O Estatuto do Aluno e Ética Escolar, que estipula as medidas corretivas a aplicar em casos de violência, bem como os direitos e os deveres do aluno, data de 2012 e mantém-se inalterado desde a sua publicação. Paulo Guinote, professor e doutorado em História da Educação defende que a revisão do diploma permitiria “dar o sinal de que algo pode mesmo mudar no quotidiano escolar”, numa altura em que se multiplicam casos de violência em contexto escolar. Um dos mais recentes chocou o país. Há cerca de um mês, um aluno de 9 anos, da Escola Básica de Fonte Coberta (Cinfães), terá sido vítima de agressão por parte de dois outros estudantes que lhe terão prendido a mão numa porta, decepando-lhe parte de dois dedos. A ‘resolução’ destas situações têm, para Paulo Guinote, dois entraves. Se por um lado o Estatuto do Aluno está ultrapassado, por outro lado, o documento existente “contém possibilidades que nem sempre as escolas e as suas lideranças têm a coragem de assumir, no plano do combate à indisciplina, da prevenção à sua penalização”.“Infelizmente, em muitas escolas instalou-se uma cultura laxista e alegadamente ‘compreensiva’ em relação à indisciplina, com base no discurso relativizador quanto às motivações dos agressores, quase como se as considerasse equivalentes aos danos causados às vítimas”, explica. Essa atitude, sustenta, “apenas tem provocado uma crescente sensação de impunidade por parte daqueles que sistematicamente perturbam o quotidiano escolar, das salas de aula aos espaços comuns das escolas”.O docente alerta ainda para o problema da burocracia nos casos que carecem de ações disciplinares mais graves porque, explica, em muitos casos, as decisões das escolas carecem de aprovação das estruturas regionais e centrais do Ministério da Educação, “o que muitas vezes produz um subregisto oficial das ocorrências disciplinares”. “Mais do que ir além das medidas, seria importante explicitar que toda a letra da lei deve ser praticada, sem receio de desautorização da tutela”, destaca.Paulo Guinote lamenta a existência de “um crescendo de comportamentos disruptivos, devido a uma conjugação lamentável de alguma impunidade decorrente de uma aplicação negligente das medidas contra a indisciplina e violência com a intensificação de discursos e atitudes no plano público que fomentam a violência”.Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, tem sido voz ativa no pedido de revisão urgente do Estatuto do Aluno. Para o responsável, “o diploma legal está ultrapassadíssimo”, sendo necessário “rever com urgência a regulamentação dos processos disciplinares”.Um problema estrutural que se tem vindo a agravarO aumento da indisciplina e da violência em contexto escolar também preocupa a Missão Escola Pública (MEP) - um movimento apartidário de professores - que, afirma, tem vindo, de forma consistente, a partilhar com o Ministério da Educação dados concretos e apelos claros para a necessidade de rever o Estatuto do Aluno e de adotar medidas eficazes que contrariem esta tendência. “Os dados tornados públicos por diferentes entidades, bem como as notícias recentes que têm vindo a dar conta de episódios de violência em meio escolar, confirmam aquilo que as escolas sentem diariamente: a violência protagonizada por jovens está a aumentar e reflete-se de forma direta no contexto escolar, quer nas relações entre pares, quer nas interações com professores e assistentes operacionais”, adianta ao DN Cristina Mota, porta-voz do movimento. A docente alerta para “o crescimento do número de processos disciplinares instaurados nas escolas” e afirma tratar-se de “um indicador claro de que não estamos perante episódios isolados, mas sim perante um problema estrutural que se tem vindo a agravar”.A MEP defende que qualquer resposta séria a este fenómeno deve incluir a revisão do Estatuto do Aluno, “clarificando regras, consequências e responsabilidades, de forma uniforme e transparente para todas as escolas”. “É igualmente essencial reforçar a autoridade pedagógica dos professores, garantindo-lhes instrumentos eficazes de intervenção e proteção, bem como responsabilizar os encarregados de educação sempre que sejam parte ativa ou facilitadora de comportamentos violentos”, conclui.Sindicato exige respostas e medidas imediatasSegundo a Federação Nacional da Educação (FNE) a violência em contexto escolar é “a realidade de demasiadas escolas, onde a indisciplina se encontra fora de controlo e as agressões psicológicas e físicas contra profissionais se têm tornado recorrentes”. “As autoridades não dispõem de meios para garantir segurança em tempo útil e as direções das escolas carecem de recursos para assegurar ambientes de trabalho seguros, enquanto os docentes, trabalhadores de apoio educativo e alunos continuam desamparados e expostos a riscos inadmissíveis”, assegura o sindicato. A FNE considera urgente que “o MECI, as autarquias e as forças de segurança reconheçam a gravidade desta realidade e adotem medidas eficazes que garantam a segurança e as condições de trabalho de quem assegura diariamente o direito à educação e de quem aprende”. “Nenhuma escola pode funcionar em clima de medo. Nenhum professor pode ser deixado sozinho perante ameaças. Nenhum aluno pode aprender num ambiente marcado por violência”, sublinham em comunicado divulgado no seu site. .Bullying. “Filhos da violência doméstica tendem a ser mais agressores e mais vítimas” .BE questiona Governo sobre criança que teve dedos amputados em escola. Advogadas vão apoiar mãe na justiça