Inglaterra olhou para Portugal e virou à direita

São cinco os laterais direitos portugueses na Premier League. Sentido tático, rigor defensivo e técnica são algumas das mais-valias, segundo Cédric. Oferta tem dificultado a vida ao selecionador, que chamou Cancelo e Semedo, o último a chegar a terras de Sua Majestade.
Publicado a
Atualizado a

Cédric (Arsenal), Ricardo Pereira (Leicester), João Cancelo (Manchester City), Diogo Dalot (Manchester United - entretanto cedido ao AC Milan) e Nélson Semedo (Wolverhampton). Cinco laterais direitos portugueses nos melhores clubes da melhor liga de futebol do mundo, a Premier League, é obra. Olhando para os 20 plantéis da liga inglesa, Portugal é mesmo o país com mais defesas direitos. Dos cinco, Cédric é o que tem mais épocas (5) e jogos (144 e 12 mil minutos) e explica assim o emergente reconhecimento dos defesas direitos made in Portugal em Inglaterra: "O lateral português tem normalmente um bom conhecimento tático e com boas capacidades técnicas, o que ajuda bastante o jogo ofensivo, que se pratica em Inglaterra."

Vendido pelo Sporting ao Southampton em 2015 por apenas 6,5 milhões de euros, o leão mostrou logo toda a sua capacidade defensiva, chegando à seleção nacional - foi um dos laterais de Portugal na conquista do Euro 2016. "Quando cheguei a Inglaterra não havia muitos jogadores portugueses na Premier League. Era apenas eu e o José Fonte que jogávamos com regularidade. O aumento do número de jogadores portugueses na Premier League é um sinal de qualidade dos jogadores e da formação em Portugal. Isso também se aplica à posição de lateral direito, onde temos vários em equipas de topo e isso é, sem dúvida, prova dessa qualidade", explicou o agora lateral gunner.

As lesões levaram a alguma oscilação competitiva. Sem espaço nos saints, o português foi emprestado ao Inter e depois ao Arsenal (janeiro de 2020). A pandemia impediu que se mostrasse logo, mas o clube londrino não teve dúvidas e investiu na contratação em definitivo. Cédric já fez dois jogos esta época (um na Taça da Liga Inglesa, onde eliminou o Liverpool e o outra na Taça de Inglaterra), mas ainda espera pela estreia na Premier League.

Tal como João Cancelo no City. Mesmo sem ter ganho o lugar no onze de Guardiola - esta época ainda não jogou - é o lateral direito mais caro de sempre (65 milhões pagos à Juventus, que tinha pago 40,4 milhões ao Valencia, que tinha comprado o seu passe ao Benfica por 15 milhões). No total já movimentou 120,4 milhões. Ele é o lateral quase perfeito que precisa de tempo e estabilidade. Tem velocidade, técnica, finta e facilidade de golo, mas mudou de clube por quatro vezes em seis épocas. Alguns entendidos dizem que lhe falta apurar o timing certo para libertar a bola ou cruzar, mas no ano em que esteve na Juventus ofereceu muitos golos a CR7. Cancelo lidera os ratings do Observatório do Futebol, merecendo 85 valores em 100, tendo em conta o remate, as oportunidades criadas, passes, recuperações, distribuição de jogo e rigor posicional. O lateral do City é seguido por Ricardo Pereira (78), Nelson Semedo (78), Diogo Dalot (72) e Cédric (68).

Por Inglaterra quem tem entusiasmado mais nos último tempos é Ricardo Pereira (70 jogos e seis golos em duas épocas). Cada vez que há uma convocatória da seleção e ele não está as redes sociais fervilham com comentários e perguntas sobre o porquê de "o melhor lateral direito português" da atualidade não ir à seleção. Ricardo iniciou a carreira como extremo, mas recuou no terreno para brilhar ao mais alto nível. Forte no desarme, faz todo o corredor no Leicester, fazendo-se valor da mais-valia física. Os treinadores dizem que é um lateral com critério.

À espera da afirmação está Diogo Dalot. Em 2018 e ainda sem se mostrar a grande nível no Dragão, trocou o FC Porto pelo Manchester United. Os red devils precisavam suprir a ausência de qualidade no lado direito da defesa e resolveram apostar no talento do jovem dragão, pagando 22 milhões de euros pelo seu potencial. Participou em 11 jogos até ao momento. Esta temporada, que seria a da afirmação, viu Aaron Wan-Bissaka apoderar-se do lugar com mestria, colocando o português na porta de saída para ser emprestado e ganhar rodagem.

Nélson Semedo foi o último a chegar a terras de Sua Majestade. Chegou no dia 23 de setembro e já se estreou na Premier League. Apesar de ser dado pelo presidente do Barcelona como um dos cinco intransferíveis do plantel, o clube catalão acabou por o vender ao wolves por cerca de 50 milhões de euros. Jogador cerebral nem sempre foi titular na Catalunha e procura agora em Inglaterra o fulgor entusiasmante que mostrou na Luz.

Com tanta oferta, a vida do selecionador torna-se difícil e ingrata. Por norma chama dois jogadores por posição e tem variado. Para o triplo compromisso da seleção nacional, agora em outubro - jogos com a Espanha, Suécia e França - , o selecionador nacional chamou Cancelo e Semedo. Questionado pelo DN sobre a dificuldade nas escolhas e o que valoriza na posição, o técnico campeão europeu escudou-se na qualidade. "Os quatro que têm sido mais habituais estão todos em Inglaterra. O Nelson Semedo era o único que não estava, e agora voltou. A escolha tem muito a ver com os adversários que vamos defrontar, porque todos atacam muito bem, mas uns defendem melhor. Mas o mais importante é ter a felicidade de ter esta qualidade", respondeu Fernando Santos, antes de Rui Jorge chamar Dalot aos sub-21.

Apesar de já não ser chamado há alguns jogos, Cédric é de longe o que mais vezes mereceu a confiança do selecionador, desde que assumiu o cargo (2014). O lateral do Arsenal tem 24 jogos pela seleção sob o comando do engenheiro, mais de metade de Cancelo (11). Semedo já fez sete jogos e Ricardo Pereira foi chamado a jogar por cinco vezes. Dalot ainda espera pela promoção e a concorrência mete respeito.

"A seleção nacional sempre teve muita qualidade em qualquer posição do terreno. Quando fui chamado pela primeira vez tinha como colega de posição o Bosingwa, que foi um jogador com uma carreira fantástica. E sempre tivemos vários jogadores de qualidade nesse lugar. Atualmente também temos, assim como temos em várias outras posições do campo. Todos trabalhamos para fazer parte da nossa seleção, mas a decisão é sempre do Fernando Santos, pelo que o importante é fazermos o nosso trabalho no clube de forma regular para estarmos mais perto dessa chamada", defendeu o defesa do Arsenal ao DN.

A posição de lateral direito foi evoluindo e ganhou importância com o chamado futebol tático. Eles deixaram de ser os carregadores de piano e passaram a ser os que oferecem golos e estabilidade defensiva. Deles depende se os extremos, terríveis predadores dos defesas contrários, conseguem ou não levar perigo à baliza. A complexidade da posição é tanto maior quanto a preponderância do jogador que tem pela frente. Ou será que não? "A primeira missão do lateral direito é, sem dúvida, defender. Foi isso que me ensinaram em toda a minha formação, com foco no posicionamento, tanto defensivo como ofensivo. Se pudermos ajudar o ataque, tendo em conta que as equipas onde jogamos são grandes e têm muito tempo a bola, é importante complementarmos com mentalidade ofensiva. Os laterais são, hoje em dia, jogadores muito importantes no jogo ofensivo. Por isso é fundamental defender bem e saber apoiar o ataque", respondeu Cédric, que espera fazer uma grande temporada no Arsenal e voltar à seleção nacional.

* Este artigo foi publicado na edição papel do DN de sábado, antes de Dalot sair para o AC Milan

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt