Emergência. Governo já admite pagar a hospitais privados
E ao quarto decreto do estado de emergência por si assinado, o Presidente da República lá conseguiu que o governo aceitasse que a requisição civil de hospitais privados só pode acontecer por "acordo" e com uma "justa compensação".
Esta é uma das principais novidades do decreto que o Presidente da República acordou com o governo e que sexta-feira foi aprovado na Assembleia da República (com os votos a favor de PS, PSD, CDS e da deputada não inscrita Cristina Rodrigues, a abstenção de BE, PAN e Chega e votos contra de PCP, PEV, IL e Joacine Katar Moreira).
Nos seus três primeiros decretos instituindo o estado de emergência - revelados em 18 de março, 1 de abril e 16 de abril - nunca Marcelo incluiu nas determinações sobre requisição de meios privados para ajudar o Estado que fosse objeto de acordo e/ou "justa compensação".
Mas no último - revelado na quinta-feira - essa ressalva já aparece: "Podem ser utilizados pelas autoridades públicas competentes, preferencialmente por acordo, os recursos, meios e estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde integrados nos setores privado, social e cooperativo, mediante justa compensação, em função do necessário para assegurar o tratamento de doentes com covid-19 ou a manutenção da atividade assistencial relativamente a outras patologias".
A ressalva que adequa a intervenção do setor privado da saúde às suas próprias pretensões surge num momento em que um aparente quase esgotamento da capacidade do SNS faz elevar as vozes que dizem que o Estado tem de usar toda a "capacidade instalada" para combater a pandemia - mesmo a que não é estatal.
Nesta semana soube-se que a ministra da Saúde assinou um despacho autorizando as unidades do SNS a suspenderem tratamentos não urgentes caso fosse necessário reforçar meios para o tratamento dos infetados com covid-19. Todos os recordes foram batidos - em novos infetados e em mortes - no balanço feito ontem pela DGS sobre a evolução da pandemia nas últimas 24 horas: mais 5550 infeções e mais 52 óbitos. Desde o início da pandemia, Portugal já registou 2793 mortes e 166 900 casos de infeção, estando hoje ativos 70 354.
Na sequência do despacho, o PSD e o CDS foram, através dos respetivos líderes, rápidos a dizer que o governo tem de procurar assistência no setor privado para prosseguir o combate à pandemia. Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos acusaram a ministra da Saúde de ter um preconceito ideológico contra o setor privado da saúde.
Na quinta-feira, no Parlamento, durante uma discussão na especialidade do OE 2020, Marta Temido disse que a resposta à pandemia de covid-19 está a ser apenas suportada pelo SNS, face à ausência de soluções proporcionadas pelos setores privado e social. "Não temos tido respostas à doença covid fora do SNS. Não temos tido, ora por razões infraestruturais ora por razões de dificuldade e de incerteza, perfeitamente compreensíveis e que tentaremos negociar e acomodar", disse. Acrescentando: "Não queiram envolver o SNS, os portugueses e a atividade assistencial em guerras que não existem. Estamos cá para trabalhar e servir os portugueses, não para servir guerras que não interessam a ninguém."
Ontem a ministra recebeu do primeiro-ministro uma manifestação forte de confiança política, "diria mesmo até reforçada". "Nenhum ministro da Saúde até hoje foi sujeito a uma prova tão dura como a atual. Acho que a ministra da Saúde tem dado a resposta que tem reforçado a confiança das pessoas no SNS", disse António Costa. Entrevistado na Antena 1, admitiu ainda que, "no limite", o estado de emergência ontem aprovado - e que entra em vigor às 00.00 da próxima segunda-feira - "poderá ir até ao fim da pandemia". "Mas isso - ressalvou - não quer dizer que as medidas, em concreto, durem permanentemente. Podemos ter medidas que durem um fim de semana, como aconteceu na semana passada, e a seguir desaparecem." Neste sábado o Conselho de Ministros reunir-se-á para regulamentar as novas medidas de combate à pandemia.
Ontem à noite o Presidente da República assegurou, em mensagem ao país, que o novo estado de emergência será "muito limitado e preventivo". Novembro, disse, será "um teste" para evitar "um dezembro agravado" e que imponha "medidas mais drásticas".