O objetivo de Felipa Garnel como motorista de Uber era partilhar as melhores histórias em livro desde o início. Mas viveu uma experiência a sério onde encontrou pessoas mal-educadas e amigos que lhe deram abraços, surpreendidos por a encontrar ali, achavam que se tinha visto obrigada a ser motorista. "Davam aquele abraço de 'a vida dá voltas, força'.".Como é que lhe surgiu esta ideia? Era uma ideia de miúda. Sempre que entrava num táxi - e na altura só havia táxis - falava imenso com os motoristas e muitas vezes saía do táxi a chorar, outras a rir com as vidas deles. E achava que o carro era um meio que propiciava à conversa e à partilha. Tenho de ser franca, várias vezes me propuseram escrever livros - por exemplo, quando saí da Lux escrever um livro sobre a imprensa cor-de-rosa, e nunca quis fazer nada disso. E pensei, só escreverei um livro um dia que me sinta completamente confortável e tenha uma ideia que ache que é diferente. Não quero ser mais uma a escrever um livro, não quero entrar pela ficção, não quero ter pretensões a literatura. Nada disso, quero ter uma experiência e se isso der um livro, ótimo. E de repente lembrei-me disto, eu queria tanto ser taxista porque é que não vou para a Uber que é fácil? Encontrei um motorista brasileiro - eu ando muito de Uber -, fiz umas perguntas de como é que era, disse-lhe que gostava de fazer por uns tempos e se ele achava que podia fazer no meu carro. Ele explicou-me que os carros tinham de ter um averbamento para passageiros comerciais e o seguro era muito mais caro, mas que havia empresas que alugavam carros partilhados entre dois motoristas e deu-me o contacto. Cheguei a casa, fiz uma sinopse do que queria fazer e telefonei para o número dessa empresa e eles foram fantásticos - a Bluwalk, são parceiros da Uber e têm vários carros. Expliquei-lhes o que queria, porque ao telefone queriam que entrasse no roulement de motoristas e de zonas e eu não podia estar muito constrangida por horários e percursos. Tinha de tentar ter viagens longas, o máximo que conseguisse, para ter boas conversas, e em Lisboa isso acontece menos do que em Cascais, Sintra ou na linha. Eles perceberam, cederam-me um carro - o que para eles era difícil porque dividem os carros entre dois motoristas, com horários de dia e de noite, e eu só ia fazer horário de dia. Mas como trabalhei muitas horas, consegui quase compensar. Eles acabaram por também não perder nada e foi uma boa parceria..E com a Uber foi fácil convencê-los a escrever este livro? Nunca disse à Uber que estava a escrever um livro. Vão saber agora. Tive imenso azar porque na altura em que decidi fazer isto o upload dos documentos que era feito na internet passou a ser feito presencialmente no espaço da Uber, que é nas Amoreiras. Fui lá, como toda a gente que lá estava para se registar, e pronto, registei-me. Nunca disse nada até hoje. Eles não fazem ideia de que escrevi um livro..Em relação às pessoas, durante as conversas, acabou por referir que estava a escrever um livro e se elas se importavam de aparecer? Não. Exceto raríssimas exceções. Há algumas histórias em que não troquei os nomes e as pessoas vão aparecer no lançamento do livro. São algumas pessoas a quem no fim pedi para usar os nomes verdadeiros. Outras não, porque era difícil. Estrangeiros, por exemplo, era indiferente porque eles não leem português. Disse a alguns, a outros não. Disse na maior parte das histórias mais sensíveis e pedi autorização para contar a história, trocando nomes e lugares. Mas por exemplo, estou a lembrar-me do veterano do Vietname, não disse. Foi confusa a saída do carro à porta do Hospital da Luz e não disse..Quando teve a ideia tinha planeado o tempo que ia ser motorista da Uber? A minha ideia foi um mês. Mas começava todos os dias às 05.30/06.00, porque esse motorista brasileiro era de Cascais e tinha-me dito que se começasse às cinco e meia tinha pelo menos dois aeroportos e isso dava-me a garantia de pelo menos uma hora de conversa. E até me explicou o sítio para onde devia ir que era ali na Guia ao pé de alguns hotéis que há em Cascais, e realmente era verdade. Começava muito cedo e nunca acabava antes das 19.00/19.30 ou 20.00, às vezes acabei às 22.00. Portanto, foi assim um mês muito, muito intensivo, mas não senti necessidade de fazer mais. Quer dizer, pensei que deveria fazer noites e tive algum medo de fazer, por histórias que ia ouvindo por motoristas que entretanto fui conhecendo, até lá na empresa quando lá ia, por motoristas com quem falava quando era utilizadora de Uber, pela minha família, as minhas filhas miúdas pediam-me para não fazer..O facto de ser mulher também a condicionou nessa escolha? Nunca tive um problema. Nunca tive ninguém que tivesse feito uma aproximação menos correta. Nada. Tive alguns piropos como presumo que todas as mulheres tenham em qualquer parte, mas não mais do que isso. Não tenho nada de que me queixar, nada. Mas ouvia realmente muitas histórias e, sim, o facto de ser mulher à noite pode ser mais complicado, porque há muitas histórias de álcool, de droga, histórias pesadas. Tenho a certeza de que se o fizesse daria para outro livro, mas seriam histórias mais repetitivas, se calhar. Eram menos histórias de vida e mais histórias sobr o efeito de outras coisas. Todos eles me contavam que vomitavam os carros todos à noite e até as minhas próprias filhas - a Rosa, a mais velha, que tem quase 16 anos e que de vez em quando sai à noite, apanha motoristas que lhe contam histórias que ela ficava apavorada e pedia-me sempre, "mãe à noite, não". E realmente não sentia necessidade. Mas sim, teria mais receio, porque há alturas complicadas, quando você mete quatro homens no carro que não conhece de lado nenhum no meio de um sítio ermo e meio deserto, não fica à vontade..Eu tive medo. Quando estava a ir buscar esses quatro, aquilo apareceu - foi até na primeira semana, eu acho - uma unknown road [estrada desconhecida] no telemóvel e a direção era para o mar, em Cascais, e eu fui parar à estrada do Abano, uma estrada de terra curta, e quando percebi onde estava metida, ainda antes de saber quem ia buscar, liguei ao meu marido e disse onde estava para o caso de me acontecer alguma coisa. Quando vejo quatro matulões penso "vou voltar para trás". Mas para voltar para trás tinha de fazer uma manobra muito apertada e eles entretanto tinham a minha matrícula e pensei "seja o que Deus quiser", e não foi nada. Mas tive assim momentos, muitas vezes, por exemplo, quando entravam para a frente, para o meu lado, já mais no lusco-fusco, não era cómodo. Nunca tive nada, nem tenho razão para me queixar, mas há ali aquele período de início em que fica assim um desconforto, mas pronto.."Apanhei muitos amigos e ficavam naquela 'a vida dá voltas' e davam-me abraços apertados".Também fala no livro que as suas filhas no início acharam estranho. As minhas filhas são adolescentes e utilizam a Uber para tudo. Para ir para casa de amigas, para a escola quando vão atrasadas, para tudo. Cascais é um meio pequeno e era aí que ia começar, portanto, o pânico delas era que eu fosse transportar amigos delas, porque é uma combinação explosiva mãe e amigos de filhas adolescentes, e elas achavam aquilo uma loucura, não havia pai nenhum de amigo delas que fosse motorista de Uber. Portanto, porque é que eu ia ser? E a Ana dizia, "se a mãe quer história vá para a porta do hospital, ponha-se numa ambulância, peça ao pai que é médico e o pai se calhar arranja-lhe uma ambulância e mãe pode ir lá". Mas depois aceitaram bem..Há uma história engraçada, no meu primeiro dia, o terceiro serviço que tive foi no Estoril e nós só temos os primeiros nomes, vi uma Madalena numa avenida no Estoril e fui. E quando chego era a melhor amiga da minha filha Rosa, da turma dela desde sempre, e estava ao telefone e diz "ó Rosa, eu chamei a Uber e vem aí a tua mãe" e a Rosa diz "olha, deixa estar, ela é maluca, entra e não digas nada, porque isto vai passar-lhe rapidamente". E o curioso é que a miúda, que passa a vida em minha casa, que é minha segunda filha, quase, entrou para trás. Ali fui a motorista de Uber dela. E eu disse "Madalena, atrás?" e ela, que me chama tia, responde, "olhe, tia, agora já está". Isso não está no livro mas apanhei muitas pessoas conhecidas, muitos amigos que me conheciam e que era engraçado porque ficavam naquela "a vida dá voltas" e davam-me abraços fortes e apertados..Acho que há um retrato sociológico que se pode fazer de uma experiência destas que não fiz porque não era o que queria nem tenho habilitações para tal, mas que é interessante. Ponto 1: porque é que as pessoas desabafam tanto com um desconhecido? Acho que se calhar é por isso, porque não é um amigo que amanhã vai perguntar "então, estás melhor". Por outro lado, a itinerância dá uma sensação que vai levando as palavras. Depois há outra coisa engraçada, transportei imensos adolescentes, porque a Uber é muito utilizada para levar adolescentes aos liceus, e eles perderam a competência da conversa com o mundo. Perderam a competência da conversa com um desconhecido, não a têm, não conseguem, não é por arrogância nem por maldade ou má-criação, nada. Começamos a puxar e eles ficam desconfortáveis. Depois, claro que há aqui um trabalho meu de aproximação..Também tinha esse objetivo e se calhar quando via amigos entrarem no carro já pensava que tinha perdido uma história. Exatamente. Ou quando me reconheciam, porque havia muita gente que me reconhecia e a maior parte dos que me reconheceram não me disseram nada. Quiseram foi saber de mim. Porque é que eu estava ali, o que é que tinha acontecido na minha vida, porque é que não fazia televisão, mas da maior parte não consegui sacar nada. Agora eu também tentava criar um clima propício à partilha e à conversa, ou porque vinham de uma cidade que conhecia e eu começava a falar dessa cidade, ou tinham filhos da idade das minhas filhas e, enfim, com dúvidas e problemas parecidos, ou estavam à procura de casa e eu partilhava contactos de amigos que estão no setor imobiliário, tentava criar ali um ambiente que depois me deixasse puxar por mais coisas..E encontrou histórias muito diferentes. Encontrei, foi incrível. Acho mesmo que a realidade supera a ficção. Por mais imaginação que nós tenhamos, quem passa por nós no dia-a-dia na rua tem sempre de certeza uma história fantástica para contar..Ficou surpreendida com o tipo de histórias? Imensas deixaram-me surpreendida. Nem nos melhores dias, quando pensei fazer isto e quis eventualmente passar isto para o papel, imaginei que fosse apanhar um veterano da guerra do Vietname com uma perna amputada - que vive aqui -, mas pronto, acho que apanhei histórias incríveis. Tive alguma sorte, se calhar também algum mérito em puxá-las, mas também eu vinha desse meio, da comunicação, e não estava a pisar terreno novo. Tenho pena de não ter feito isto com uma câmara..Era difícil manter contacto durante as conversas? Porque a Felipa estava a conduzir e não podia olhar diretamente para as pessoas. Via tudo pelo retrovisor. Mas até é mais fácil. Quando há contacto é só nos olhos, eles só veem os meus olhos, não veem a minha cara. E os olhos dizem muito, sem falar, acho que até é mais fácil, cria uma empatia e uma proximidade, há um envolvimento maior. Não tive nenhuma dificuldade nisso. Claro que era muito facilitado, por exemplo, por eu falar bem inglês com os estrangeiros, e francês e espanhol, tudo isso facilitava. As pessoas entravam no carro e ficavam também com outra predisposição. Mas atenção: tive muita gente que entrou no carro sem sequer dizer bom dia. E isso é horrível. Costumo comparar como quando entramos num elevador e está gente e nós dizemos bom dia e ninguém nos responde e nós temos ali uns segundos de silêncio total. Agora imagine isto cinco minutos, às vezes dez minutos. Sem dirigir a palavra. Num silêncio ensurdecedor. Não é fácil. É um bocadinho pôr à prova a nossa paciência. Há pessoas que não são educadas..E como é que fazia nas viagens? Tirava notas no fim? Gravava tudo, depois de cada viagem parava, desligava a aplicação e pegava o iPhone e gravava tudo. Eu não gravava as conversas, portanto os diálogos são recriados, não são ipsis verbis o que aconteceu, mas gravava tudo, como é que as pessoas eram fisicamente, todos os pormenores da conversa de que me lembrava imediatamente a seguir, estados atmosféricos, tudo o que sabia que depois iria ajudar-me a pormenorizar a história..Quando foi essa experiência? Maio/junho do ano passado..E depois começou logo o livro? Depois meteu-se o verão. Ainda pensei voltar em setembro para fazer noite e por isso não comecei logo a escrever, e depois quando decidi não voltar em setembro, comecei a escrever..Mantém contacto com algumas das pessoas que transportou? Muitas. Mantenho, algumas delas estão aqui [no livro] com os nomes verdadeiros e por isso vão aparecer, com outras, como aquela brasileira que foi sequestrada, ela já está a viver em Portugal e optou por ir para Cascais e quando foi para inscrever os filhos na escola ligou-me a pedir ajuda. É uma pessoa com quem às vezes vou beber um café. Ela pediu-me para que o nome dela não aparecesse porque não queria ficar conhecida como a sequestrada, já tinha esse peso no Brasil, onde a história tinha sido pública em Minas Gerais. Mantenho contacto com alguns e acho que há outros que vão tentar entrar em contacto comigo. Vão reconhecer-se de alguma maneira e vão tentar entrar em contacto. A todos os que não sabiam do livro eu mudei o nome, mas os próprios vão reconhecer-se..Dá agora mais valor ao trabalho dos motoristas? Sempre dei. Para mim foi um privilégio, mesmo, você ter o mundo dentro do carro, durante um mês, de pessoas completamente diferentes, de culturas diferentes, de idades diferentes, e ter a hipótese de conhecer toda essa gente, e portugueses de todas as idades, estratos sociais, de tudo, para mim foi um privilégio enorme. E presumo que seja para todos os motoristas assim. As pessoas à partida não são mal-educadas, são simpáticas, e a Uber é uma marca com boa imagem, portanto, as pessoas quando entram no uber também entram bem-dispostas, não entram a achar que o carro vai estar sujo ou que vai cheirar mal. Nós somos ensinados e incentivados a fazer assim, portanto foi um enorme privilégio. Se me perguntasse "repeteria esta experiência amanhã?" Já. "Mais tempo?" Já.."O facto de ser reconhecida fez-me trabalhar zonas de humildade que só me fizeram bem".O que lhe custou mais foi quando as pessoas não falavam? Foi. É assim, o facto de ser reconhecida muitas vezes fez-me trabalhar zonas de humildade que só me fizeram bem. Mas era mais difícil, porque à partida para quem me reconhecesse eu tinha um ónus que os outros motoristas não têm, certo? E isso às vezes era mais difícil. Depois, eu não estou habituada a acartar malões e fazia isso, levei aquilo completamente a sério. Chegava à porta de um hotel e os turistas estavam com três, quatro malões e eu pegava nas malas e punha-as do carro. Eles ajudavam naturalmente e acho que fazem isso com qualquer mulher, mas pronto, não lhe digo que não tenha trabalhado, não tenha saído - não gosto nada desta frase da zona do conforto que é tão utilizada - mas claro que saí do que me é cómodo e confortável, muitas vezes. Mas só me fez bem e voltava a repetir tudo. Só não faço Uber amanhã porque acho que quando as pessoas lerem o livro já ninguém vai dizer-me mesmo mais nada. Porque se não....Aquela ideia que disse há pouco de que os seus amigos lhe davam aquele abraço de "a vida dá voltas e força"... Isso era os meus amigos, mas desconhecidos que me reconheciam verbalizavam muitas vezes. E diziam, "olhe, isto é assim, é efémero, olhe eu também tinha isto e isto e perdi" e tentavam identificar-se. Dar-me um bocadinho de força para eu continuar, porque percebiam "deve ser chato, ela é conhecida", porque muitos reconheciam-me logo que chamavam porque eu tinha Felipa Garnel, e tinha a minha fotografia no perfil, muitos reconheciam logo aí. E depois duvidavam e quando chegavam ao carro diziam "ah, é mesmo". E pronto, entravam e às vezes era confrangedor, mais para eles do que para mim..E sente que se tivesse de fazer Uber para a vida era capaz? Fazia. Só acho que é mal pago. Para se ganhar um salário mínimo tem de se trabalhar imenso. Não tinha ninguém para partilhar despesas, porque nesta modalidade que fiz, normalmente, são dois motoristas, com um carro alugado paga-se 250 a 270 euros por semana, com tudo incluído, exceto a gasolina, mas tem o telefone e o seguro, e depois ainda ficam com 25% do que você faz. Tem de se trabalhar muitíssimo, tem de se ter a sorte de se fazer viagens maiores. Há imensos truques, mas depois é bem montado, porque para os motoristas, por exemplo, que ainda tenham um cliente no carro e a Uber lhe propõe aceitar outro a seguir, se não aceitam há uma taxa de não aceitação que os penaliza. Para os obrigar a aceitar tudo e para os obrigar a não ir para sítios onde possam ter viagens maiores. E como se faz a taxa de não aceitação, o que tiver mais alta, havendo vários motoristas próximos, é o último a ser chamado. É uma aplicação bem montada. Depois há a tarifa dinâmica, que eu só conhecia de ser utilizadora, e um dia via aquilo e os motoristas todos a aproximarem-se da zona vermelha que indica a tarifa. Anda tudo ao mesmo. É mal pago. A maior parte dos motoristas que conheci trabalham para várias plataformas, que é a maneira de conseguirem..Com que pontuação é que acabou? 4.98 [risos]. Consegui manter-me nos 4.98 que era o meu pânico. Acho que tive quase sempre cinco estrelas, tive para aí uns sete ou oitos que não foram nisso. Mas não fiquei com cinco, que foi um grande desgosto que tive..Foi melhor motorista do que é cliente? Acho que sou melhor cliente. Sou cinco estrelas, sou simpática, falo sempre imenso. Acho que sou melhor cliente. Mas porque há pessoas de mal com a vida. Tive uma senhora - que conto no livro aliás, Deus queira que se reconheça - que me tratou mal gratuitamente, acho que ela nem olhou para a minha cara. Mas foi antipática, foi mal-educada, até. Tratou-me mal. Sei que há outros que tratam outros motoristas mal e isso é que eu acho que não há direito..Será que é porque também há maior facilidade em tratarmos mal um estranho, se o dia estiver a correr mal? Se calhar. É tudo reflexo também da educação que se tem. Há maneiras de se dizer tudo. Esta senhora, por exemplo - também foi a única pessoa mal-educada que apanhei -, é desagradável. Sou sangue quente e tive de fazer imensos exercícios no trânsito, estou habituada a dizer coisas e ali não podia, tive de reprimir. E com este tipo de pessoas que entravam sem dizer bom dia e eu dizia bom dia e não me respondiam, apetecia-me repetir mais alto "bom dia", e contive-me muitas vezes. Com esta senhora apeteceu-me pô-la fora do carro, ainda ameacei, mas enfim acabei por levá-la ao destino. Mas pronto, para mim foi engraçado, foi uma experiência muito gira..E a sua família já tem receio da sua próxima "loucura"? Tem. A minha filha mais pequenina, a Ana, engendrou logo - quando percebeu que tinha de dizer que eu era motorista de Uber, até porque também apanhei imensos amigos dela - um estratagema de que eu tinha uma wishlist de profissões para fazer até morrer, e que a próxima ia ser barwoman e que depois ia ser hospedeira. E foi a maneira que ela arranjou para arrumar a minha imagem na cabeça dos amigos quando me vissem como motorista. E se calhar está certa, se calhar vou experimentar outras coisas [risos]..E sempre nesta perspetiva de escrever sobre as experiência? Eu gostava, mas agora se calhar fico um bocadinho queimada [risos]. Ou compro umas perucas, talvez. Acho que isto é muito giro e para mim talvez até ainda mais porque venho de um meio, no mínimo, diferente. É giro, foi muito bom.. Confidências Felipa Garnel Lua de Papel 15 euros (à venda a partir de 11 de março)