a camisola, não és digno de vestir esta camisola. Queres ir embora filho da p***? Partimos-te a boca toda... "As agressões ao médio só pararam quando Patrício, Salin e Coates o acudiram. Na sequência disso, o guarda-redes foi "agarrado e arrastado por vários encapuzados", tendo ele também sido auxiliado por outros atletas.
Battaglia, por exemplo, levou vários socos na cara e apanhou com um garrafão de 25 litros de água em cima. E Acuña agredido por 5 ou 6 invasores com socos pelo corpo todo.
Depois, Fredy Montero levou duas estaladas e foi socorrido por Palhinha, que agarrou o agressor e pôs fim ao ato, Misic levou com um cinto na cabeça e Petrovic foi vítima de vários socos.
O medo e a estupefação com os acontecimentos tomou conta de Ruben Ribeiro, que "sentado" e "sem reação", levou uma bofetada. Já Podence, "sem reação", viu-se "de repente empurrado para dentro de um cacifo".
As descrições do terror vivido pelos jogadores agredidos durante o ataque à Academia não foram o único ato de vandalismo e ameaça sofridas pelos jogadores. Diz a acusação que, com a "cobertura" do oficial de ligação do clube aos adeptos e do ex-presidente Bruno de Carvalho, houve ameaças do ex-líder a alguns jogadores uma semanas antes. Aliás, a investigação acrescenta que havia há anos uma cultura de intolerância e que "Bruno de Carvalho manifestava sentimentos de desprezo contra todos os jogadores da equipa principal, designadamente contra Rui Patrício e William Carvalho", dois dos nove jogadores que rescindiram contrato com o Sporting alegando justa causa após o ataque à academia.
Durante uma reunião com o plantel a 7 de abril, depois do jogo com o Paços de Ferreira, por exemplo, Patrício e William responderam a Bruno de Carvalho e ouviram o que não queriam. "Eu sou o presidente! Eu faço o que quero! Quem és tu? Queres é sair do clube", atirou o ex-presidente para Rui Patrício. Depois William confrontou-o com o facto de ter mandado a Juve Leo partir os carros dos jogadores e ele respondeu que se lhe quiser bater não precisava de ajuda para isso. Algo que, de acordo com o Ministério Público, que provocou um clima de medo e receio nos jogadores.
Agora, o MP acusa o ex-presidente do Sporting de ter conhecido e incentivado o ataque à equipa de futebol, na Academia de Alcochete. Os magistrados do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa acreditam que Bruno de Carvalho, Nuno Mendes, conhecido por Mustafá, líder da claque Juventude Leonina, e Bruno Jacinto, oficial de ligação aos adeptos à dada dos factos, "conheciam o plano delineado" pelos restantes arguidos e não só não tentaram demovê-los, como os incentivaram.
No total, há 44 arguidos no processo que investiga o ataque de 15 de maio, mais quatro do que tem sido noticiado. Destes, 38 estão em prisão preventiva e seis sujeitos a termo de identidade e residência, nomeadamente, Bruno de Carvalho - à data dos acontecimentos liderava o Sporting, foi destituído em Assembleia Geral em 23 de junho - e Mustafá, que foram detidos no domingo e libertados na quinta-feira, com obrigatoriedade de se apresentarem diariamente às autoridades e com caução de 70 mil euros.