Marcelo sugere adaptar Constituição a situações de pandemia
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou hoje que o regime constitucional e legal português não foi pensado para situações de pandemia e sugeriu hoje que no futuro terá de ser adaptado.
O chefe de Estado falava aos jornalistas no Palácio de Belém, em Lisboa, a propósito das dúvidas jurídicas sobre medidas restritivas de direitos que têm sido adotadas pelo Governo no atual contexto de pandemia de covid-19, como a restrição de circulação entre concelhos.
"Eu sei que há uma preocupação, que eu também tenho, obviamente, não fosse jurista e professor de Direito Constitucional, que é de ir enquadrando as várias medidas naquilo que temos de regime constitucional e legal, que não foi pensado para isso. Não foi. E não houve tempo para o alterar", afirmou.
Marcelo Rebelo de Sousa referiu que entretanto "podia ter havido, por iniciativa de algum partido político em matéria de revisão da Constituição ou de revisão da lei nestes meses, a introdução de ajustamentos", mas "a pandemia continuava e, portanto, no meio da pandemia não houve essa oportunidade".
"No futuro se verá como é que se adapta o que temos para situações tão específicas como uma pandemia", acrescentou.
O Presidente da República defendeu que "neste quadro, houve que utilizar os instrumentos, as ferramentas" disponíveis, e "nuns casos os juristas entendem que foram utilizadas com mais propósito, noutros com menos propósito, numas com maior cabimento, noutros com menor cabimento".
"Em qualquer caso, como sabem, a decisão final é dos tribunais", realçou o chefe de Estado.
No seu entender, contudo, "em plena pandemia não é por acaso que não houve muito recurso a tribunal, porque as pessoas sentiram que havia razões de urgência e de premência que acabavam por justificar as medidas".
Segundo o Presidente da República, "o Governo ponderará todas essas observações e tentará encontrar o caminho".
Em seguida, o chefe de Estado referiu que uma das "medidas que suscitam dúvidas" é a resolução do Governo que determina a proibição de circulação entre diferentes concelhos do território continental entre as 00:00 desta sexta-feira e as 23h59 da próxima terça-feira.
"Até que ponto é que a forma adotada devia ser uma forma diferente daquela que foi adotada neste momento? Eu lembraria que é uma medida com um número muito elevado de exceções e que está a ser aplicada no seu quadro com uma tolerância muito grande, que significa que é quase uma recomendação agravada, mais do que propriamente uma imposição acompanhada da aplicação de sanções", sustentou.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, ao decidir as medidas a adotar no atual contexto de pandemia de covid-19 "pondera-se sempre os direitos, liberdades e garantias de um lado, e do outro lado a vida e a saúde", utilizando os instrumentos jurídicos disponíveis no regime constitucional e legal portutguês.
"É bom que os portugueses percebam que nós estamos atentos a esses problemas. Estamos. Tentando enquadrar as medidas que é preciso tomar nos esquemas que existem. E, por outro lado, sem muito tempo", acrescentou.
O Presidente da República também admitiu vir falar ao país na próxima semana, após o primeiro-ministro anunciar aos portugueses no sábado um roteiro de medidas para conter a propagação da covid-19.
"Ele expôs-me as ideias que tem. Vai ouvir sobre essas ideias os partidos políticos amanhã [sexta-feira]. Vai reunir um Conselho [de Ministros] extraordinário no sábado. Falará ao país no sábado a dizer as medidas para que aponta o Governo e o roteiro dessas medidas", adiantou.
"E depois eu admito eventualmente dizer alguma coisa ao país no decurso da semana que vem", acrescentou o chefe de Estado.
Portugal ultrapassou esta quinta-feira os 4000 casos diários de infeção com o novo coronavírus, registando 4224 novos casos, segundo o boletim epidemiológico da Direção-Geral da Saúde (DGS), que contabiliza também mais 33 mortos associados à doença covid-19.
De acordo com o boletim divulgado pela DGS, Portugal, que regista hoje o número mais elevado de novos casos desde o início da pandemia, contabiliza um total de 132 616 casos confirmados de infeção pelo novo coronavírus e 2428 óbitos.
Em relação aos internamentos, o número de pessoas hospitalizadas continua a subir desde há mais de uma semana, sendo agora de 1834 pessoas, mais 40 do que na quarta-feira, das quais 269 (mais sete) estão em Unidades de Cuidados Intensivos.
Das 33 mortes registadas, 16 ocorreram na região Norte, 12 em Lisboa e Vale do Tejo e cinco na região Centro.