O sexo fácil e as raparigas francesas
Filmar uma "escort girl", uma rapariga de aluguer, entre a prostituição e a absoluta independência feminina, a prática das jovens atraentes da Côte d'Azur é matéria para a cineasta francesa Rebecca Zlotowski fazer uma série de interrogações sobre a conduta de um mundo de privilegiados.
Situado na alta roda de Cannes e sua vizinhança, Uma Rapariga Fácil é um suave conto de moral, algures entre o movimento de Rohmer e a exploração que a cineasta tem vindo a fazer sobre personagens femininas. E foi precisamente em Cannes que o filme causou algum impacto, mais precisamente na secção Quinzena dos Realizadores, em parte por ser protagonizado por Zahia Dehar, jovem que se tornou uma celebridade após um escândalo sexual com futebolistas - exemplo de uma "millenial" a simbolizar o estado de espírito de uma geração de raparigas em França.
A cineasta de Planetário (2016) propõe uma reflexão sobre a crise dos valores românticos no feminino e traça uma proposta acerca do poder de sedução das mulheres no frívolo circuito das acompanhantes de luxo. E Dehar é uma jovem que percebe o poder do seu corpo curvilíneo, prefere a aventura ao romance e está disponível para entrar nos iates e conhecer os milionários que se pavoneiam no Velho Porto. Juntamente com a jovem prima, uma estudante ainda virgem, vai parar a um barco de luxo atracado e lá brindam com dois homens maduros, Andrés (Nuno Lopes) e Phillipe (Benoît Magimel). Para a prima mais nova, a atração sexual que causa em homens mais velhos não passa por uma aventura, mas sim pelo puro prazer. A dada altura, aprende que o seu poder de sedução é sobretudo uma moeda de troca.
Nuno Lopes, interpreta um brasileiro em maré de grandes lucros financeiros e que passeia a ostentação do luxo. De um copo e uma guitarrada, acaba por se envolver com a prima mais velha.
História de relações de poder sexuais num mundo onde as trocas de corpos na Croisette são comuns, entre um passeio de iate ou uma ida à discoteca da moda. De forma luminosa e quase naturalista, abordam-se transações sócio-económicas entre classes diferentes e são fintados os lugares comuns e estabelecidos de quem é "caçado" e "caçador" num jogo de engates.
O argumento tem o bom senso de não vincar nada e chega a colocar o espectador num quebra-cabeças amoral acerca da política da sexualidade nestes dias onde tudo é negócio. Fala-se, sente-se e respira-se o dinheiro, mesmo quando no horizonte estão sempre a beleza do mar mediterrânico e um pôr-do-sol filmados com um naturalismo muito bem conseguido.
Sereno e sempre equilibrado, Uma Rapariga Fácil é bem capaz de ser o melhor filme desta cineasta. E é também mais um passo seguro na carreira internacional de Nuno Lopes, ator que aqui parece estar em pleno controlo de um tom justo e nada excessivo. Talvez seja a proposta pós-Natal perfeita para a ressaca de Cats e Star Wars...
*** Interessante
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