Morreram 108 pessoas, no ano passado, com uma overdose provocada por drogas ou por álcool. São os números mais elevados dos últimos cinco anos, de acordo com o Relatório Anual sobre a Situação do País em Matéria de Drogas e Toxicodependência, apresentado, esta quarta-feira, na Assembleia da República..O Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses atribuiu a presença de substâncias ilícitas como causa de morte a mais de 300 corpos, no relatório da autópsia. Sendo que destes, 49 foram consideradas overdoses, um aumento de 29% em relação a 2017. Em quase todos os casos, as vitimas tinham consumido mais do que uma droga: opiáceos, cocaína e metadona foram as mais encontradas..Quanto à presença de álcool, das 1087 pessoas que morreram por esta razão, 59 óbitos foram por intoxicação alcoólica, mais 34% que no período homólogo. Houve ainda 172 vitimas mortais de acidentes de viação causados pela influência do álcool..O ano passado, revelou também um aumento (pela segunda vez consecutiva) do número de pessoas que tiveram de ser readmitidas em tratamento relacionado com o consumo de drogas ou de álcool, refere o documento elaborado pelo Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD)..Portugal tem sido elogiado e apresentado como exemplo no combate à toxicodependência. Em 1999, depois de anos a fio com o consumo de substâncias ilícitas a disparar, o país conseguiu inverter a situação através de uma legislação vanguardista que descriminalizou as drogas. Com a aplicação de novos programas e a substituição da heroína pela metadona, os toxicodependentes foram incluídos no sistema de saúde para serem tratados. E os resultados não tardaram. O consumo da heroína e da cocaína - as duas substâncias mais usadas - baixou, as infeções por HIV entre os consumidores caíram para metade e a população prisional por motivos relacionados com as drogas desceu de 75% para 45%, segundo dados da Agência Piaget para o Desenvolvimento. No final de 2018, estavam presas 1675 pessoas condenadas ao abrigo da Lei da Droga, o valor mais baixo da década. Portugal é uma referência internacional e, por isso, no primeiro dia deste ano, assumiu a presidência do Grupo Pompidou, do Conselho da Europa, destinado à cooperação no combate ao abuso e tráfico ilícito de drogas..No entanto, as medidas já implementadas estão a ser descuidadas, em alguns casos, e noutros são precisas novas estratégias, sugerem os autores do relatório. "Reiteramos a necessidade de se priorizarem as ações preventivas, que têm vindo a registar perdas de continuidade e de reforço", defende João Goulão, coordenador nacional para os Problemas da Droga, das Toxicodependências e do Uso Nocivo do Álcool. "Importa também equacionar a criação de novas respostas que atendam às necessidades dos utentes da área da Redução de Riscos e Minimização de Danos, bem como facilitar o encaminhamento destes utentes para as estruturas de tratamento", acrescenta..Canábis, cocaína e ecstasy.Em 2018, receberam tratamento no ambulatório da rede pública 25 582 consumidores de droga, menos que no ano anterior. Apesar de o número de pessoas que iniciaram tratamento ou que foram readmitidos na rede ter aumentado..Em Portugal, as substâncias ilícitas mais tomadas são a canábis, a cocaína e a o ecstasy. A prevalência de consumo é em faixas etárias mais jovens, entre os 15 e os 34 anos e tem mais incidência nos Açores e no norte do país. Pelo contrário, o Alentejo é a região onde há registo de menor consumo, apesar de ser onde há maior incidência de casos de alcoolismo graves..Acesso a drogas e álcool está a aumentar.Nos últimos anos, tem-se verificado uma maior circulação de drogas no mercado nacional. O acesso a estas substâncias está mais facilitado, quer através da comercialização via Internet, quer porque Portugal "tem sido um país de trânsito no contexto do tráfico internacional de haxixe e de cocaína, em particular nos fluxos oriundos respetivamente de Marrocos, e da América Latina e Caraíbas, e que têm como destino outros países, sobretudo europeus", aponta o documento. Na zona euro, gastam-se cerca de 30 mil milhões por ano em drogas ilícitas, avançava o Relatório sobre os Mercados de Droga na União Europeia, divulgado já em 2019..Aumentaram também a quantidade de bebidas alcoólicas disponíveis, sobretudo depois de ultrapassado o período de recessão económica. No entanto, a criminalidade relacionada com o álcool diminuiu e a fiscalização à venda e ao consumo apertou. Em 2018, foram inspecionados 11 901 estabelecimentos..Crianças mais exposta ao álcool.O consumo de álcool entre menores de 18 anos está a subir. A Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) tem recebido mais sinalizações de crianças e jovens expostos ao consumo de bebidas alcoólicas, que podem afetar o seu desenvolvimento. Cerca de 9% dos jovens de 18 anos declarou ter um consumo diário ou quase diário de bebidas alcoólicas, nos inquéritos, feitos pelo SICAD, no Dia da Defesa Nacional. Sendo que 12% admitiu já se ter embriagado, pelo menos uma vez na vida..No ano passado, estiveram em tratamento no ambulatório da rede pública 13 422 utentes com problemas relacionados com o uso de álcool. Quem bebe mais são os homens e, em Portugal, os comportamentos de risco estão maioritariamente associados ao vinho, depois à cerveja e, em menor número, a bebidas espirituosas.