Por estes dias em França Louis Garrel atingiu uma imagem de estrela de cinema que é também ator respeitado. Antes, era apenas o filho do cineasta da Nova Vaga, Philippe Garrel, depois foi também uma espécie de ator que era bom apenas no mesmo registo mas depois vieram os papéis de composição em filmes como J"Accuse - O Oficial e o Espião, de Roman Polanski, e Godard, O Temível, de Michel Azanavicius. Enfim, é um nome para os grandes momentos do cinema francês, sem esquecer gracinhas de Hollywood como Mulherzinhas, de Greta Gerwig..Por outro lado, deixam-no filmar e as coisas têm-lhe corrido bem. Um Homem Fiel, o anterior, realizado em 2018, teve uma certa unanimidade da crítica e relatava os dilemas de um parisiense entre duas mulheres. A personagem chamava-se Abel e é agora resgatada para uma experiência chamada A Cruzada, uma mistura de comédia de aventuras infantis com panfleto de mensagem ecológica e onde vemos Abel a contas com o filho de 13 anos em missão de cruzada por um mundo mais verde. Trata-se de um desvio sereno para o humor e para um aviso sério sobre os problemas do aquecimento global. O filme teve direito a uma sessão especial na seleção de Cannes mas foi em San Sebastián que o DN o apanhou para uma breve conversa onde o ator vestiu o fato de realizador, começando por explicar porque motivo expõe de forma tão aberta as marcas burguesas da personagem que revisita: "antes de mais nada, há um lado de gozo nisso. A Cruzada é uma comédia porque quis colocar-me lá dentro. Enfim, sou eu quem interpreto esta personagem tão estúpida e desse modo as pessoas vão perceber que não estava a querer dar nenhum tipo de lição. Portanto, como realizador, quis que estivesse lá dentro e que pudesse ser um exemplo do tipo de adultos que aquelas crianças criticam. Sabe, estou muito complexado em relação a essa nova geração, não só pela sua rapidez mas pela forma como combatem isto do aquecimento global. Por exemplo, a minha filha de 12 anos é superestruturada e está muito envolvida no movimento antiracial. Os putos são muito mais livres do que nós"..A Cruzada é mais uma colaboração com Jean-Claude Carriére, neste caso a última do famoso argumentista. Aliás, Garrel conta que foi Carriére a ter esta ideia e tentar surpreender o público. E quem entrar neste conto que imagina uma possibilidade de plantar todo o deserto do Sara pode ter razões para ficar surpreso, mesmo quando o próprio tom do filme carece de profundidade.."Importante para mim foi que este tema ecológico não deixasse as pessoas deprimidas. Afinal de contas, daqui a trinta anos a terra pode já não servir para o Homem viver, pelo menos se acreditarmos nas notícias que vemos na imprensa", comenta e acrescenta que esta sua terceira realização não foi pensada apenas para um público juvenil: "creio que todos podem ver A Cruzada! Claro que os miúdos vão perceber uma coisas e outras nem tanto. Seja como for, dizerem que este é um filme para crianças é um elogio. Queria também que percebessem que há um lado de cinema de aventuras. Poderia ser uma parte de Os Goonies, daí ter usado a música daquela maneira. A verdade também é que não quis que fosse uma lição de ecologia. Para os meninos do filme, apesar de estarem num projeto que pode mudar a civilização, para eles é também uma aventura!".A descoberta real do projeto é Joseph Engel, que interpreta com uma graça contagiante este menino que se alia a um movimento ativista de crianças ecologistas. Um dos exemplos práticos que não é só no cinema americano que vemos meninos-prodígio em frente à câmara. Garrel está deslumbrado por Joseph: "Vai ser uma estrela, apesar de não saber se quer ser ator. Os melhores meninos atores são aqueles que não sonham em ser atores. Eu, quando tinha seis anos fiz um filme do meu pai e era horrível. Tiveram de esconder a câmara de mim para não estragar os planos"..No final da entrevista, em jeito de cena de comédia, vai dizendo que é um rapaz da cidade, do asfalto e que não tem muito a dizer sobre a natureza. Uma "blague" de quem está a promover um filme ecologista: "Depois desta rodagem nem mudei muito a minha atitude perante a sustentabilidade... Isto de separar os plásticos é simpático e todos o fazem, mas agora o problema é tão grande que já não está nas nossas mãos. Ao ler um artigo sobre as mudanças climáticas sinto-me completamente perdido. Sinto que deveríamos combater este problema da mesma maneira global que as organizações combateram a covid"..dnot@dn.pt