Todos os dias, Laura Santos vai várias vezes ao portal das matrículas ver se já foi colocada. Aluna do quadro de mérito, tudo cincos e um quatro, leva a escola muito a sério. Quer entrar para Medicina e não saber neste momento, a sete dias do início das aulas, qual será a sua escola, é uma angústia. Fez a matrícula no período definido para a fazer. A escola que já frequentava foi a segunda opção de três que lhe permitiam seguir a área de estudos que escolheu: ciências e tecnologia. A escola mais perto de casa não oferecia essa área (apesar de, sabe agora, ter uma turma com a área dela).."É muito stressante não saber para que escola vou, se é longe de casa ou se é perto, se estarei colocada quando as aulas começarem. A escola para mim não é nenhuma brincadeira", diz a aluna, que inicia neste ano letivo o ensino secundário, e cujas notas são determinantes para entrar para a faculdade, sobretudo quando se trata de Medicina, que tem das médias mais altas do país, em que cada décima pode fazer a diferença..A mãe já se desdobrou em contactos com as escolas e com a DGEstE - Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares, mas não conseguiu obter qualquer resposta. "É desesperante. Temos a vida toda para organizar, falta uma semana para o início das aulas e nem os livros temos, porque não temos escola. Isto causa imensa ansiedade nos miúdos e nos pais. Não é admissível nem compreensível", diz a mãe de Laura, que prefere não ser identificada..O mesmo sente a mãe de Bernardo Carreira, da Charneca de Caparica, que passou para o 5.º ano. Fez o ensino básico num colégio privado e pediu, no prazo definido pelo Ministério da Educação para a realização das matrículas, transferência para o ensino público, preenchendo três opções entre as mais próximas do local de residência. Até hoje, 7 de setembro, Joana Santos não sabe em que escola o filho será colocado.."Não é caso único. Segundo sei, há 60 alunos por colocar na zona da Charneca de Caparica. Já enviei uma série de e-mails à DGEstE e nada, continuo a não saber de nada. Não tenho os vouchers para os livros, não tenho informação que me permita decidir se ponho o meu filho no ATL ou não, se será preciso carrinha para o ir buscar e levar à escola, se é preciso comprar passe. Não sei nada e falta uma semana para escola começar", diz Joana, que, além dos mails para o ministério, se dirigiu às escolas onde matriculou o filho e obteve a mesma resposta: tem de aguardar.."Aguardar e desesperar, porque é um stress. Além das questões de organização da vida, que para mim é mais difícil porque estou sozinha e desempregada, sei que neste ano, no 5.º, vão começar com revisão da matéria do 4.º ano, para consolidação das aprendizagens que poderão não ter sido feitas da melhor forma durante o período de ensino à distância e eu temo que ele perca essa parte", diz..Questionado pelo Diário de Notícias, o ministério da Educação esclarece que todos os anos estas situações acontecem, sobretudo quando os alunos mudam de ciclo e querem mudar de escola. Quando os encarregados de educação não preenchem as cinco opções dadas, como é o caso, se as escolas indicadas não tiverem vagas, os alunos são colocados administrativamente nos estabelecimentos que tiverem lugar..Foi o que aconteceu a Laura Santos e Bernardo Carreira, segundo fonte do Ministério da Educação, que ao fim do dia de ontem, informou que a primeira tinha sido colocada na D. Manuel Martins, em Setúbal, e o segundo no Agrupamento de Escolas da Trafaria..O portal das matrículas ainda não tinha sido atualizado com essa informação, o que levou a que tanto Laura como Bernardo ficassem a saber pelo DN a escola onde ficaram colocados, mas em breve a atualização será feita, de acordo com a mesma fonte. O que os pais continuam a não compreender é como é que a informação demorou tanto a chegar..O ministério da Educação justifica a circunstância com a complexidade do sistema e o puzzle de critérios a considerar para a colocação administrativa dos alunos em escolas que não escolheram..Sobre quantos são os estudantes portugueses nesta situação, o mesmo não consegue dar um número preciso, porque, diz, o processo é dinâmico e está sempre a ser atualizado, mas admite que ainda estejam por colocar alunos depois de as aulas começarem, se os pais contestarem o resultado da colocação, por exemplo..É que uma das razões para não preencher as cinco opções é precisamente os encarregados de educação não verem como hipótese outras escolas para além das que indicam. É o caso da Escola Secundária D. Manuel Martins para Laura Santos, uma vez que fica precisamente no lado oposto da cidade de Setúbal em relação ao seu local de residência, vizinho da Secundária Lima de Freitas, que apesar de não ter escolhido, porque não tinha a sua área, entretanto abriu uma turma de ciências, onde Laura tinha a expetativa de ter lugar..Para Joana Santos, residente na Charneca de Caparica, "é inacreditavel" ter que levar e buscar o filho todos os dias à freguesia vizinha da Trafaria, o que implica apanhar dois transportes, quando tinha várias escolas próximas de casa..Da Confap, a confederação que reúne as associações de pais, não têm queixas deste tipo de situações, mas Jorge Ascenção considera estranho que assim seja. "Não é normal que a uma semana de começarem as aulas ainda não tenham sido colocados todos os alunos", diz..Filinto Lima, da ANDAEP, que representa os diretores de agrupamentos de escolas, também estranha a situação e acredita que serão casos pontuais, que todos os anos acontecem. "Cabe à DGestE de Lisboa e Vale do Tejo, neste caso, resolver a situação. E resolverá", diz, reconhecendo que o processo deveria ser mais célere, para tranquilização dos pais e dos alunos.